Seu amplo sorriso é interpretado como um convite para entrar. “Estamos em um ponto privilegiado. O que vocês querem comer?”, pergunta a mulher. Seu nome é Dora Paña, que nasceu e cresceu sob a sombra da montanha, onde aprendeu a respeitar e amar as lagoas de Atillo. Hoje, em seus trinta e cinco anos, divide suas horas entre a atenção no restaurante familiar Saskines e o cuidado do gado.
Conversamos com ela por algumas horas depois de desfrutar das trutas asadas que preparou. Ela sorri a cada palavra e nos fala com orgulho deste “pedacinho de céu” longe de tudo. “Quando éramos crianças com meus irmãos era uma desgraça viver aqui, para ir até Riobamba tínhamos que madrugar para depois de oito horas em cavalo chegar até Palmira ou Guamote para pegar um carro”. Esse trajeto era recompensado com a “bondade que dá crescer no campo”, longe da delinquência e com uma “paisagem abençoada” onde brincar.
Um caso interessante que acontece na região é a morte dos cuvivíes, aves chamadas assim pelo som que fazem quando cantam. “As aves chegam em setembro para contribuir à natureza, elas entregam sua vida para assegurar uma boa colheita”, acredita Dora. Ela lembra que com sua família ia de madrugada recolher as aves que estavam mortas nas beiras da lagoa; muitos moradores levavam carrinhos de mão para transportá-las, tiravam as penas e assim se abasteciam de alimento.
Em setembro de cada ano, em homenagem às aves se realiza o Festival dos Cuvivíes, evento que reúne centenas de turistas para desfrutar de manifestações artísticas e culturais lideradas pelos indígenas da zona.
“Antes, quando a gente saia para estudar sentia que estudava no estrangeiro”, e essa sensação para Dora não tem mudado, apesar da construção da estrada Guamote – Macas que conectou os moradores de Atillo com comunidades próximas e com Riobamba. A falta de canais de comunicação, como o telefone e internet, não lhe permite se comunicar com sua pequena filha que estuda em Riobamba e com nenhum membro de sua família. Para concretizar os tours que Dora oferece em seu restaurante e agência de turismo, os interessados se comunicam com sua cunhada e ela, através do transporte público, manda a informação para Dora.
Dora está totalmente convencida que o potencial deste setor é o turismo, “devemos nos preparar para o turismo”, disse. Dora estudou turismo na faculdade e com sua família construiu uma pequena cabana para hospedar os turistas, e criou uma oferta de aventura para os visitantes, em um percurso em cavalo pelas lagoas até chegar ao ponto mais alto em Ashipungo.
Dentro de seu restaurante se observam cartazes que falam sobre a história e riqueza dos páramos, como uma forma de criar consciência nos visitantes sobre a biodiversidade do Parque Nacional Sangay, para difundir os atrativos e a importância da água.
Desde a pavimentação da via os clientes são mais frequentes, assim como o turismo, mas “o negativo é a quantidade de lixo que eles deixam, é triste ver nossas lagoas cheias de sujeira”. Dora espera que o turismo aumente, mas que seja um turismo consciente e que respeite os páramos. “Nesta comunidade somos quase 600 pessoas, o trabalho é uma prioridade e uma constante, e para a gente estas lagoas são o tesouro mais valioso que tem a comunidade”, afirma.
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