A prefeitura de Santos aprovou em junho passado o estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) do projeto de uma incineradora de lixo, sem questionar a ausência de menções no documento a um futuro reservatório que armazenará 2,3 bilhões de litros de água do rio Jurabatuba, principal manancial de Guarujá. Situado na Cava da Pedreira, na área continental de Santos, a menos de 2km do local escolhido para usina de lixo, o reservatório é um projeto da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp) para solucionar a recorrente falta d’água em Guarujá.
Centenas de toneladas de resíduos, parte deles perigosos, e gases poluentes serão emitidos diariamente pela usina, que será implantada no aterro sanitário do Sítio das Neves, na vizinhança do futuro reservatório da Sabesp. Os efluentes líquidos não serão despejados nos rios próximos da usina, de acordo com o EIV e o estudo e relatório de impacto ambiental (EIA/Rima) da Unidade de Recuperação de Energia (URE) Valoriza Santos.
Mas os estudos do empreendedor admitem a possibilidade de ocorrer vazamentos de chorume e óleo diesel, que podem alterar a qualidade das águas subterrâneas, e de contaminação do córrego Santa Cruz, afluente do Jurubatuba. Bacias de contenção de resíduos e efluentes e um plano de monitoramento das águas subterrâneas e superficiais estão previstos no EIV e no EIA/Rima do projeto.
Apesar de a Secretaria Municipal de Comunicação (Secom) ter negado à reportagem que a prefeitura conhecesse o projeto da Sabesp, o prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB) parece estar tão ciente do assunto que assinou o Decreto nº 8.176 em 27 de julho de 2018, declarando a Cava da Pedreira de utilidade pública para fins de desapropriação. O decreto justifica a medida como necessária à implantação do reservatório da Sabesp, projeto que tem sido noticiado pela imprensa local há anos.
A Sabesp preferiu não opinar sobre a omissão de seu futuro reservatório no EIV e EIA/Rima da incineradora de lixo da Valoriza Energia SPE. Por meio de sua assessoria de imprensa, declarou que “questões relacionadas ao projeto da usina de incineração de resíduos sólidos devem ser comentadas e esclarecidas por seus responsáveis e por órgãos ambientais para que se cumpra a legislação vigente”.
No capítulo das conclusões, o EIV até menciona a existência de pedreiras na área de influência da URE, mas não cita o futuro reservatório da Sabesp: “As duas pedreiras existentes a leste e sul do empreendimento não apresentam nenhum tipo de interface nem interferência com a futura URE. Dois sítios identificados a leste não estarão sujeitos a nenhum impacto direto do empreendimento estando, devido a sua posição, sujeitos à emissão de ruído da rodovia e da pedreira”.
A Secretaria de Meio Ambiente de Guarujá (Semam) informou que seus técnicos e o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) estão analisando o EIV e o estudo e relatório de impacto ambiental (EIA/Rima) da URE Valoriza Santos para saber se a população da cidade poderá ser impactada pelo empreendimento. Segundo a Semam, a secretaria executiva do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) ainda não respondeu o ofício enviado no início de setembro pelo Comdema solicitando a realização de audiência pública no município sobre o EIA/Rima do projeto. Até o momento, a única audiência pública sobre o EIA/Rima da URE foi promovida pelo Consema por meio digital no último dia 1º de outubro.
A Valoriza Energia SPE, responsável pelo projeto, também foi procurada, mas não quis se pronunciar sobre o assunto, nem respondeu aos demais questionamentos feitos sobre o projeto. Limitou-se a enviar uma breve nota de apresentação do projeto.
Investimento orçado em R$ 300 milhões, a usina terá capacidade para processar diariamente 2.000 toneladas de lixo, provenientes de sete das nove cidades da Baixada Santista, inclusive Santos, onde fica o maior porto do hemisfério sul. Trata-se do lixo que hoje é levado dessas mesmas cidades para o aterro sanitário Sítio das Neves. Na sua capacidade máxima, a usina vai gerar 50 megawatts (MW) de energia elétrica, suficientes para abastecer uma cidade de 250 mil habitantes.
