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Congresso planeja derrubar 48 dos 63 vetos feitos por Lula ao PL do Licenciamento

Análise dos vetos deve ser feita pelos parlamentares nesta quinta-feira (16). Governo tenta fechar acordo, mas derrota é quase certa

Cristiane Prizibisczki · Karina Pinheiro ·
15 de outubro de 2025

O Congresso Nacional pautou para esta quinta-feira (15) a análise dos vetos feitos por Lula ao PL do Licenciamento. Governo corre para tentar acordo e manter os pontos vetados pelo presidente, mas a derrota é dada como certa. Organizações da sociedade civil já falam em judicialização.

O anúncio da entrada do tema na pauta foi feito no dia 8 de outubro pelo presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, também presidente do Senado, e confirmado hoje (15) pelo líder do governo, senador Randolfe Rodrigues (PT-AL).

À GloboNews, Rodrigues falou que a ideia é que 15 dos 63 vetos sejam mantidos. Isto é, 48 vetos cairiam. “Se não chegarmos a um acordo, aí paciência, vamos ver o que podemos destacar de veto, vamos ao voto, à apreciação”, explicou. 

A ((o))eco, o deputado Nilto Tatto (PT-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, disse que a orientação do governo, na verdade, é pela manutenção de todos os vetos feitos pela presidência. “O que temos é que não há negociação sobre derrubar qualquer um dos vetos feitos pelo presidente Lula”, disse. 

Segundo apurou a reportagem, apesar das intensas negociações do governo, a bancada ruralista já dá como certa a derrubada maciça dos pontos cortados por Lula ao PL do Licenciamento que saiu do Congresso em julho.

Na mesma sessão conjunta para deliberação dos vetos ao PL do Licenciamento, senadores e deputados devem aprovar um calendário de deliberação sobre o projeto de lei enviado por Lula como alternativa aos vetos feitos, além da Medida Provisória 1.308/2025, que criou a Licença Ambiental Especial (LAE).

Pressão de todos os lados

A análise dos vetos ao PL do Licenciamento – batizado por organizações da sociedade civil como PL da Devastação, por seu potencial de degradação – acontece a menos de um mês da COP30 e em meio à crescente pressão de setores interessados em afrouxar o processo de licenciamento ambiental no país.

Na terça-feira (14) a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) se reuniu com representantes da chamada Coalizão das Frentes Produtivas para articular uma estratégia de derrubada dos vetos presidenciais, por considerarem que as mudanças propostas por Lula ao texto que saiu do Congresso “compromete o desenvolvimento econômico e a segurança jurídica do país”.

Para o deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), vice-presidente da FPA na Câmara, o texto costurado pelos parlamentares foi debatido por muitos anos, inclusive em articulação com o próprio governo. “Estamos atentos ao contexto que vamos enfrentar com os vetos do licenciamento. Esse tema tramitou por muitos anos no Congresso”, afirmou o parlamentar.

Este também é o argumento de parlamentares da própria base governista, que devem votar contra a decisão de Lula sobre o assunto. Este é o caso do senador Omar Aziz (PSD-AM), líder do PSD no Senado e aliado de primeira hora do governo Lula. 

“Vamos derrubar tudo, porque tudo que aprovamos aqui estava acordado com o ministro [da Casa Civil] Rui Costa e a ministra [das Relações Institucionais] Gleisi Hoffman”, disse Aziz, ao Valor.

Do Amazonas, Aziz tem interesse no asfaltamento da BR-319, rodovia que ligará Manaus e Porto Velho e vai cortar áreas ainda preservadas da floresta amazônica. 

Manifesto de setores produtivos

Também na terça-feira, entidades do setor produtivo entregaram aos parlamentares um manifesto em apoio à derrubada integral dos vetos presidenciais. No documento, intitulado “Manifesto do Setor Produtivo sobre os Vetos Presidenciais à Lei Geral do Licenciamento Ambiental”, as entidades expressam preocupação com os vetos à Lei nº 15.190/2025, alegando que o texto aprovado foi fruto de mais de duas décadas de debates técnicos e políticos e resultado de amplo consenso entre Legislativo, órgãos ambientais, especialistas, sociedade civil e setores produtivos. 

O texto defende que a lei aprovada pelo Congresso, antes dos vetos do presidente Lula, estabelecia parâmetros proporcionais entre o tipo de licença e o impacto do empreendimento, promovendo celeridade sem abrir mão do rigor técnico, além de consolidar regras já adotadas em práticas estaduais de sucesso e reforçar a gestão ambiental descentralizada. 

O documento é assinado por 89 entidades que representam os setores do agronegócio, indústria, infraestrutura e energia. Entre elas estão ABAG (Associação Brasileira do Agronegócio); Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA); Associação Brasileira do Biogás (ABIOGAS) e Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). 

Vetos do governo Lula

O presidente Lula vetou, na primeira semana de agosto, 63 trechos do projeto de lei aprovado pelo Congresso em julho de 2025, conhecido por críticos como o “PL da Devastação”. O texto original criava amplas possibilidades de procedimentos auto declaratórios, enfraquecia condicionantes ambientais e ampliava o poder de estados e municípios para decidir quais atividades passariam por licenciamento ambiental. 

Segundo o governo, os vetos foram definidos com base em quatro critérios: integridade do licenciamento ambiental, proteção a povos indígenas e comunidades quilombolas, segurança jurídica e agilidade nos processos. 

Entre os principais pontos vetados estão a ampliação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio potencial poluidor, dispositivos que transferiam ampla competência de licenciamento a estados e municípios sem padronização, trechos que revogavam regras de preservação da Mata Atlântica, limitações à consulta a povos indígenas e quilombolas, dispensa de análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR), restrições à aplicação de condicionantes ambientais apenas a impactos diretos, o caráter não vinculante das manifestações de órgãos gestores de Unidades de Conservação, a regra monofásica do Licenciamento Ambiental Especial (LAE) e trechos que enfraqueciam a exigência de licenciamento por instituições financeiras antes da concessão de crédito. Para conciliar divergências e tentar garantir apoio do Congresso, o governo publicou ainda uma Medida Provisória e um Projeto de Lei alternativo, que segue agora para apreciação em regime de urgência constitucional. A análise dos vetos está prevista para ocorrer nesta quinta-feira (16), em sessão conjunta do Congresso Nacional.

  • Cristiane Prizibisczki

    Jornalista com quase 20 anos de experiência na cobertura de temas como conservação, biodiversidade, política ambiental e mudanças climáticas. Já escreveu para UOL, Editora Abril, Editora Globo e Ecosystem Marketplace e desde 2006 colabora com ((o))eco. Adora ser a voz dos bichos e das plantas.

  • Karina Pinheiro

    Jornalista formada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), possui interesse na área científica e ambiental, com experiência na área há mais de 2 anos.

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