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Justiça derruba nomeação de produtora rural à chefia do Parque da Lagoa do Peixe

4ª Vara Federal de Porto Alegre acatou pedido do MPF e afastou Maíra Santos de Souza da chefia da unidade de conservação. A decisão é liminar

Daniele Bragança ·
14 de outubro de 2019 · 4 anos atrás
Parque Nacional da Lagoa do Peixe. A unidade de conservação está localizada em uma extensa planície costeira arenosa situada entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico e é área prioritária para a conservação de aves migratórias. Foto: Jackson Müller/Wikiparques.

A Justiça Federal acatou o pedido do Ministério Público e suspendeu a nomeação da agrônoma Maira Santos de Souza, que desde julho chefiava o Parque Nacional da Lagoa do Peixe, no Rio Grande do Sul. Filha de fazendeiro famoso da região, Maira, de 25 anos, tem como experiência profissional antes da posse o trabalho na fazenda da própria família, que produz arroz e soja.

A ausência de experiência na área ambiental foi o principal argumento do Ministério Público Federal, que ajuizou uma Ação Civil Pública no início de setembro, alegando que a nomeação da agrônoma contraria o decreto 9.727/2019, editado em março de 2019 pelo próprio governo e que instituiu que os ocupantes de cargos de livre nomeação devem ter perfil profissional compatível com as atribuições do cargo.

Para a Justiça, o governo desrespeitou as próprias regras que estabeleceu.

“Não é suficiente para o cumprimento dos requisitos legais estabelecidos a formação em Agronomia e o trabalho na Fazenda ASPS no setor de gestão de equipes, Fazenda essa de seu pai, na qual desempenha, segundo declarou, as seguintes atividades: Auxiliando no preparo do solo, plantio e colheita da lavou de arroz e soja; auxiliar de escritório (planilha de custos, folha ponto, emissão de notas fiscais, pagamentos e outros)”, escreveu o juiz Bruno Brum Ribas, da 4ª Vara Federal de Porto Alegre. “Tais atividades não podem ser consideradas correlatas à de Chefe do Parque Nacional da Lagoa do Peixe, a não ser que se pretenda transformar uma unidade de conservação e proteção de ecossistemas naturais em uma área de exploração agropecuária. Tratam-se, em muitas situações, de atividades colidentes ou conflitantes”, decidiu.

A decisão é liminar e cabe recurso.

Governo estuda transformar o parque em APA

Evento em Tavares, onde foi pedido a recategorização do parque. Foto: Instagram/Ricardo Salles.

O Parque Nacional da Lagoa do Peixe foi palco da primeira grande quebra de braço entre o ministro do Meio Ambiente e as unidades de conservação. O episódio culminou com o pedido de demissão do presidente do ICMBio, Adalberto Eberhard.

Tudo começou em abril, quando o ministro foi visitar o estado e participou de um encontro com produtores rurais em Tavares (RS), município onde está inserido, junto com o de Mostardas (RS), a unidade de conservação. Na ocasião, Salles ameaçou abrir processos administrativos contra os servidores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que não compareceram ao evento onde produtores reclamavam das restrições impostas pela existência do Parque Nacional da Lagoa do Peixe, criado em 1986. Dois dias depois, Adalberto Eberhard pediu demissão do cargo.

Na reunião, os moradores pediram a transformação do parque em APA (Área de Proteção Ambiental), a categoria mais branda dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que permite inclusive residências e produção como mineração e criação de gado.

A nomeação de Maira, indicada pelo deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) dois meses depois, foi lida como aceno para o início deste processo.

 

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  • Daniele Bragança

    Repórter e editora do site ((o))eco, especializada na cobertura de legislação e política ambiental.

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Comentários 1

  1. Jose Francisco diz:

    É possível abrir uma Ação Civil Pública, deste mesmo modelo, para o atual ministro do meio ambiente? Dadas as ações que o mesmo tem tomado na contramão da defesa dos parques, biomas, em síntese, da riqueza natural do país? Isso já não é argumento suficiente para qualifica-lo como NÃO apto para o cargo que ocupa?