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Final feliz, ou quase

O projeto de Florestas Públicas passou na Comissão Especial da Câmara. Todas as partes interessadas, desde governo até grileiros, saíram com o seu quinhão.

Carolina Mourão · Isabel Heringer ·
2 de junho de 2005 · 20 anos atrás

Se fosse uma briga de cabo de guerra, a corda tinha partido ao meio. Mas depois de muita negociação, no último dia, todas as partes interessadas ficaram satisfeitas. Na hora da verdade, o substitutivo passou por unanimidade. Até em números de emenda, praticamente houve empate: 44% – um total de 133 emendas – das 305 protocoladas foram aprovadas, com alguns destaques a serem debatidos no dia da votação em plenário.

A longa sessão, que começou no início da tarde e só terminou quase às 22h, se deveu ao PSDB e principalmente aos ruralistas da Amazônia, que tentaram até o último minuto adiar a votação, quando não propunham sérias modificações – já impossíveis a esta altura do debate – sobre o texto do Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas. No meio da tarde, a situação ficou tensa para o governo. O deputado Anivaldo Vale (PSDB-PA), o mais empenhado da bancada, articulou como ninguém modificações de última hora, mas por pouco não saiu de mãos abanando.

O PSDB chegou a ameaçar não votar a favor na terça-feira, do plenário da Casa e até no Senado, caso a redação do artigo 72, que tratava de áreas públicas desmatadas e convertidas para uso alternativo do solo, não fosse mudado. Mas as pressões não sensibilizaram o relator, que manteve a postura de lutar pelo texto. “Nós já avançamos bastante com relação ao artigo 55”, disse o relator Beto Albuquerque, referindo-se à negociação em torno do artigo que trata da competência do Serviço Florestal Brasileiro, autarquia que será criada para avaliar as concessões de manejo caso o projeto seja aprovado em plenário. “Por isso não posso ceder mais”. Para dobrar o PSDB, foi retirado o termo que trata da assinatura de compromisso de confidencialidade para pessoa física ou jurídica, do artigo 43. Esse seria um dos destaques a ser levantados em plenário. Ao final, o partido prometeu votar a favor até no Senado.

Já os ruralistas prometiam votar contra o projeto, tentando fazer o milagre de conciliar no mesmo documento sustentabilidade e conflitos agrários. “A gente tem bancada para isso”, disse Agamenon Menezes, representante do setor agropecuário e velho ninho de grileiros que esteve lá, perturbando, desde o início dos debates, para modificar o projeto a favor da grilagem na Amazônia. A discussão sobre a participação da comunidade local, no artigo 2ª inciso III, foi um dos pontos polêmicos do dia.

Para o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), “os grileiros que estão destruindo a Amazônia não podem ser incorporados na categoria de comunidade local”. O termo, amplo, não especifica quem é a comunidade local. Era o que os ruralistas queriam, e saíram felizes. Agamenon aproveitou o ensejo para comemorar a provação da MP 239, um dia antes: ”A vitória da MP 239, nesta terça-feira, vai encarrilhar a de hoje”, comemorou ao lembrar que a medida garante o direito a propriedade excluindo as propriedades rurais de interdição.

“Esse não é o projeto dos olhos do PV. Mas nós vamos apoiar porque se isso não for votado agora, não sai mais daqui”, disse o deputado Sarney Filho. Já o deputado Asdrubal Bentes (PMDB-PA), criou barreiras até o fim. Já depois da leitura do relatório, ele ainda tentou inserir mudanças nos artigos 19 e 78. Beto Albuquerque não perdeu a chance: ”Fique tranqüilo, deputado, não há nenhuma outra coisa subterfúgia”, disse, ao se referir a uma suposta mudança no texto, que não ocorreu, citada por Asdrúbal, que chegou depois na reunião, e perdeu o bonde. O deputado Asdrúbal, não conseguiu as mudanças, mas parecia muito satisfeito. “Perfeição não existe aqui na terra”, acrescentou.

Tasso Azevedo, Diretor Nacional de Florestas, fez um balanço sobre a aprovação do relatório final. “Está ótimo. Tem alguns pontos que podiam ter sido melhorados. A insistência do relator sobre o Serviço Florestal Brasileiro. O texto original trabalhava a gestão e uma série de ações de apoio ao manejo florestal. Ele limitou sua atuação às florestas públicas”, disse. Esse foi o favor que o Beto fez em troca da votação a favor da bancada do PSDB. “Outro ponto é o artigo novo, o 72, que exclui as concessões das áreas ocupadas e desmatadas. Mas vamos tentar tudo para que o projeto seja votado já nesta quinta-feira”, continuou. Severino pode colocar o projeto na frente das MPS, que trancam a pauta. Está nas mãos dele a Câmara fechar com chave de ouro essa questão e dar este presente à semana do meio ambiente.

O relator, deputado Beto Albuquerque, merece destaque. Não mediu esforços, desde o início das discussões, para conciliar as partes, chegar a um meio termo e pôr de uma vez por todas em votação a matéria, que quase descambou para o esquecimento burocrático da Casa. “A luta contra o tempo não foi brincadeira. Aqui perder o tempo das coisas, no sentido do termo, significa engavetar uma proposta”, e ressaltou: “Não estamos aqui fazendo concessão de terras públicas, mas de manejo, de pensar a Amazônia com pessoas dentro. A floresta intocável, mas constantemente violada, é um modelo ultrapassado”, disse.

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