Um Pantanal cada vez mais seco e castigado pelo fogo, esse é o retrato dos últimos 36 anos de acordo com o levantamento realizado pelo MapBiomas, que analisou as mudanças na cobertura do bioma entre 1985 e 2020. Enquanto a primeira cheia registrada na série histórica, que ocorreu entre 1988 e 1989, resultou numa superfície total de água e campos alagados de 5,8 milhões de hectares, a última cheia da série, registrada em 2018, ocupou uma superfície 29% menor, de apenas 4,1 milhões de hectares entre áreas de água e de campos alagados. Em 2020, a soma dessas áreas foi de 1,5 milhões de hectares, a menor cobertura dos últimos 36 anos.
Um dos principais rios do Pantanal, o Taquari, cujas nascentes estão no Planalto, na região central do país, é uma das testemunhas do avanço da seca no bioma. Em menos de 30 anos, o rio foi obrigado a mudar de curso e deixar para trás mais de 150 quilômetros de leito seco. De acordo com a análise do MapBiomas, a expansão das atividades agropecuárias associadas à falta de proteção dos rios e das nascentes, intensificaram a deposição de sedimentos na planície – o Pantanal – e aceleraram o assoreamento de parte do curso d’água. A construção de hidrelétricas, que afetam o ciclo hídrico natural, também são fatores que contribuem para o desequilíbrio dos rios.
Os dados, obtidos através de imagens de satélite e mapas de cobertura de uso e solo no Brasil, fazem parte da Coleção 6 do MapBiomas e foram divulgados em webinar transmitido no Youtube nesta quarta-feira (29).
Em 2020, o Pantanal ainda possuía 83,8% da sua extensão de áreas naturais, com predomínio das vegetações campestres (40,3%), seguido por formações florestais (19,1%) e formações savânicas (14,1%). A superfície de água e de campos alagados juntas somavam pouco mais de 10% da cobertura do bioma até o ano passado. Já as pastagens, ocupavam 16,1% da área do bioma em 2020. Desde 1985, as áreas de uso antrópico no bioma mais que dobraram (+261%) e se estenderam por mais 1,8 milhões de hectares, o equivalente em áreas naturais perdidas no período.
O levantamento também observou toda a Bacia do Alto Paraguai, que inclui não apenas o Pantanal, mas também áreas de Cerrado e da Amazônia, e onde estão as principais nascentes e rios que alimentam a planície pantaneira. Em 2020, 40% da bacia estava ocupada por uso agropecuário. Desde 1985, atividades como a pastagem e a agricultura avançaram na região, com expansão de 5,4 milhões de hectares e 1,3 milhões de hectares, respectivamente. No caso da agricultura, isso representa quase a triplicação da área ocupada pela atividade em 1985.
“A conservação do Pantanal, sua cultura e seu uso tradicional dependem dos ciclos de inundações e dos rios que nascem na região do Planalto, onde ficam as cabeceiras da Bacia do Alto Paraguai”, explica Eduardo Rosa, do MapBiomas.
Pantanal é o bioma que mais queimou nos últimos 36 anos
O fogo e a cicatriz deixada por ele na paisagem pantaneira também foram destaques no levantamento do MapBiomas, afinal de contas, a vegetação cada vez mais seca é o combustível perfeito e torna todo o bioma mais suscetível ao fogo.
De acordo com a análise, nos últimos 36 anos, em média 8.053 km² queimaram anualmente no Pantanal, o equivalente a 5,3% da área do bioma ou mais de 5 vezes a área da cidade de São Paulo em chamas todo ano. Quase a totalidade do fogo (93%) ocorreu em áreas naturais – sendo três quartos do total sobre vegetação campestre e savanas – e apenas 7% em zonas de uso humano.
De todos os biomas brasileiros, o Pantanal foi o que mais queimou nos últimos 36 anos: com mais da metade do bioma (57,5%) foi atingida pelas chamas pelo menos uma vez no período. Destas, mais da metade, cerca de 67%, queimaram mais de uma vez. Em 2020 foram mais de 2,3 milhões de hectares queimados, o maior registro do milênio e o segundo maior desde 1985 – perde apenas para as queimadas do ano de 1999.
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