Em 2016, a Trilha Transcarioca entrou na minha vida e me trouxe um outro olhar sobre as unidades de conservação e a relação do homem com a natureza. Eu havia começado a guiar, gratuitamente, grupos pelo Parque Estadual da Pedra Branca, por travessias e trilhas pouco conhecidas da maioria. Meu conhecimento sobre a conservação da natureza era muito pequeno nesta época e cometíamos várias “gafes” ambientais. A Trilha Transcarioca foi um divisor de águas nesse quesito, em especial depois que me tornei adotante do trecho 3 (Grota Funda x Morgado), dentro do parque estadual. A experiência me fez ter mais conhecimento sobre as normas e regras do parque, me aproximou da gestão e dos guarda-parques e me fez entender melhor a logística de cuidados para a preservação ambiental, além de técnicas para manejar o traçado de uma trilha e trabalhar com a fauna e a flora.
Ainda em 2016, conheci a Val Cavalcante, que realizava um projeto lindo de reflorestamento em Realengo (bairro da Zona Oeste), dentro da zona de amortecimento do Parque Estadual da Pedra Branca (PEPB). Fui voluntário neste trabalho, junto com o amigo Alan Gerarde, levando dezenas de pessoas para ajudá-la. Isso despertou em mim e no Alan, que era adotante do trecho contíguo ao meu, o 2 (Grumari x Grota Funda), um desejo de fazer algo além do que já fazíamos como adotantes de trechos – que era o manejo da trilha, limpeza e a sinalização.
Era início de 2017 e o Alan já produzia mudas nativas da Mata Atlântica em sua casa. Incentivados pela experiência junto à Val, começamos a reflorestar o trecho 2. Faltava-nos experiência e o terreno pedregoso e mais difícil do trecho, tornou o trabalho pouco produtivo. Nesta época, o Coordenador da Trilha Transcarioca, Horácio Ragucci, havia comentado sobre como a caminhada estava difícil no trecho 3, por conta do capim colonião, que crescia e tomava a trilha, a sua borda e o entorno. A espécie é exótica, oriunda do continente africano, e uma invasora voraz que sufoca as nativas e prospera enquanto houver sol direto sobre ela.
Fizemos um primeiro mutirão, com a ajuda de Guarda Parques do PEPB, para uma grande limpeza e poda na região. Com um solo mais fácil de trabalhar, decidimos iniciar uma limpeza definitiva e o plantio de mudas nativas na área, a solução para controlar a incidência do capim, pois uma vez que a floresta se estabelece e sombreia o solo, o capim não consegue mais crescer.
Com a palavra, Diego Monsores, coordenador de reflorestamento da Trilha Transcarioca
O trabalho de restauração florestal, embora desafiador, é fascinante e, acima de tudo, gratificante. Vai muito além de plantar mudas, é restabelecer processos ecológicos complexos – e isso demanda tempo. Levamos no mínimo de 5 a 8 anos para termos uma cobertura e sombreamento consistente no terreno. Após esse tempo as gramíneas exóticas perdem força e já não se tornam uma ameaça substancial para o ecossistema.
Na maioria dos terrenos que nos propomos a iniciar o trabalho de plantio, encontramos um solo totalmente degradado e sem vida, e com a presença de espécies exóticas invasoras e dominantes como é o caso do Capim Colonião (Panicum maximum). Muitos outros fatores ameaçam nosso trabalho, como é o caso dos incêndios florestais.
Uma das ações no trabalho de reflorestamento, que tem apresentado bons resultados e vale ressaltar, é o plantio consorciado com a adubação verde. Além do plantio de mudas, lançamos no solo sementes de adubação verde: Feijão Guandu, Crotalária e Feijão de Porco, plantas que se estabelecem em campo e trabalham no condicionamento do solo, na fixação de nutrientes como o Nitrogênio, sombreiam o terreno, garantindo um local mais propício ao crescimento das mudas nativas.
O cuidado com o solo é algo que devemos nos atentar. Toda matéria orgânica da capina é deixada como cobertura morta, garantindo um sombreamento e, por consequência, a diminuição da temperatura superficial do solo.
Nosso processo de restauração é totalmente ecológico, não utilizamos nenhum tipo de adubo químico nem venenos para formigas, e tentamos tratar os problemas que ameaçam o trabalho de maneira natural. Por estarmos dentro de uma unidade de conservação, a escolha das mudas é algo que deve ser estudado previamente, observamos as espécies que já ocorrem no local, pois terão muito mais sucesso que as demais.
É no dia a dia que aprendemos que reflorestar vai além de plantar mudas e regá-las. Exige todo um trabalho de preparação do solo, hidratação, controle da flora, ajustes, parcerias… E nos vimos completamente envolvidos pelo trabalho! De lá pra cá, a ação tomou corpo, o grupo voluntário cresceu e o conhecimento se fez presente através de pesquisas e de amigos mais experientes, que compartilharam técnicas de plantio e de manejo. Hoje, ver as mudas que plantamos com 30 cm se tornarem árvores firmes, de 8 a 10 metros de altura, me deixa muito orgulhoso.
Junto a todos estes sentimentos de prazer, o senso de pertencimento traz a certeza de que este é um trabalho de sustentabilidade que vai além do tempo presente. Ver amigos caminhantes participando assiduamente das ações voluntárias, fazer a educação e o conhecimento ambiental se propagarem pela sociedade, me traz mais ânimo para seguir com as ações de conservação da natureza em outros trechos da Transcarioca. E o bacana é que os adotantes estão juntos nesta ideia e somos vários em prol das ações de reflorestamento, manejo e limpeza, além da sinalização em si.
Assista a live da Rede em parceria com ((o))eco sobre o reflorestamento na Trilha Transcarioca:
*Sobre os autores:
Henrique Mendes é adotante do trecho 3 da Trilha Transcarioca
Diego Monsores é coordenador de reflorestamento da Trilha Transcarioca
Luciana Nogueira é coordenadora de comunicação da Trilha Transcarioca
As opiniões e informações publicadas nas seções de colunas e análises são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião do site ((o))eco. Buscamos nestes espaços garantir um debate diverso e frutífero sobre conservação ambiental.
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