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Ladrões de floresta

Polícia Federal desmonta quadrilha envolvida no comércio ilegal de madeira na Amazônia e governo suspende transporte de produtos florestais em 3 estados.

Andreia Fanzeres ·
26 de outubro de 2005 · 19 anos atrás

Nesta quarta-feira, o governo anunciou mais uma operação surpresa para desmantelar quadrilhas ligadas ao comércio ilegal de carvão e de madeira na Amazônia. Batizada de Ouro Verde pela Polícia Federal (PF), que comandou todas as investigações, a operação previa a prisão de pelo menos 53 pessoas envolvidas na falsificação das Autorizações para Transporte de Produtos Florestais (ATPF). Até o início da noite, 43 prisões já haviam sido feitas no Pará, em Rondônia, Mato Grosso, Tocantins, Maranhão, Rio Grande do Norte e Goiás, o coração do crime.

A PF descobriu que não era preciso se distanciar demais da sede do governo federal para enganar a fiscalização do Ibama e abastecer a região amazônica com ATPFs de alta qualidade, consideradas visualmente perfeitas. Elas eram confeccionadas pela gráfica Cometa, em Goiânia. O dono e cinco funcionários do estabelecimento foram presos. Mas se a qualidade do papel e os detalhes eram impecáveis, os falsificadores não prestaram tanta atenção no que vinha escrito no documento. Segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA), foi justamente um erro de impressão que permitiu a descoberta da fraude.

Os documentos, que servem para certificar a origem e as características da carga transportada, eram mandados de avião a Rondônia, Pará e Mato Grosso e em seguida usados na região Norte, além do Maranhão, alguns estados do Nordeste e do Sul. Segundo a PF, em um ano foram comercializadas cerca de 75 mil metros cúbicos de madeira só nos municípios paraenses de Tucuruí, Tailândia, Paragominas e Goianésia, onde a quadrilha lucrou cerca de R$ 65 milhões através de 148 empresas fantasmas. Embora não seja possível precisar o número de ATPFs produzidas pela quadrilha, o MMA estima que tenham sido feitos, no mínimo, 600 documentos falsos. Mas o número deve ser muito superior. Em nota, o ministério menciona que com apenas um homem foram apreendidos 280 ATPFs falsificadas. Algumas chegavam a ser adquiridas por R$ 1.800.

As investigações começaram em dezembro de 2004, depois da apreensão de três carregamentos de madeira com ATPFs falsas no município de Marabá (PA), que vinham de Tailândia (PA), a 295 quilômetros dali. Segundo o delegado da PF em Rondônia, Janderlyer Gomes de Lima, que de Belém coordenou a operação, a Ouro Verde não tem nenhuma ligação com a Operação Curupira. Embora não queria ainda divulgar a lista dos presos e dos mandados de busca e apreensão, o delegado afirmou que, a princípio, as prisões não envolviam gente do próprio Ibama. “Os presos foram basicamente madeireiros, fiscais da Secretaria da Fazenda do Estado do Pará e empresários que diversificavam a forma de ganhar dinheiro com o comércio ilegal de madeira e carvão”, diz o delegado.

O desfecho desta operação foi o anúncio de uma portaria do Ibama suspendendo novamente a emissão de ATPFs, desta vez no Pará, em Rondônia e no Maranhão. Segundo o MMA, a medida é válida a partir desta quinta-feira por até 30 dias. E esse filme as madeireiras do Pará já viram. “Por um mês essa decisão vai afetar os ilegais, mas também vai prejudicar quem explora corretamente”, lembra Marcelo Marquesini, engenheiro florestal do Greenpeace. Além disso, trata-se de um paliativo.

A ministra Marina Silva sabe disso e falou no desenvolvimento de alternativas que estimulem a produção legal de madeira e voltou a insistir na importância do Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas “nas mãos do Congresso”, em suas palavras. Para o Greenpeace, essas alternativas deveriam envolver também novas formas de controlar o comércio dos produtos florestais. Além do mais, as ATPFs fazem parte de um sistema frágil, manjado pelas madeireiras e que vem sendo transferido para os estados. “Com exceção do Acre, os estados têm ainda menos recursos que o Ibama para as ações na Amazônia”, diz Marquesini.

O governo já anunciou que pretende substituir o papel por um documento eletrônico, o Documento de Origem Florestal (DOF), mas, segundo o Ibama, o prazo para sua implantação ainda não está definido.

* Colaborou Ana Antunes.

  • Andreia Fanzeres

    Jornalista de ((o))eco de 2005 a 2011. Coordena o Programa de Direitos Indígenas, Política Indigenista e Informação à Sociedade da OPAN.

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