Em ano de eleição as denúncias de corrupção e as alianças partidárias escandalosas ocupam grande parte do noticiário político. Sobra pouco espaço para discutir as ideias. Neste artigo dou espaço para as ideias, descrevendo e avaliando os programas de governo dos três principais candidatos à presidência, protocolados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Em geral, os candidatos dizem que estes programas ainda serão detalhados, mas é o que temos por enquanto. No final do artigo, há uma tabela resumindo as propostas por tema.
Avaliei os programas considerando os seguintes critérios: a relevância dos temas, o estabelecimento de metas para cada tema e as soluções e instrumentos propostos para atingir as metas.
Eduardo/Marina
“assume o compromisso de desmatamento líquido zero, embora não tenha especificado uma data.”
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O programa do Eduardo/Marina é o mais avançado por apresentar algumas metas e especificar alguns dos instrumentos. Por exemplo, assume o compromisso de desmatamento líquido zero, embora não tenha especificado uma data. Eles indicam o uso de instrumentos econômicos para estimular a conservação, como a compensação financeira para comunidades tradicionais e agricultores familiares por serviços de preservação ambiental e pagamento por serviços ambientais. Eles também prometem usar outros instrumentos econômicos como critério ambiental para financiamento e incentivos fiscais. E mencionam criar metas de eficiência energética e diversificar as fontes de energia renováveis. Eles são os únicos a prometer implantar uma estratégia para a proteção dos oceanos.
Aécio Neves
“promete usar instrumentos econômicos para atingir objetivos ambientais, incluindo as licitações sustentáveis”
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O programa do Aécio é o segundo mais avançado, incluindo a meta para acesso universal a água potável e também ampliar as energias renováveis e programas de eficiência energética. Sobre energia, eu destacaria a promessa de criar mecanismos para utilizar gás dos aterros. Ele também promete usar instrumentos econômicos para atingir objetivos ambientais, incluindo as licitações sustentáveis, o que poderia ser transformador já que o governo é um grande comprador de produtos e serviços. Destacaria também a promessa de campanhas contra desperdício de água e o apoio a agricultura de baixo carbono.
Aécio foi o único a propor produzir um mapa de vulnerabilidades sociais as mudanças climáticas e uma política de redução de risco dos desastres, indicando que tem aprendido com os aumentos deste problemas nos últimos anos.
Eduardo e Aécio prometem implantar as Unidades de Conservação (UCs), o que é extremamente positivo. As UCs são uma ótima oportunidade para combinar geração de renda e empregos com conservação por meio do turismo e uso de produtos florestais. Um relatório recente do TCU mostrou que apenas 4% das UCs tem algo grau de gestão e implantação no país. O fato do programa de Dilma não tratar deste assunto é consistente com o diagnóstico do TCU.
Dilma Rousseff
“é interessante que eles prometam acelerar a implantação do CAR”
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O programa da Dilma é opaco, pois muitos dos itens ambientais supostamente estariam no item Manutenção do compromisso com a redução de emissões – continuidade do combate ao desmatamento, em especial na Amazônia, aceleração da implementação dos planos setoriais do Plano Nacional de Mudanças Climáticas. Ou seja, para saber o plano seria necessário ler estes planos setoriais. Em vez disso, eles deveriam pelo menos destacar os principais pontos destes planos. Dos itens listados na proposta, é interessante que eles prometam acelerar a implantação do CAR, especificamente apoiando todos os proprietários rurais para que tenham sua situação regularizada.
Resultados
No caso da Dilma, independentemente dos planos, ela pode ser julgada pelas práticas recentes cujo desempenho é ruim, em geral, incluindo os seguintes pontos:
- deixou o Congresso enfraquecer o Código Florestal, que anistiou o desmatamento de cerca de 29 milhões de hectares. Vale lembrar que os outros dois presidentes anteriores a ela sempre bloquearam as tentativas do Congresso de fazer isso.
- reduziu áreas protegidas para facilitar o licenciamento de hidrelétricas sem das devidas compensações.
- As mudanças no código e a redução de UCs facilitaram o aumento do desmatamento em 28% em 2013 em relação a 2012.
