Almir Suruí é cacique do povo Suruí, que habita a terra indígena Sete de Setembro, de 248 mil hectares, uma região fronteiriça ao norte do município de Cacoal, no estado de Rondônia, que vai até o município de Aripuanã, em Mato Grosso. Ele anda com o corpo pintado de tinta de jenipapo, colares de sementes nativas e, quando fala em público, usa sempre o seu cocar de penas de arara e de pássaros de sua região. Esta é a imagem do figurino já conhecido de um indígena da Amazônia que cultua suas tradições. Mas quando vai à cidade, usa calça social e paletó, trajes que não escondem suas pinturas nem o impedem de revelar suas raízes.
Veja a Terra indígena Sete de Setembro em um mapa maior |
Nos seus compromissos urbanos, Almir carrega o laptop e o iPhone, ferramentas indispensáveis para estar conectado no século 21. O cacique está sempre online e antenado às discussões de desenvolvimento econômico, social e ambiental. Bem informado e munido da melhor tecnologia, ele viaja o Brasil e o mundo para dar visibilidade à causa indígena e à necessidade de preservar a floresta em pé. Seu grande trunfo é um projeto de créditos de carbono que pode gerar milhões de dólares para os Suruí.
A ideia é reinvestir os lucros da comercialização de créditos em projetos e práticas sustentáveis de conservação da floresta amazônica. Almir explica: “Nós pensamos na coletividade e como fazer isso acontecer. Em 2000, criamos um plano de 50 anos para o nosso povo e as práticas sustentáveis estão dentro do plano”, contou a ((o))eco durante um evento no Rio de Janeiro, promovido pela revista inglesa The Economist.
Os Suruí falam uma língua do grupo Tupi e da família linguística Mondé. O primeiro contato com o homem branco foi em 1968. O nome Suruí foi dado a esses indígenas por antropólogos, mas eles se autodenominam Paiter que significa ‘gente de verdade, nós mesmos’. Nas cerca de quatro décadas em que saíram do isolamento, os Paiter-Suruí viram sua população cair drasticamente de 5 mil para cerca de mil pessoas. Também mudaram de hábitos. O arco e a flecha, armas que garantem o sustento e o alimento do povo, estão abrindo espaço para celulares e gadgets eletrônicos.
As novas ferramentas lhes permitem ousadia na preservação da floresta onde moram. Em 2011, liderados por Almir, firmaram uma parceria inédita com o Google em que os índios tiram fotos e revelam ao mundo, através da internet, a devastação de suas terras. Parte do território Suruí já pode ser acessado em 3D no Google Earth. Eles criaram na rede um mapa cultural com a história e a tradição do povo, além de um mapa geográfico montado com a ajuda aparelhos de GPS.
Esses movimentos os antagonizaram aos madeireiros ilegais. Na luta contra o corte de madeira, Almir e outros membros da tribo recebem ameaças de morte desde 2003. Na semana que passou, elas se intensificaram e motivaram a “Carta do povo Paiter Suruí às autoridades públicas e à sociedade brasileira”, já apoiada por mais de 30 ONGs que atuam na defesa ao meio ambiente. Há uma semana, Almir Suruí contava com a proteção da Polícia Militar do estado de Rondônia, mas desde então essa segurança cessou.
Surui encontra businessmen
No último dia 10 de maio, o cacique Almir foi um dos destaques do seminário “Brazil Innovation: A revolution for the 21st century” (Brasil Inovação: Uma revolução para o século 21), promovido pela The Economist, que reuniu executivos de diferentes setores empresariais para discutir novos modelos de negócios, inovação e empreendedorismo. O custo do evento de um dia foi salgado: mil reais.
O que faz um índio oriundo de terras na fronteira com a Bolívia ser convidado para falar a uma plateia selecionada de 250 executivos na capital fluminense? Em 2011, Almir Suruí foi escolhido como 53º homem entre os 100 homens mais criativos do mundo dos negócios pelo ranking da revista americana ‘Fast Company’. Não foi o smartphone nem o terno que chamaram atenção, mas a sua visão inovadora de manter a floresta em pé através de projetos sustentáveis.
Almir já recebeu outras distinções de peso. Em 2008, foi premiado pela Sociedade Internacional de Direitos Humanos, que conta com 30 mil membros, em 26 países. Em 2000, essa mesma honraria foi concedida ao Dalai Lama. Ele também é reconhecido internacionalmente por as denúncias à Organização dos Estados Americanos (OEA) de exploração ilegal de madeira nas suas terras indígenas e por defender os direitos e a integridade dos índios que vivem isolados, além de lutar contra a construção das hidrelétricas do rio Madeira. Em setembro de 2011, Almir Suruí discursou para chefes de Estado e de Governo dos 193 países-membros das Nações Unidas na sede da organização, em Nova York, durante a Assembleia Geral da ONU.
Aposta na venda de créditos de carbono
O cacique Almir também é conselheiro da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB). Ele defende o REDD como uma alternativa econômica para viabilizar a conservação da floresta e da biodiversidade, assim como ser uma fonte de recursos para os habitantes da terra. Criado há três anos, o Carbono Suruí foi validado pelo Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola) e pela Rainforest Alliance e, assim, se tornou o primeiro a cumprir um processo de validação independente para garantir o cumprimento de normas internacionais referentes aos cálculos de redução de emissões de acordo com os sistemas VCS (Verified Carbon Standard) e CCBA (Clima, Comunidade e Biodiversidade).
Os recursos obtidos pela comercialização dos créditos de carbono serão revertidos para o Fundo de Gestão Paiter-Suruí, oficializado há cerca de duas semanas, que ajudará a desenvolver atividades que já são fonte de renda do grupo, como a produção de castanha e café. Por ano, são 10 mil toneladas de castanha e mais de 4 mil toneladas de café orgânico. “Nós ajudamos a criar ferramentas financeiras para que o dinheiro chegue a estas comunidades. O Fundo Paiter-Suruí vai arrecadar recursos de doações de bancos multilaterais ou empresas e do dinheiro da venda de carbono”, explicou Ângelo Santos.
O Fundo está na fase de captação de recursos. A meta é captar nos próximos três anos o mínimo de 6 milhões de dólares. “Queremos desenvolver em cima da necessidade do povo da região e começar a valorizar produtos florestais. Política econômica verde é ter um planejamento de uso sustentável”, afirmou Almir. Em um prazo de 6 anos, este fundo será completamente gerido pelos Suruís, que já estão recebendo qualificação para tocarem a vida financeira por si próprios.
Escute o podcast de Fabíola Ortiz sobre os Suruís e as ameaças que estão sofrendo e
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