A Valoriza Energia SPE possui 90% de seu capital sob controle da Terrestre Ambiental, sendo os 10% restantes da Ribeirão Energia. Assim como a Terracom, que detém há décadas os contratos de limpeza urbana da maioria dos municípios da região, a Terrestre faz parte do Grupo Diniz, que a criou para gerenciar o aterro sanitário do Sítio das Neves, inaugurado em 2003.
“A população de Guarujá e de toda a área central da Baixada Santista precisa saber os riscos que correrão em termos de contaminação da água, caso a usina de incineração seja implantada”, assinala José Marques Carriço, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Santos (Unisantos) e especialista em planejamento urbano e regional.
Para Carriço, o EIV e o EIA/Rima deveriam incluir uma avaliação sobre o impacto das emissões de gases e material particulado pela usina na qualidade da água do reservatório e no próprio rio Jurubatuba, principal manancial de abastecimento de Guarujá e de Ilha Diana e Monte Cabrão, comunidades da área continental de Santos. É importante saber também, diz ele, se as emissões da incineradora implicarão custos mais elevados do tratamento da água e danos à saúde de quem consumi-la. “E como o sistema central de abastecimento da Baixada Santista é interligado, é preciso saber se outros municípios da área central da região estarão suscetíveis à contaminação”.
Nesta primeira reportagem de uma investigação sobre o projeto da URE Valoriza Santos, ((o))eco revela que a gestão do prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB-SP), violou a lei para apressar a aprovação do EIV da usina de lixo e conduz o assunto com pouca transparência. O empreendimento faz parte de uma forte investida das empresas do setor de resíduos sólidos sobre atuais e futuros prefeitos para que facilitem a implantação de incineradoras de lixo do modelo URE em todo o Brasil.
Nesse lobby, o setor conta com a ajuda do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, mentor de um pacote regulatório pró-UREs, composto de uma portaria, um decreto e do Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), cuja consulta pública foi estendida até 16 de novembro.
Em abril de 2019, o governo editou a Portaria Interministerial nº 274, com a finalidade de proporcionar segurança jurídica a projetos de recuperação energética de resíduos (incineração). O texto conta com as assinaturas de Salles e dos ministros de Minas e Energia e do Desenvolvimento Regional. Para atrair o interesse da iniciativa privada a esses projetos, o governo publicou em novembro o Decreto nº 10.117, assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, Salles e o então ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. O decreto incluiu os projetos de queima de lixo para geração de energia no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal.
O pacote pró-UREs ficará ainda mais robusto se o texto final do Planares mantiver a tônica favorável ao tratamento térmico do lixo para geração elétrica, como consta na versão para consulta pública. Ambientalistas consideram a ênfase do Planares à incineração de lixo como afronta à hierarquia de prioridades estabelecida no artigo 9º da Lei 12.305/2010 para a gestão dos resíduos sólidos – não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento de resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada aos rejeitos.
Outras omissões graves
Em seu parecer técnico sobre o EIV, a Comissão Municipal de Análise de Impacto de Vizinhança (Comaiv) faz duas críticas graves ao estudo da Valoriza Energia SPE. A primeira é que o EIV compara apenas quatro tecnologias de tratamento térmico para definir a mais vantajosa, a de mass burning (queima de massa). Muito menos que as 12 alternativas tecnológicas para o processamento e tratamento do lixo apresentadas no Plano Regional de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos da Baixada Santista (PRGIRS/BS), publicado em abril de 2018.
“Logo, a Comissão entende que essa opção transfere todo o impacto desse ativo ambiental das cidades vizinhas para uma só cidade e por isso recomenda fortemente medidas de compensação por essa transferência”, observa o parecer. O EIV não cita o PRGIRS/BS ao analisar as tecnologias de tratamento térmico.
O segundo questionamento é a localização da URE. Com breves justificativas, a empresa descarta as quatro opções recomendadas pelo PRGIRS/BS – um local em Guarujá, outro em Cubatão e dois em São Vicente. A Comaiv diz concordar com as justificativas do estudo para desconsiderar os locais apontados pelo EIV em Cubatão e Guarujá, por conta das condições ambientais desfavoráveis no primeiro e alto impacto do trânsito de caminhões pesados no segundo. Mas discorda dos motivos indicados para o estudo descartar os dois locais recomendados pelo PRGIRS/BS em São Vicente.
