No dia 20 de março, o governador do estado de Rondônia, Confúcio Moura, assinou os decretos de criação de 11 unidades de conservação estaduais, que, juntas, somam mais de 500 mil hectares. A notícia foi comemorada entre ambientalistas, mas a satisfação durou pouco. Exatamente uma semana depois da publicação dos decretos, no dia 27, os deputados estaduais se reuniram na Assembleia Legislativa e votaram, por unanimidade, a cassação dos mesmos.
A história ainda promete muitos capítulos, o próximo deles esperado para o início da semana que vem, quando o governador entrará com uma liminar que suspende a decisão da Assembleia. Segundo Denison Trindade, coordenador de Unidades de Conservação da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Ambiental, os motivos levantados pelos parlamentares para sustar os decretos “são infundados”.
Os decretos publicados no Diário Oficial criavam dois parques estaduais, duas estações ecológicas, uma área de proteção ambiental, uma floresta estadual, uma reserva de fauna e quatro reservas do desenvolvimento sustentável.
Parlamentares anulam decretos
Alegando ausência de consultas prévias, obrigatórias para a criação de unidades de conservação, e denunciando o governo por desconsiderar a presença dos moradores nas novas áreas protegidas, os parlamentares aprovaram, por unanimidade, um decreto legislativo cassando o ato do governador.
Em declaração feita para o site da Assembleia Legislativa de Rondônia, o presidente da Assembleia, Maurão de Carvalho (MDB), criticou a criação das UCs: “Foi um ato impensado, sem o devido cuidado com as famílias que moram nessas áreas, algumas há décadas, por gerações. (…) Com os decretos em vigor, quem iria indenizar essas famílias?”.
De acordo com Trindade, a justificativa não é válida. “Nós fizemos todos os estudos e as consultas públicas necessárias. Inclusive, para nos resguardar da pressão contrária que sabíamos que viria, as consultas foram todas gravadas e as gravações estão inseridas no processo de criação de cada uma das UCs”, explica. Sobre os moradores, o coordenador esclarece que os proprietários legítimos foram reconhecidos, mas que há moradias irregulares e invasões que não possuem direito de posse, tampouco de indenização. “As comunidades que foram detectadas pelos estudos são povoados tradicionais, por isso que em alguns casos foi orientada a criação de reservas do desenvolvimento sustentável (RDS)”, categorias que permitem sua permanência e uso dos recursos de forma manejada. “Nós fizemos as audiências junto com as pessoas que seriam afetadas, no caso as comunidades tradicionais de cada unidade”, diz o coordenador.
“Na Estação Ecológica Soldados da Borracha e na Floresta Estadual Rio Pardo há presença de invasores, pessoas que não são legítimas proprietárias da terra nem comunidades tradicionais. E o intuito da criação das UCs é exatamente uma tentativa de resguardar a floresta que ainda está de pé”, ressalta Trindade.
Outra crítica do presidente da Assembleia em sua reprovação às áreas protegidas foi o atraso na apresentação do novo Zoneamento Socioeconômico Ecológico, aguardado por eles. O zoneamento é definido por lei e consiste em um instrumento de planejamento com o objetivo de otimizar e regular o uso do espaço assim como orientar políticas públicas. Existem seis tipos de uso pré-definidos: intensificação da exploração agropecuária; pequenos produtores; exploração ribeirinha agroflorestal e pesqueira; extrativista; manejo florestal; e conservação e preservação. Esta última destinada a “garantir a manutenção dos ecossistemas e o equilíbrio ecológico”, conforme descreve a lei do zoneamento.
Trindade reforça que todas as 11 unidades de conservação criadas estão em zonas previamente destinadas à preservação e que o zoneamento está apenas sendo atualizado, o que não irá alterar o objetivo dessas áreas. “O que os deputados defendem é que nessa atualização eles vão poder legitimar os invasores de terras, pessoas que estão em zonas que não poderiam estar, que são exclusivamente indicadas para unidades de conservação ou mesmo em unidades de conservação já criadas que estão invadidas”. Trindade assinala ainda que o zoneamento já foi apresentado pela Kampatec, a empresa responsável, e está passando pelas últimas alterações antes de ser apresentado à Assembleia Legislativa, o que deve ocorrer até o dia 15 de abril.
*A reportagem de ((o)) eco tentou entrar em contato com o gabinete do deputado Maurão de Carvalho, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria.
Em nota publicada na noite desta quarta-feira, organizações ambientalistas repudiam a ação da Assembleia e afirmam que a decisão do legislativo foi arbitrária e inconstitucional. “A desafetação de unidades de conservação depende de lei – e não de decreto legislativo –, elaborada por meio de processo aberto para a participação da sociedade civil e das entidades interessadas e precedida por estudos técnicos que a justifiquem. Nada disso foi observado pelos deputados estaduais de Rondônia”, afirmam.
PEC proíbe governo de criar UCs por decreto
Com os rumores de que o governador iria criar áreas protegidas, os parlamentares correram para aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do estado que passa a obrigar o governo a criar novas áreas protegidas através de lei complementar enviada à Assembleia, e não por decreto, que só depende da assinatura do chefe do poder executivo. A criação de unidades de conservação passou a depender do crivo dos parlamentares.
Apresentada em dezembro pelo deputado Alex Redano (PRB), a PEC foi aprovada no mesmo dia em que as UCs foram decretadas: dia 20 de março. Governadores não têm poder de vetar uma PEC, que é sancionada pelo presidente da Assembleia Legislativa.
Segundo as ONGs, os parlamentares cassaram a competência do poder executivo estadual de instituir áreas protegidas. “Tal fato viola o pacto federativo ao criar uma norma menos protetiva do que a norma que consta do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)”, afirmam.
As novas – ou não – unidades de conservação
Confira aqui a lista das 11 unidades de conservação criadas inicialmente pelo governo estadual de Rondônia que cobrem cerca de 530 mil hectares do território do estado. Todas em zona de domínio da Amazônia, bioma predominante no estado, com exceção da Estação Ecológica Umirizal, que também protege um raro remanescente de vegetação de Cerrado conhecido como umiri.
Área de Proteção Ambiental do Rio Pardo, no município de Porto Velho, com 113.850 hectares.
Floresta Estadual do Rio Pardo, no município de Porto Velho, com 30.815 hectares
Estação Ecológica Umirizal, no município de Porto Velho, com 59.897 hectares
Reserva de Fauna Pau D’Óleo, no município de São Francisco do Guaporé, com 10.463 hectares
Parque Estadual Abaitará, no município de Pimenta Bueno, com 152 hectares
Parque Estadual Ilha das Flores, no município de Alta Floresta D’Oeste, com 89.617 hectares
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Rio Machado, no município de Porto Velho, com 9.205 hectares
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Limoeiro, no município de São Francisco do Guaporé, com 18.837 hectares
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Serra Grande, no município de Costa Marques, com 23.180 hectares
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Bom Jardim, no município de Porto Velho, com 1.678 hectares
Estação Ecológica Soldado da Borracha, nos municípios de Porto Velho e Cujubim, com 178.948 mil hectares
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http://www.wikiparques.org/estado-de-rondonia-cria-11-unidades-de-conservacao/
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