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Mamíferos aquáticos são mais vulneráveis a agrotóxicos

Funções genéticas que foram perdidas durante a adaptação para viver na água estavam associadas também a uma enzima que protege mamíferos terrestres dos efeitos de pesticidas organofosforados

Vandré Fonseca ·
9 de agosto de 2018 · 6 anos atrás
Mamíferos aquáticos, como o peixe-boi-marinho, perderam a habilidade de produzir uma proteína que defende humanos e outros mamíferos terrestres de efeitos neurotóxicos de um popular pesticida produzido pelo homem. Crédito: R. Bonde, US Geological Survey.

Devido a adaptações genéticas para viver na água, mamíferos aquáticos, como golfinhos ou peixes-bois, são incapazes de produzir uma proteína que protege seres humanos e outros mamíferos terrestres dos efeitos neurotóxicos de pesticidas organofosforados. Isto provavelmente os torna mais vulneráveis à contaminação por agrotóxicos provenientes da agricultura.

A descoberta de que a adaptação para viver em ambientes aquáticos resultou na perda da capacidade de produzir uma enzima foi feita por pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Pittsburgh, Estados Unidos, e publicada nesta quinta-feira (09) na Science. Essa enzima, chamada paraoxonase 1 (PON1), que está associada às sensações de cheiro e sabor, ajuda também a reduzir os efeitos dos organofosforados,

Organofosforados são apontados como os principais causadores de mortes e intoxicação por agrotóxicos no país. Eles podem se acumular no corpo, especialmente no cérebro, causando problemas no sistema nervoso. São usados no combate a insetos, que não produzem a PON1 e por isso são vulneráveis aos efeitos neurotóxicos do produto. As pesquisas ainda não são conclusivas quanto aos danos provocados por esses produtos à saúde dos animais aquáticos.

Pesquisadores estudavam genes associados aos sentidos do odor e paladar, que perderam funções em mamíferos que se adaptaram à vida aquática. Após analisar as sequências genéticas de cinco mamíferos aquáticos e 53 terrestres, concluíram que a os genes responsáveis pela produção da PON 1 tinham também um papel fundamental na diferenciação de cheiros e sabores.

Crédito: R. Bonde, US Geological Survey.

Os pesquisadores acreditam que a perda da função destes genes está associada à necessidade de mamíferos aquáticos mergulharem a grandes profundidades e retornarem rapidamente à superfície. A ausência dela significaria menor estresse de oxigênio provocado pelas mudanças de pressão na água.

Essa adaptação ocorreu em momentos diferentes em cada grupo de mamíferos aquáticos. Peixes-bois perderam a capacidade de produzir a enzima após se separem do ancestral comum que tinham com o elefante, há 64 milhões de anos. Já baleias e golfinhos se adaptaram depois, há 53 milhões de anos, após evoluírem a partir de um ancestral comum com o hipopótamo. Já as focas perderam mais recentemente, no máximo 21 milhões de anos atrás.

Os autores do estudo lembram de pesquisas anteriores que demonstraram a grande quantidade de pesticidas organofosforados no habitat de peixes-bois-marinhos nos Estados Unidos. O produto usado na agricultura acaba sendo carreado para os rios e levado até o mar. Eles destacam a necessidade de monitorar a presença desses produtos no ambiente e no organismo dos animais, para conhecer melhor a exposição da vida marinha aos organofosforados.

“Mamíferos marinhos, como manatis ou golfinhos-nariz-de-garrafas são espécies sentinela, como um canário na mina de carvão”, afirma um dos autores do estudo, Nathan L Clark, professor associado do Departamento de Biologia Sistemas e Computacional e do Centro para Biologia Evolucionária e Medicina do Pittsburgh Center. Se você seguir a saúde deles, isto vai dizer muito sobre questões ambientais que podem eventualmente afetar humanos”, completa.

 

 

Saiba Mais

Artigo: Ancient convergent losses of Paraoxonase 1 yield potential risks for modern marine mammals.

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