“A Comissão não concorda com a justificativa da distância em relação ao principal polo gerador na terceira e quarta opção, pois são mais próximas em relação à opção escolhida e o atual modelo. Mais uma vez, a escolha transfere ao município de Santos o ônus dos impactos das cidades vizinhas, evidentemente uma escolha do empreendedor, no que a Comissão reforça e recomenda medidas compensatórias pelo impacto importado.”
Chama atenção que a Comaiv tenha aprovado o EIV da URE Valoriza Santos sem antes ter pedido ao empreendedor que justificasse sua escolha de mass burning a partir da comparação das 12 combinações tecnológicas avaliadas pelo PRGIRS/BS. Algumas só combinam opções biológicas e mecânicas e outra incluem alternativas de tratamento térmico.
A comissão da prefeitura santista discorda de um aspecto essencial na avaliação de um projeto de R$ 300 milhões, o da escolha do local da URE, mas preferiu reforçar a recomendação de medidas compensatórias pelo impacto importado das cidades vizinhas. Normalmente, uma comissão de análise do EIV solicitaria uma revisão do estudo para que o empreendedor corrigisse erros e incluísse análises ausentes da versão inicialmente entregue.
Elaborado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) por encomenda da Agência Metropolitana da Baixada Santista (Agem), o PRGIRS/BS foi aprovado por consenso no início de abril de 2018 no Conselho de Desenvolvimento da Baixada Santista (Condesb). Os nove prefeitos que integram o Condesb assinaram na ocasião um protocolo de intenções para a implementação do plano.
Judicialização
O projeto do Grupo Diniz/Terracom foi judicializado, antes mesmo da conclusão da análise de seu EIA/Rima pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). Para a prefeitura conceder o alvará de funcionamento do empreendimento, a Valoriza Energia SPE precisará obter uma série de autorizações e licenças. Entre elas, a aprovação do EIV na prefeitura e do EIA/Rima no Consema, condição para que a Cetesb emita uma sequência de três licenças ambientais – prévia, de instalação e de operação.
Em menos de três meses, o juiz Leonardo Grecco, da 1ª Vara da Fazenda Pública, em Santos, atendeu a dois pedidos de tutela de urgência (decisão liminar) inseridos em Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelos promotores Adriano Andrade de Souza e Almachia Zarg Acerb em 7 de julho deste ano. Um mês depois, os promotores protocolaram um complemento à ACP.
No dia 8 de julho, Grecco suspendeu a decisão da Comaiv favorável ao EIV e termo firmado entre a prefeitura e a Valoriza Energia SPE para o cumprimento das medidas mitigadoras e compensatórias aos impactos de vizinhança do empreendimento.
Na sentença, o juiz também determinou a imediata paralisação das obras do Novo Quebra-Mar, um projeto de revitalização do parque Roberto Mário Santini, situado no Emissário Submarino, na praia do José Menino. A execução do projeto, que consumiria um investimento de R$ 15 milhões da Terracom, foi a medida estabelecida pela Comaiv para a Valoriza Energia SPE compensar os impactos de vizinhança, sobretudo o aumento de 5% no tráfego da rodovia Cônego Domênico Rangoni previsto no EIV.
Em decisão proferida em 2 de outubro, o juiz concedeu 30 dias para a empresa restituir ao parque o estado anterior ao do início das obras. Contudo, a decisão foi anulada em 8 de outubro pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que acolheu parcialmente recurso da prefeitura. O desembargador Percival Nogueira, responsável pela decisão, negou pedido da prefeitura para que as obras do Novo Quebra-Mar fossem retomadas, argumentando que se deve aguardar o julgamento do mérito da ACP na primeira instância.
