Brasília – Aprovada em julho deste ano por uma comissão especial no Congresso Nacional, a proposta do novo Código Florestal deve ser foco de intensos debates políticos em Brasília agora que as eleições estão terminadas. Criticado por diversas entidades como um retrocesso na legislação ambiental, o projeto relatado pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) tem o apoio da bancada ruralista, que pretende ainda este ano levar o projeto para votação no plenário da Câmara.
“Nossa intenção é votar depois do segundo turno, mas para começar a valer mesmo precisa ser aprovado também pelo Plenário do Senado e passar pela sanção do presidente Lula,” afirmou o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária e presidente da comissão especial sobre o Código Florestal. Para ele, o resultado da eleição presidencial não deve interferir no projeto: “Independente de quem ganhar o relatório do deputado Aldo Rebelo será levado a Plenário para ser votado. Afinal, essa é uma exigência do setor produtivo, segmento da nossa economia responsável por 40% das exportações, 28% do PIB e mais de 30% dos empregos gerados nesse país.”
Apesar da pressão da bancada ruralista, o mais provável é que a votação do novo Código fique para a próxima legislatura. O presidente da Câmara, Michel Temer, já declarou que a votação de temas polêmicos, como a reforma do Código Florestal, deve ficar para o próximo ano. Segundo Márcio Freitas, assessor do deputado, depois das eleições os líderes dos partidos vão se reunir para definir quais projetos serão votados esse ano e quais vão ficar para o próximo, já que por um acordo de líderes, as votações no Plenário estão suspensas.
Para o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Sarney Filho (PV-MA), que votou contra o texto de Aldo Rebelo, a discussão do Código Florestal foi contaminada pelo período eleitoral, e responsabilizou a omissão dos grandes partidos como PT e PSDB pela aprovação do relatório. “Estes partidos em nenhum momento assumiram uma posição clara diante desse gravíssimo retrocesso que estava sendo articulado há meses na Câmara, e agora vamos tentar barrar a sua votação no Plenário”.
Sarney Filho acredita que com o compromisso assumido pelos dois candidatos à presidência, o novo Código será discutido com maior profundidade para impedir retrocesso na legislação ambiental, sendo assim, não deve ser votado este ano.
É certo que em ano eleitoral os políticos evitam se envolver com questões polêmicas, porém, no caso do Código Florestal, essa falta de posicionamento resultou na aprovação de um texto, no mínimo, preocupante, já que permite a legalização de desmatamentos irregulares em áreas de proteção permanente (APPs) e em reservas legais nas propriedades de até quatro módulos fiscais. Propõe também uma moratória do desmatamento por cinco anos, mas anistia quem agiu em desacordo com a lei vigente.
Esse é sem dúvida um dos pontos mais criticados no projeto. “Pelo novo Código quem desmatou áreas proibidas fica desobrigado de recuperar. Aquelas áreas já desmatadas que oferecem riscos à sociedade, como por exemplo, áreas de encostas, não seriam mais recuperadas. A anistia de multas, você pode até perdoar em função da recuperação da área degradada, mas o projeto perdoa o desmatamento e desobriga a recuperação. É inclusive um incentivo ao desrespeito à lei, porque para frente outros perdões podem vir”, destaca Raul Vale, assessor jurídico do Instituto Socioambiental (ISA).
Nilo D’Ávila, coordenador de políticas públicas do Greenpeace, lembra que no governo Lula foram implementadas as restrições de crédito para quem pratica ilícito ambiental. Porém, com a anistia, todos estariam liberados para receber financiamentos, independentemente de ter cumprido, ou não, a legislação ambiental. “Ele anistia todo mundo que desmatou até agosto de 2008. Anistia ampla e irrestrita, tanto criminalmente como civilmente. Eu acho que a conta financeira pode até anistiar, agora não dá para anistiar o passivo no chão, o desmatamento, a necessidade de recuperar a APP, a necessidade de recuperar a reserva legal,” ressalta D`Ávila.
A posição de Dilma
Vídeo feito por Nathalia Clark.
Posição semelhante assumiu a presidente eleita, Dilma Rousseff, em evento organizado por algumas lideranças do PV em apoio à sua candidatura. “Expresso meu acordo com o veto a propostas que reduzam áreas de reserva legal e preservação permanente, embora seja necessário inovar em relação à legislação em vigor. Somos totalmente favoráveis ao veto à anistia para desmatadores.”
José Serra, do PSDB, em resposta a uma consulta aos presidenciáveis, proposta por diversas entidades ambientalistas, em setembro deste ano, também havia se posicionado contra a anistia a quem desmatou ilegalmente, bem como, disse ser possível estimular a regularização das propriedades sem ter que mudar a lei atual. “Nós consideramos fundamental manter e, quando for o caso, recuperar as matas ciliares nas propriedades rurais, especialmente aquelas que protegem nascentes de água; são essas áreas de biodiversidade próximas de recursos hídricos que prestam serviços ambientais mais relevantes,” afirmou o presidenciável.
Para Nilo D`Ávila, a moratória proposta no Código é um paleativo que não resolve o problema ambiental. “Nós não precisamos de moratória, nós precisamos de política de desmatamento zero. Nós temos pelo menos 60 milhões de hectares de áreas já com abertura de florestas, de áreas já convertidas e que hoje estão com subprodução ou abandonadas. Toda área de produção de grãos do Brasil está em 32 milhões de hectares, então nós poderíamos com essa área já existente dobrar a produção. Ele ressalta, no entanto, que para aumentar a produção tem haver demanda, financiamento para aquisição de máquinas, e não apenas a terra.
Outros projetos ambientais em tramitação
Além do novo Código Florestal, outros projetos de interesse ambiental tramitam no Congresso. O IR Ecológico, que possibilita a pessoas físicas e jurídicas desconto do Imposto de Renda parte das doações destinadas a projetos voltados à conservação dos recursos naturais está pronto para ser votado, mas segundo Willy Kauffmann, assessor do relator, deputado Luiz Carreira (DEM-BA), falta boa vontade do deputado, Michel Temer – eleito vice-presidente -que teria recebido instruções do Ministério da Fazenda para segurar o projeto, já que sua aprovação implicaria em perda de receita para o Estado. Se não for votado até o final deste ano, o projeto será arquivado.
Pelo jeito, ambientalistas e deputados comprometidos com as causas ambientais vão ter bastante trabalho a partir desta segunda-feira para garantir que as decisões do Congresso Nacional impliquem em avanços (e não retrocessos) na legislação ambiental no Brasil.
*Carol Bradley é jornalista em Brasília.
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