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Ricardo Galvão é o novo presidente do CNPq

Quase 4 anos após ser demitido do INPE por embates com o então presidente Bolsonaro, pesquisador volta a um cargo central para a ciência do país

Gabriel Tussini ·
18 de janeiro de 2023 · 1 anos atrás

O físico Ricardo Galvão é novo presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O anúncio oficial ocorreu em cerimônia realizada no auditório da agência, em Brasília, na tarde de ontem (17). Ele assume com o desafio de reajustar as bolsas de pesquisa no país, congeladas desde 2013. Em emocionado discurso, ele afirmou que a sua nomeação e a de Mercedes Bustamante, nova presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), representam a “comprovação de que nossa ciência sobreviveu ao cataclisma político promovido por um governo negacionista”.

Galvão lembrou a postura anti-ciência do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, e agradeceu os servidores do CNPq e demais unidades do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. “Eu tenho 51 anos de serviço público”, disse o pesquisador, emocionado. “E todos sabem como os servidores públicos são acusados de não fazer nada, de não trabalhar, de não produzir. Vocês foram o sustento contra esse governo. Eu sou muito agradecido”, completou, afirmando que a “truculência e o negacionismo” foram derrotados pelo povo brasileiro.

Em entrevista à Rádio CBN nesta quarta (18), Galvão disse que o órgão já estuda reajustar as bolsas de pesquisa em 40%, embora isso ainda não esteja definido. O assunto, segundo ele, será discutido ainda hoje em reunião com a Casa Civil da presidência.

Na cerimônia, a ministra da Ciência e Tecnologia, Luciana Santos, anunciou ainda a “recomposição integral” do orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que financia programas e projetos prioritários na área. Os recursos serão liberados a partir de fevereiro, quando a Medida Provisória 1136/22, que bloqueou recursos do fundo até 2026, perde a validade. Quase R$ 10 bilhões estarão disponíveis para o FNDCT. É daí que devem sair os recursos para o prometido reajuste das bolsas.

Ricardo Galvão substituirá o agrônomo e professor da Universidade Federal de Viçosa (UFV) Evaldo Vilela, presente na cerimônia de anúncio e que estava no cargo desde maio de 2020. Apesar das críticas de Galvão ao negacionismo bolsonarista, ele elogiou a capacidade de Vilela para manter a agência “operacional” nesse período.

O novo presidente do CNPq, livre-docente em física experimental pela Universidade de São Paulo (USP), já esteve à frente de diversas outras organizações científicas. Além de ser membro das academias brasileira e paulista de Ciências, ele foi diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (2004-2011), da Sociedade Brasileira de Física (2013-2016) e, mais recentemente, do Inpe, entre 2016 e sua turbulenta exoneração em 2019, após embate com o ex-presidente Jair Bolsonaro. 

Em 2022, Galvão concorreu a deputado federal pela REDE-SP, recebendo 40 mil votos, insuficientes para garantir uma vaga. Em novembro, foi nomeado membro do Grupo Técnico de Ciência, Tecnologia e Inovação da equipe de transição governamental.

Em lembrança à saída de Galvão do Inpe, a ministra Luciana Santos disse que “hoje é dia em que se faz justiça à ciência brasileira”. “Hoje sepultamos o negacionismo ambiental e exaltamos o trabalho feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais “, afirmou.

Foto: Wesley Sousa/ASCOM/MCTI

Enfrentamento a Bolsonaro

Em julho de 2019, dados do sistema Deter-B, do Inpe, apontaram que a Amazônia sofria sua segunda maior perda florestal até meados daquele mês desde o início da série histórica, em 2015. Em resposta, o então presidente Jair Bolsonaro disse ter “a convicção de que os dados são mentirosos” e que a floresta “já estaria extinta” se houvesse toda essa devastação. Bolsonaro afirmou que mandaria “o cara que está à frente do Inpe” se explicar em Brasília, especulando que Galvão estaria “a serviço de alguma ONG”.

No dia seguinte, Ricardo Galvão, que de início preferiu não responder, quebrou o silêncio classificando a postura do presidente como “pusilânime e covarde”, afirmando que seus comentários eram “impróprios e sem nenhum embasamento”, “ataques inaceitáveis não somente a mim, mas a pessoas que trabalham pela ciência desse país”. O presidente do Inpe disse acreditar que Bolsonaro fez os comentários esperando que ele pedisse demissão, mas se recusou a fazê-lo. Após 13 dias de tensões em alta, Galvão acabou sendo exonerado de seu cargo, 1 ano antes do fim do mandato.

Em sua posse no CNPq, o físico disse que o governo Bolsonaro “empreendeu um verdadeiro desmonte das políticas públicas em diversas áreas”, e que “no dia de hoje, viramos essa página triste de nossa história com a convicção de que a ciência voltará a prometer grandes avanços para nossa sociedade através da autoridade do conhecimento”.

  • Gabriel Tussini

    Estudante de jornalismo na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), redator em ((o))eco e interessado em meio ambiente, política e no que não está nos holofotes ao redor do mundo.

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