- Reduziu impostos da gasolina que por sua vez reduziu a atratividade do etanol – que emite menos gases do efeito estufa.
- Reduziu o IPI de automóveis, o que aumentou os engarrafamentos e poluição nas cidades. De quebra, o caos urbano foi um dos estopins dos protestos.
- A gestão socioambiental das grandes obras na Amazônia tem sido sofrível sem que as empresas sejam responsabilizadas.
Finalizarei destacando e comentando aspectos presentes e ausentes em todos planos. É notável que todos tratem de:
- Reduzir desmatamento, indicando que o tema continuará na pauta.
- Segurança hídrica/acesso a água. As crises recentes em abastecimento urbano e de geração de energia ampliaram o interesse para além das secas do nordeste. Só Eduardo faz a conexão com restauração e proteção de mananciais, incluindo revitalização da bacia do São Francisco.
- Simplificar/modernizar licenciamento. A ineficiência do licenciamento tem afetado/atrasado investimentos, ao mesmo tempo que não garante proteção. O modelo atual está esgotado. Porém, senti falta de indicativos do que pretendem fazer. Por exemplo, um dos problemas do atual sistema para o caso de grandes obras é o conflito de interesse. O próprio empreendedor contrata uma consultoria para estimar os impactos e propor a mitigação. Eu já acompanhei isso de perto e fica claro que as consultorias ficam constrangidas ou cooptadas a frequentemente subestimar os impactos de acordo com o interesse de empreendedor que paga a consultoria. Depois, se for sério, o órgão ambiental vai entrar em uma quebra de braço para solicitar novos estudos, revisões, etc. O Ministério Público também questiona. No final, a licença sai com inúmeras condicionantes. Em alguns casos, o governo intervém e troca o diretor do órgão ambiental para a licença sair. Uma forma de mudar seria o governo criar um fundo com as taxas de licenciamento e contratar consultores independentes (como centros de pesquisa e universidades) para fazer as análises.
Precisamos de inovações
É surpreendente que as palavras inovação e pesquisa não apareçam nas propostas, pois a resolução de problemas ambientais, especialmente os climáticos, dependerão muito de novas soluções. O programa ambiental deveria ser fortemente integrado com ensino, ciência e tecnologia. Por exemplo, o governo poderia lançar editais de prêmios para estimular inovação, os quais seriam abertos para concorrência internacional para acelerar e ampliar as inovações. Recentemente, a cidade de Nova York usou esta abordagem para atrair centros de tecnologia cujo vencedor foi um consórcio de uma universidade americana e uma israelense.
Taxa sobre carbono
Eu esperaria que o próximo presidente propusesse a criação de um imposto sobre as emissões de carbono, pois é a forma mais eficaz de reduzi-las. Isso poderia ser feito de forma gradual para evitar impactos socioeconômicos indesejáveis e o valor arrecadado poderia ser usado para reduzir outros impostos (veja este argumento nos EUA).
Os candidatos prometem maior ativismo nas negociações climáticas via COP. Entretanto, os avanços nas negociações com todos países é mais improvável. Seria melhor fazer alguns acordos com o G-20, que representa a maioria das emissões.
Cooperação com estados e municípios
Dilma promete coordenação com estados e municípios, mas sem detalhes. Uma novidade seria o governo federal aumentar o repasse dos Fundos de Participação para Estados e Municípios com base em critérios ambientais. Isso seria especialmente relevantes para a Amazônia onde estão concentradas as Unidades de Conservação e Terras Indígenas e onde os percentuais de Reserva Legal são maiores. Aqueles municípios com maior percentual de floresta receberiam um percentual maior do aumento.
Veja um síntese desta análise abaixo:
Tema |
Eduardo/Marina |
Dilma/Temer | Aécio/Aloysio |
Infraestrutura e carbono |
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Mudanças climáticas |
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Energia |
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Biodiversidade e recursos naturais |
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Licenciamento ambiental |
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Economia |
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Floresta e biodiversidade |
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Gestão rural |
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Unidades de Conservação |
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Água |
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Oceanos |
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Educação |
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