A conservação dos micos-leões-dourados ganhou uma boa notícia neste mês. A Associação Mico-Leão-Dourado (AMLD), ONG dedicada a proteger esta espécie ameaçada de extinção e exclusiva da Mata Atlântica do Rio de Janeiro, anunciou a compra da Fazenda Santo Antônio, em Silva Jardim, no interior do estado. A propriedade rural, de 103 hectares, está localizada exatamente entre dois grandes fragmentos do bioma, que juntos somam mais de 20 mil hectares por onde a espécie circula. A área será reflorestada e servirá de conexão entre os blocos.
Oficializada no último dia 8, a aquisição foi financiada com recursos doados pelas organizações Rainforest Trust e DOB Ecology, parceiras da AMLD. A fazenda fica no Vale dos Patis, área de várzea do rio São João, região de forte uso agrícola, com plantações que impedem a conexão entre os fragmentos de floresta. O plano da associação agora é reflorestar 44 hectares (o equivalente a 44 campos de futebol) com espécies nativas, ligando os dois fragmentos de floresta. A ONG estima que, uma vez feito o plantio, a floresta deva levar de 4 a 7 anos para ficar adequada à passagem dos micos.
“A aquisição da Fazenda Santo Antônio é fundamental para o programa de conservação do mico-leão-dourado”, frisou Luís Paulo Ferraz, secretário-executivo da Associação Mico-Leão Dourado. “Ela vai permitir a consolidação de um corredor florestal, depois que a Mata Atlântica for restaurada nesta propriedade, para conectar os dois maiores fragmentos florestais de Mata Atlântica de baixada – única área no mundo em que vive o mico-leão-dourado”, destacou.
O plano da AMLD, agora, é dividido em duas partes: dos 44 hectares a serem recuperados, 20 serão através de plantio direto, com mais de 33 mil mudas no total. “São 1.667 mudas por hectare e devemos usar de 40 a 50 espécies nessa área”, explica Ferraz, que também é engenheiro florestal. Além disso, mais 24 hectares passarão por regeneração natural supervisionada pelos profissionais da ONG, com a própria natureza se encarregando da recuperação por meio da dispersão de sementes feita por animais. “O monitoramento vai nos dizer se precisamos intervir com um enriquecimento daquela área ou não”, explica o secretário-executivo da ONG. O restante da propriedade já está coberta pela vegetação.
Ele explica que o primeiro trabalho a ser feito na área é uma preparação do solo, que terá sua acidez avaliada e, se necessário, corrigida. Depois disso, será feito o roçado e o controle de espécies invasoras que possam atrapalhar o crescimento das mudas, como gramíneas. É depois desse trabalho minucioso que serão demarcados os espaços para o plantio das mudas. Para garantir o sucesso da empreitada, a área contará com a manutenção da ONG durante 2 a 3 anos, com adubação para acelerar o crescimento e recobrimento da área. “A grande competição é com o capim”, explica Ferraz.
Toda a área da fazenda será monitorada para avaliar tanto o ritmo da recuperação florestal quanto o uso do corredor pela fauna – e não apenas pelo mico-leão-dourado. O monitoramento é o que vai embasar a tomada de decisões, inclusive para eventual enriquecimento também da área destinada à regeneração natural. Essa área, diferente das destinadas ao plantio de mudas, conta com vegetação já em estado inicial de recuperação, com presença de arbustos.
Além disso, para garantir a proteção permanente da floresta a ser restaurada, a ONG pretende transformar a propriedade em uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), unidade de conservação de caráter privado que ficará sob sua gestão. De acordo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, uma vez que uma área é convertida em RPPN, seu status é perpétuo, não podendo mais voltar aos seus antigos usos.
Segundo censo realizado no ano passado pela Associação Mico-Leão-Dourado, a espécie conta atualmente com 4.800 indivíduos na área da Bacia do Rio São João – nos anos 1970, a população era de apenas 200 indivíduos, segundo a ONG. A espécie é encontrada, além de em Silva Jardim, nos municípios de Casimiro de Abreu, Rio Bonito, Cachoeiras de Macacu, Araruama, Rio das Ostras, Cabo Frio e Macaé, todos na mesma região. Com o novo corredor, a AMLD ficará mais próxima de alcançar sua meta de ter 25 mil hectares de florestas protegidas e conectadas nesta bacia, único habitat do mico-leão-dourado.
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Que linda notícia. Li recentemente sobre o feito de Douglas Tompkins, na patagônia. É animador e inspirador vê algo semelhante se do feito aqui tbm.
Obrigado pela matéria.
Muito bacana a iniciativa.
Tem tanta, mas tanta, mas tanta área de mata atlântica fechada entre Angra dos Reis à Bananal que eu me pergunto o porquê de existir força de vontade alguma de repovoar esses animais nesta área e deixarem somente em área de fragmento de mata atlântica.