O navio True Conrad, que transportava minério de ferro produzido pela CSN, está ancorado há 15 dias na Baía de Sepetiba, entre Ilha Grande e a Restinga de Marambaia, no litoral do estado do Rio. Desde o último dia 10, após perder o controle do leme e se chocar com o fundo da baía, gerando danos ao casco e ao tanque de lastro, o navio de quase 300m de comprimento por 50m de largura passa por reparos e vistorias. Equipes do Instituto Estadual do Ambiente (INEA) e da Marinha descartaram risco de vazamento de óleo ou afundamento da embarcação. A operadora do navio, a empresa marítima Synergy, nega ter demorado a comunicar as autoridades.
O navio graneleiro – embarcação especializada no transporte de carga a granel –, de bandeira da Libéria, transporta milhares de toneladas de minério rumo a Singapura, no sudeste asiático. O True Conrad pertence à Global Meridian, empresa sediada nas ilhas Bermudas, no Caribe, e controlada pelo banco JP Morgan, dos EUA. A operação do graneleiro era feita pela Synergy Marine Group, sediada em Singapura. A viagem, que começou no porto de Itaguaí no dia 10, estava prevista para chegar ao fim no dia 11 de junho, quando o navio atracaria no porto da cidade-estado asiática.
Partindo do Porto de Itaguaí (RJ) às 00:47 do dia 10, segundo dados de satélite do site de monitoramento marítimo Marine Traffic, a embarcação seguia viagem normalmente por quase 4 horas. Às 04:35, a embarcação para repentinamente, próxima à Ilha Grande, no litoral de Angra dos Reis (RJ), onde permanece atracada até hoje. Segundo nota da Marinha, uma vistoria realizada na última sexta (19), acompanhada a bordo pela Delegacia da Capitania dos Portos em Itacuruçá, constatou que a embarcação está estável e que não há indícios de poluição do mar por vazamento de óleo, o que também foi confirmado pelo INEA (nota completa do órgão ambiental abaixo).
O órgão ambiental fluminense diz ter sido comunicado do incidente apenas no dia 15 – 5 dias depois –, e confirmou que multará os responsáveis pela carga e pela operação (ou armação, no jargão náutico) do navio. O valor cobrado ainda não foi confirmado com exatidão, mas segundo o INEA poderá chegar a R$ 50 mil para a Synergy e R$ 2 milhões para a CSN, por descumprimento de seu licenciamento ambiental, que obriga, no item 65, a empresa a “comunicar imediatamente à Gerência de Operações em Emergências Ambientais, do INEA, qualquer acidente ambiental”.
A CSN disse à reportagem, em nota, que só foi informada do ocorrido no domingo (14), e que já no dia seguinte houve uma reunião com presença do INEA, na Capitania dos Portos, para deliberar sobre o tema. A empresa completa dizendo que o assunto está sendo conduzido pela Marinha, “a autoridade competente para tal”. A nota completa está abaixo.
A Synergy, por sua vez, afirma que “todas as partes interessadas regulatórias e comerciais foram prontamente comunicadas do incidente”, e diz não ter sido notificada sobre qualquer multa. A nota completa também está ao fim da matéria.
No local onde o graneleiro está ancorado, próximo à Ilha Grande, está operando o navio rebocador Sagamorim II, da empresa náutica Camorim Serviços Marítimos. Rebocadores são embarcações que manobram outros navios em operações como atracação e desatracação, mas também resgatam os que não têm condições de navegar por conta própria. Outro rebocador da mesma empresa, o Brilhante, esteve no local das 21:30 do domingo (21) às 15:30 de ontem (24), quando foi substituído na operação.
Ainda no dia 12, ou seja, antes de quando a CSN disse ter sido informada do incidente, um outro rebocador começou a operar junto ao navio. Era o José Guilherme VIII, da empresa Chibatão Navegação e Comércio, que chegou ao local por volta das 22:15 daquele dia e se afastou às 00:05 do dia 14. Pouco depois, às 03:54, chegou o Atlântico, embarcação do tipo AHTS (especializada em manuseio de âncoras, reboque e transporte de suprimentos) da Camorim, que se afastou por volta das 06:30 do dia 17. Ainda antes da saída do Atlântico, às 05:10, o rebocador José Guilherme VIII voltou à cena, permanecendo até às 10:20 do dia 21, horas antes da chegada do Brilhante. Ainda na manhã daquele domingo, às 8:45, foi a vez do navio Rei Alberto – especializado no apoio a operações de mergulho – se aproximar do True Conrad. Ele foi rastreado na área até as 13:22 do mesmo dia.
A Synergy afirmou à reportagem que está conduzindo os reparos na qualidade de responsável técnica pela embarcação, e que o serviço dessa frota de apoio está sendo pago pela proprietária do navio (ou seja, a Global Meridian/JP Morgan). A empresa diz que os reparos devem ser concluídos “em breve”. Ao site norueguês especializado em transporte marítimo TradeWinds, a Synergy citou “danos subaquáticos” ao navio, e que seu “time de resposta a emergências trabalhou junto às autoridades locais e regulatórias para resolver a situação”.
Segundo a Marinha, ainda não é possível estimar quando o True Conrad poderá voltar a navegar, já que a vistoria de uma Sociedade Classificadora – empresas especializadas em certificação de segurança marítima – ainda está pendente. É essa vistoria que avaliará se os reparos emergenciais realizados são suficientes.
Palavra dos envolvidos
Além da nota da Marinha, disponibilizada acima, CSN e INEA também se pronunciaram (notas a seguir). A Synergy, por sua vez, não respondeu às tentativas de contato da reportagem. O espaço segue aberto.
INEA
O Instituto Estadual do Ambiente (Inea) informa que está acompanhando o caso junto com a Capitania dos Portos, observando os aspectos de prevenção ambiental e realizando o monitoramento conjunto da área.
A embarcação encontra-se fundeada, não havendo indícios de vazamento de óleo, ou da carga transportada.
Serão aplicadas multas pela não comunicação do incidente à CSN Mineração, responsável pela carga, e ao armador, responsável pela embarcação. O valor da multa no armador pode chegar a 50 mil reais, enquanto na CSN Mineração o valor pode alcançar 2 milhões de reais, por se tratar de descumprimento de condicionante de licença ambiental.
CSN
A CSN Mineração foi informada do ocorrido apenas no domingo (14/5), ou seja, três dias após o fato. Já no dia seguinte, segunda-feira (15/5), foi realizada reunião na Capitania dos Portos, inclusive com a participação do INEA, para deliberar sobre o tema. Cabe reforçar novamente que em vistoria realizada pela Marinha, foi detectado que a embarcação permanecia estável, sem risco eminente ou quaisquer indícios de poluição hídrica.
A Marinha do Brasil está conduzindo o assunto, que é a autoridade competente para tal.
Synergy
Em resposta às nossas perguntas, a Synergy esclareceu que a exata causa do incidente ainda está em investigação e que é a gerente técnica da embarcação, que navegava com um piloto local. “Estamos em contínua comunicação com as autoridades brasileiras e totalmente de acordo e respeitosos às regulações brasileiras. A empresa de rebocadores foi escolhida com base nos requerimentos regulatórios, e o serviço de rebocadores está sendo pago pela proprietária do navio”, frisou a empresa.
*Editado às 15h22, do dia 26 de maio de 2023, para acrescentar a resposta da Synergy.
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