Reportagens

O último suspiro

MMA solta nota oficial que ao mesmo tempo critica o projeto de Lei de Biossegurança aprovado na Câmara e admite que não tem mais nada a fazer sobre o assunto.

Carolina Mourão ·
4 de março de 2005 · 20 anos atrás

O golpe foi duro e concretizou o pior pesadelo de Marina Silva depois que assumiu o Ministério do Meio Ambiente. No final da tarde desta quinta-feira o ministério acenou o lenço da derrota sobre o projeto de Biossegurança com uma nota oficial. O texto afirma que o projeto, nos artigos referentes aos transgênicos, “relega os órgãos públicos” ao conferir a CTNBio “poderes exclusivos e vinculantes na liberação da produção comercial de organismos geneticamente modificados”. Considerada precipitada por muitos, a nota soou como suspiro final de uma guerra perdida há muito tempo para o ministro Roberto Rodrigues, da agricultura.


A ministra poderia tentar o último apelo, pedindo o veto do presidente Lula aos artigos que tratam dos transgênicos, durante os dias em que a matéria será examinada na Casa Civil antes da sanção. Mas nem o Ministério do Meio Ambiente, nem o Planalto, demonstraram algum movimento neste sentido. Até porque, se Marina insistir no assunto e não conseguir sensibilizar Lula, acabarea sem alternativa a não ser o pedido de demissão.


O regimento interno da Câmara determina que o prazo para que o projeto aprovado seja encaminhado para a Casa Civil é de duas sessões ordinárias seguintes no plenário da Casa. Portanto, até o fim desta sexta-feira, o projeto deve chegar à Casa Civil da Presidência da República. Lá fica por até 15 dias, para que sejam examinados os princípios de legalidade e constitucionalidade dos artigos. Só depois vai a sanção presidencial.


A superintendente de conservação da WWF, Rosa Sá não acredita no veto, mas encontrou a solução alternativa depois da derrota: “ O presidente ainda pode incluir no texto o Princípio da Precaução, dispositivo utilizado em pesquisas médicas, feitas sob a luz da lei, onde só se libera o produto depois de muitos testes”, diz ela. Sonho puro. O presidente não tem poder de legislar, portanto não pode incluir nada em texto de lei aprovado pelo Congresso Nacional. Teria que fazer uma nova lei ou introduzir o princípio cautelar na regulamentação da lei. Mesmo assim, estaria obrigado a obedecer ao texto da lei original, que dá poder hegemônico da CTNBio.


Contando com a participação da sociedade, o Greenpeace acredita que é possível exigir de Lula o veto aos artigos do projeto que tratam dos transgênicos. Gabriela Couto, integrante da Campanha de Engenharia Genética da ONG, disse que a sociedade civil já ameaça um boicote aos produtos e derivados de transgênicos. “Temos de tentar o veto com este argumento. Se não der, vamos continuar a ação do boicote de forma sistemática e continuada. Oitenta por cento dos brasileiros não queriam os transgênicos liberados, segundo pesquisas, e estão dispostos a reagir.”


É neste cenário que a sociedade acompanha o momento mais doloroso do calvário de Marina Silva, desde que assumiu a cadeira do ministério. Uma espécie alívio de uma grande pressão e uma contagem regressiva fatal, que ainda vai durar por esses dias antes da sanção. Cansada demais para cumprir os últimos metros para a linha de chegada, Marina se entrega, sabendo que esta briga tinha outro vencedor há muito tempo.


” Ciente da plena competência constitucional do Congresso Nacional de aprovar democraticamente as normas legais que regem o País, o Ministério do Meio Ambiente sente-se na obrigação de apontar à sociedade brasileira os potenciais riscos ambientais envolvidos no projeto de lei aprovado”, diz a nota da ministra.

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