Na ACP, os promotores justificam o pedido de revogação definitiva da decisão da Comaiv favorável ao EIV basicamente com dois argumentos: a não realização de audiência pública antes do deferimento do estudo e a desconexão entre a obra do Novo Quebra-Mar e a usina de lixo. Ambos indicam que a prefeitura violou a Lei Complementar nº 793/2013, que regulamenta os procedimentos para a análise e aprovação do EIV em Santos.
Para justificar a não realização de audiência pública, a Comaiv alegou risco sanitário em virtude da pandemia de Covid-19, embora muitos órgãos públicos estejam promovendo reuniões por meio digital. É o caso do Consema, que promoveu a audiência pública do EIA/Rima do empreendimento em 1º de outubro por meio virtual.
Participação social
“Controle social não é algo menor num projeto como esse. É a base para que a sociedade tenha garantias mínimas de que o empreendimento atende ao interesse público. Projetos no setor de resíduos sólidos costumam ser judicializados quando a participação da sociedade é limitada”, assinala o professor Elcires Pimenta, coordenador técnico do MBA em Saneamento Ambiental na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESP).
Pimenta lembra que o controle social é um princípio comum a três legislações que incidem sobre a gestão dos resíduos sólidos: o Estatuto da Cidade (Lei 12.257/2001), as diretrizes para a política de saneamento básico (Lei 11.445/2007) e a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010).
Para tentar convencer o juiz a liberar a retomada da obra no parque, projeto de grande interesse do prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), que trabalha para eleger seu sucessor nas eleições municipais em novembro, a Comaiv realizou a audiência pública sobre o EIV por meio virtual em 31 de julho. Porém, a tentativa de corrigir a irregularidade não convenceu Grecco. Na sua sentença, o juiz afirma que “não se pode encarar uma audiência pública como mero meio para justificar um fim. É ato democrático para se ouvir a população em seus anseios e não meramente escutá-la para fazer constar no processo administrativo”.
O próprio Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Comdema) nunca foi ouvido a respeito do projeto da URE e do EIV do empreendimento. Na audiência pública do EIA/Rima no Consema, o secretário municipal do Meio Ambiente, Marcio Gonçalves Paulo, convidou a empresa a apresentar o projeto ao Comdema. “Por ser uma instância com atuação da sociedade civil, governo, universidades, o Comdema deve ser o caminho de passagem para qualquer empreendimento que envolva impactos ambientais”, lembra Renato Prado, coordenador de projetos do Fórum da Cidadania de Santos e membro do Comdema.
Prefeitura defende medida compensatória
((o))eco enviou à prefeitura santista um conjunto de questões sobre diferentes aspectos relacionados ao projeto da URE Valoriza Santos. Nesta reportagem, publicaremos trechos da nota remetida pela Secretaria Municipal de Comunicação (Secom) com respostas à parte das perguntas de ((o))eco. Confira aqui o texto completo da nota.
A nota da Secom começa com a afirmação de que “o empreendimento em questão é um projeto privado, elaborado por um consórcio de empresas privadas, denominado URE Valoriza Santos, com o objetivo de ser implementado em área privada (o Sítio das Neves não pertence ao Município)”.
Sobre o projeto Novo Quebra-Mar, a nota declara que ele “não envolve recursos financeiros e nem repasses de dinheiro aos cofres públicos. O termo de responsabilidade assinado pela empresa (…) especifica que o empreendedor não terá ressarcimento do valor investido nas obras, ainda que o empreendimento pretendido não tenha seu funcionamento autorizado pelos órgãos públicos.”
Quanto ao local da medida compensatória, a prefeitura diz que o artigo 8º, parágrafo 1º, da Lei Complementar nº 793/2013 dispõe que as medidas mitigadoras e compensatórias deverão ser executadas preferencialmente na área de influência do empreendimento “e não obrigatoriamente”. Outras medidas mitigatórias poderão ser acrescentadas com base nas manifestações ocorridas na audiência pública virtual, realizada em 31 de julho.
De qualquer forma, a prefeitura informa que cumpre a decisão liminar do juiz Leonardo Grecco, que suspendeu as obras do Novo Quebra-Mar, mas que a Procuradoria Geral do Município está adotando as medidas cabíveis para revertê-la.
