Acabou a contagem regressiva. A conferência do clima começou em Copenhague às dez horas da manhã fria e nublada desta segunda-feira, com autoridades dinamarquesas exigindo o fechamento de um acordo e o sucesso das negociações até o dia 18 de dezembro. Foi assim, afastando a comentada possibilidade de que os países fechassem um acordo somente em meados do ano que vem, que o primeiro ministro dinamarquês Lars Loekke Rasmussen iniciou seu discurso de boas vindas às delegações de 192 países presentes a Copenhague. “Ninguém subestima as dificuldades das próximas duas semanas, mas há um desejo manifesto de fazer um acordo político com metas, forte e ambicioso, efetivo e operacional”, afirmou Rasmussen, numa conveniente lembrança sobre a pré-disposição pelo fechamento do acordo desejado, anunciada por diversos países dias antes da conferência. Até agora 110 chefes de estado confirmaram presença no evento na semana que vem.
Entre os motivos para que o acordo seja fechado de vez em Copenhague, Rajendra Pachauri, chefe do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), lembrou que os negociadores devem colocar as exigências ecológicas na frente da política. “Na falta de ações de mitigação, as chuvas vão aumentar, e muito, as fontes de água vão se exaurir, a camada de gelo da Groenlândia vai diminuir ao ponto de o mar se elevar de quatro a seis metros, até o fim do século, dois bilhões de pessoas estarão expostas em áreas de fortes inundações já em 2018”, citou Pachauri, só para exemplificar. “Gastar menos de 3% do PIB mundial até 2030 em ações de mitigação evitaria maiores catástrofes decorrentes do aquecimento do planeta entre 2 e 2.4 graus Celsius”, disse.
Confiantes na força das manifestações populares em Copenhague e no resto do mundo nos últimos meses, os dinamarqueses querem demonstrar que esta conferência será marcante e determinará novas referências, na forma e no conteúdo. Para começar, nenhum delegado recebeu uma daquelas bolsas recheadas de presentes e lembranças da COP-15. Desperdício de dinheiro. Em vez disso, o governo utilizou o recurso para bancar os estudos e a capacitação de 11 estudantes de países em desenvolvimento na Dinamarca. Tem muito mais.
Forma e conteúdo
Números da COP15
Pedidos de credenciamento de jornalistas: mais de 5 mil. Jornalistas autorizados a cobrir a COP 15: 3.500 Expectativa de participantes: 15 mil. Pedidos de participação: 34 mil. Mensagens gravadas pelo Youtube e exibidas em Copenhague: 4 milhões Computadores à disposição: 5.500 Cabides para colocação de casacos de frio na entrada do pavilhão: 8 mil. Emissões de carbono equivalente: COP13 – 2007, em Bali: 100 mil toneladas (emissão anual do Chad) COP15 – 2009, em Copenhague: 41 mil toneladas (estimativa) |
De acordo com o primeiro ministro, três quartos de toda a comida preparada no Bella Centre, centro de evento onde a COP está acontecendo, em Copenhague, é orgânica. Todos podem beber água limpa de qualquer torneira, de graça. Ou em garrafas, também sem gastar um centavo. O governo da Dinamarca deu aos participantes um bilhete especial que dá direito às mais de 15 mil pessoas credenciadas a utilizar todo o sistema público de transporte de Copenhague e região metropolitana gratuitamente. Isso quer dizer: ônibus, metrô e trens.
Dezenas de eventos estão acontecendo todos os dias em paralelo às rodadas oficiais de negociações. Em meio a um frio de cerca de 5 graus Celsius (temperatura relativamente confortável para os padrões dinamarqueses nesta época do ano), milhares de pessoas aguardaram horas em longas filas para obter credenciamento. Apesar de toda a preparação e receptividade dos dinamarqueses, no último domingo pela manhã uma suspeita de bomba fechou as portas do Bella Centre e atrasou ainda mais a entrada dos visitantes, que superaram as expectativas da própria organização. De acordo com o governo dinamarquês, estão sendo gastos 230 milhões de dólares para promover a conferência, mais da metade disso em segurança.
A prefeita de Copenhague, cidade que está sendo apelidada pelos próprios moradores e organizações não-governamentais de “Hopenhague” (hope significa esperança, em inglês), anunciou que a capital dinamarquesa está conduzindo 50 iniciativas para se tornar a primeira capital “carbono neutro” do mundo já em 2025. Metade da população opta por se locomover de bicicleta, apesar do frio intenso, ela disse.
Otimismo, mas com tempo
De acordo com o plano de ação estabelecido durante a COP13, realizada em Bali, na Indonésia, em dezembro de 2007, os negociadores devem concordar até o fim da Conferência do Clima, em Copenhague, sobre uma série de itens, separados em dois grandes grupos de trabalho. Um vai discutir as metas de redução de gases de efeito estufa dos países, mecanismos flexíveis para seu cumprimento, consequências (inclusive econômicas) das propostas de diminuição de gases, legislação e criação de um fundo para medidas de adaptação às mudanças climáticas. As outras bases de Copenhague são as discussões sobre mitigação, adaptação, transferência de tecnologia, e finalmente mecanismos financeiros para viabilizar todas as medidas anteriores, capaz de travar ou destravar todas as outras áreas.
O secretário-executivo da COP15, Yvo de Bôer, fez alusão à figura de um bolo para explicar como o melhor modelo de acordo deverá ser fechado na Dinamarca. “Na base, temos que firmar um acordo para implementar ações de mitigação, como as estratégias de REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), depois, na segunda camada, temos que ter compromissos ambiciosos envolvendo financiamento dessas ações, e para cobrir o bolo, estabelecer ações de longo prazos e objetivos futuros”, disse, assegurando que se isso for feito o primeiro ministro vai querer acender as velas.
Mas o formato tende a sair ligeiramente diferente. Muitos participantes e negociadores acreditam que um acordo final com metas é improvável, conforme o ritmo das negociações travadas por técnicos e representantes de cada país durante o ano inteiro, e entre as conferências climáticas. Isso, numa perspectiva positiva, só seria fechado na COP17, a ser realizada na África do Sul daqui a dois anos. “Não se faz uma negociação com relógio na mão, essas coisas levam tempo, é preciso respeitar o ritmo e as conquistas construídas em cada etapa, caso contrário o acordo sairá enfraquecido”, disse um representante.
As discussões sobre o sentido que cada palavra toma nessas rodadas faz com que as propostas de texto para um acordo de redução de emissões virem uma sopa de colchetes (partes destacadas que ainda não são consensuais). O mais provável, segundo eles, é que algumas decisões sejam anunciadas na sexta-feira que vem, dia 18 de dezembro, com quatro documentos anexados ao final: um com números sobre quanto os países decidiram cortar de emissões, outro sobre as ações que os países em desenvolvimento estão dispostos a fazer, além de outros dois sobre como os recursos financeiros serão captados, utilizados e administrados.
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