A baixa umidade do ar nos dias frios e sem chuva, associada às emissões de poluentes por veículos e indústrias, são responsáveis por uma série de doenças respiratórias. Mas não é só no inverno que as reações alérgicas provocam a superlotação dos hospitais nas grandes cidades. O ozônio produzido nos dias de calor pode causar problemas tão ou mais graves que as doenças das estações frias. Ou seja, temos veneno para o ano todo.
O ozônio é formado por uma reação entre os raios ultravioleta do sol e os poluentes liberados pelos automóveis, refinarias e fábricas. Nas altas temperaturas dos meses de primavera e verão, causa problemas como sinusite, rinite, irritação dos olhos, nariz e garganta, náusea, dor de cabeça, fadiga, aumento do muco e diminuição da resistência orgânica às infecções. “Pessoas que moram em locais de maior exposição ao ozônio estão sujeitas ainda à deterioração da função pulmonar”, alerta o médico patologista Paulo Saldiva, do Laboratório de Poluição Atmosférica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Além do impacto sobre a saúde humana, o ozônio provoca efeitos drásticos no meio ambiente. Pode causar desde a redução das safras de frutas e vegetais até aumentar a suscetibilidade das plantas aos insetos. De acordo com estudos da California Air Resources Board, somente neste estado americano o impacto econômico do ozônio sobre a agricultura gira em torno de 490 milhões de dólares ao ano. E não é só isso. O gás pode deteriorar a vegetação de jardins e ecossistemas naturais. No parque Ibirapuera, em São Paulo, os efeitos do ozônio são facilmente visíveis. Basta caminhar para dentro do parque, região em que o gás ocorre em grande quantidade, para notar os estragos causados nas folhas. Oxidadas pelo poluente, elas apresentam necrose (morte de parte das células) em diversos pontos.
Apesar de precisar dos gases emitidos pelos veículos para ser formado, o ozônio está presente em altas concentrações onde não há tráfego. Por isso, a idéia de estar protegido em regiões com vegetação rica está errada. “É preciso evitar fazer exercícios, mesmo dentro de parques, em certos momentos do dia. O ideal é fugir dos horários entre 10h e 16h, quando a luz solar está reagindo com os poluentes e produzindo o ozônio”, destaca Saldiva. Ele comenta que, normalmente, crianças e atletas são os mais expostos ao gás, por passarem mais tempo em lugares abertos.
Também é preciso desmistificar a idéia de que, se o dia está ensolarado e sem nuvens, é hora de aproveitar. “Isso é muito errado. O céu limpo contribui ainda mais para a incidência dos raios solares. Quem acha que dias bonitos são apropriados para praticar esportes ao ar livre está enganado. É exatamente aí que devemos procurar locais fechados, onde o gás não ocorre com facilidade”, ressalta o químico Jesuíno Romano, gerente da Divisão de Tecnologia e Avaliação da Qualidade do Ar da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb).
Situação propícia
São Paulo apresentou na última semana condições adequadas para a formação do ozônio em grande escala. O Índice Ultravioleta (medida de intensidade da radiação relacionada com os efeitos sobre a pele humana) na cidade chegou ao nível 13, sendo 14 o grau máximo. Conseqüentemente, a temperatura subiu. Na segunda-feira, dia 16, os termômetros da capital paulista registraram a mais alta temperatura desde o início do verão: 33,9º C. De acordo com técnicos de diversos institutos, o clima deve continuar quente nos próximos três meses.
A medição diária da Cetesb confirma os altos níveis de ozônio. No dia mais quente do ano, oito das 12 estações espalhadas pela região metropolitana de São Paulo apontaram para a qualidade do ar má ou inadequada no que diz respeito à concentração desse gás. “Não é um estado de alerta, mas é bom prevenir. O cidadão que puder evitar o uso de veículos, por exemplo, estará contribuindo muito para a saúde dele e dos outros”, diz Romano.
Não é só em São Paulo, porém, que o ozônio prejudica a população. “As pessoas, muitas vezes, têm a impressão de que só aqui tem esse problema. Isso acontece porque em outras cidades os níveis do gás não são medidos”, diz o médico Paulo Saldiva.
Vale lembrar que o ozônio é tóxico somente quando está na faixa do solo próxima em que vivemos. Na estratosfera, tem a importante função de proteger a Terra como um filtro dos raios ultravioletas emitidos pelo sol. “É claro que, se chegássemos até lá e respirássemos o ozônio, morreríamos. Trata-se do mesmo gás, com funções diferentes de acordo com o local em que se encontra”, explica.
Como não é possível se livrar desse poluente com tanta facilidade, a dica é se prevenir e seguir os conselhos dos especialistas. Exercícios físicos, por exemplo, somente em horários com pouco sol. “Enquanto não tivermos um prefeito maluco que invente um foguete gigante que funcione como ventilador dos gases, temos de tomar alguns cuidados”, brinca Saldiva.
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