A reportagem perguntou à prefeitura por que a Comaiv não estipulou uma compensação do impacto de vizinhança associada a problemas da gestão dos resíduos sólidos em Santos. Na opinião do professor Carriço, a compensação mais importante seria a realocação para habitações adequadas dos cerca de 5.000 moradores da favela da Vila dos Criadores, na área do lixão da Alemoa, na zona portuária da cidade. “É uma comunidade que vive os impactos do lixão que, embora desativado em 2003, ainda traz alto risco sanitário à vida das famílias do assentamento”, observa o professor da UniSantos. O antigo lixão da Alemoa tornou-se um dos maiores passivos ambientais do estado de São Paulo.
Em uma das questões enviadas à Secom, a reportagem citou decisão proferida em 25 de agosto passado pelo juiz Leonardo Grecco que concedeu 90 dias de prazo para a prefeitura cumprir decisão judicial de 2011, que a obriga a reassentar os moradores da Vila dos Criadores em um projeto habitacional. A decisão refere-se à Ação de Cumprimento de Sentença ajuizada pelo Ministério Público. A prefeitura respondeu que “a referida ação judicial não tem relação alguma com a implantação da URE e o EIV aprovado pela Comaiv. O Município foi notificado da decisão judicial e adotará as medidas cabíveis visando a sua reversão”.
No parecer favorável ao EIV da URE, a Comaiv atribui a dispensa da audiência pública presencial, previamente à aprovação do estudo, à situação específica de saúde pública enfrentada por todo o país com a Covid-19. Também descarta a audiência virtual alegando dificuldades técnicas para sua realização e prejuízo à “efetiva participação dos diversos segmentos da sociedade civil (…), principalmente para aqueles moradores da vizinhança do local onde se pretende instalar o empreendimento (…) e também parte da população que não tem acesso à internet”.
No entanto, a nota da prefeitura parece não dialogar com a justificativa incluída no parecer da Comaiv para a não realização da audiência pública. A avaliação pessimista sobre a qualidade da participação em uma audiência virtual presente no parecer da Comaiv dá lugar na nota da Secom a uma percepção otimista do formato digital.
“Como em todas as audiências públicas, os participantes inscritos puderam contribuir com sugestões ao projeto”, diz a nota sobre a audiência virtual realizada em 31 de julho na tentativa de reverter a decisão judicial que suspendeu as obras do Novo Quebra-Mar. A nota não comentou críticas do professor Carriço ao formato engessado da audiência virtual, que só permitiu falas de quem se inscrevera até 12h de 31 de julho, o que o levou a suspeitar de que o evento fora um “jogo de cartas marcadas”.
As contribuições escritas também só foram aceitas se enviadas até 12h do dia da audiência, antes, portanto, de os participantes ouvirem as falas dos representantes da prefeitura e da empresa. Alguns documentos escritos, como a ata da audiência, foram disponibilizados no formato JPG, contrariando a política de dados abertos que a prefeitura santista declara seguir. O JPG torna extremamente difícil o trabalho de jornalistas, pesquisadores, órgãos de controle e ativistas de movimentos sociais, impedindo o uso de mecanismos de busca e a cópia de trechos para inserção em documentos.
A ata não relata as falas dos representantes da empresa nem dos participantes inscritos para fazer uso da palavra ao vivo. Como o vídeo da audiência também não foi disponibilizado, o público só pôde tomar conhecimento das contribuições escritas, estas sim, presentes na ata. O link com a ata, as apresentações da Valoriza Energia SPE, o EIV e os estudos de tráfego e risco também demanda tempo e paciência para ser encontrado. Ele é citado uma vez na ata. Se o cidadão não entrar na ata, é tarefa quase impossível encontrá-lo.
Mais de dois meses se passaram após a realização da audiência e a Comaiv ainda não publicou um documento de retorno a respeito aos comentários, dúvidas e questões apresentados oralmente na audiência ou enviados por escrito. Definitivamente, transparência não é o ponto forte do Portal da Transparência da prefeitura de Santos.
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Tudo errado, sempre tudo errado.
Vai procurar uma outra região, que seja totalmente apropriada para esse fim