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A melhor amiga do meio ambiente

Tecnologia é a solução para graves problemas do planeta. Ambientalistas precisam discutir, sem preconceitos, possibilidades como transgênicos e energia nuclear.

30 de janeiro de 2006 · 18 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Ambientalistas, com freqüência, se opõem às mudanças tecnológicas e à dissolução de culturas antigas. Será que boa parte do movimento ambiental é uma versão moderna dos luddistas?

Na Inglaterra, entre 1811 e 1813, os luddistas formaram um movimento dedicado a destruir máquinas de tecelagem. Seus integrantes eram artesãos revoltados contra as novas técnicas que, ou perderam seus empregos, ou não aceitavam conviver com os preços mais livres e baixos, pois violavam a tradição de preços combinados. O nome do movimento foi inspirado num personagem mítico chamado Ned Ludd. Não há certeza se ele existiu. Conta a lenda que ele ganhou a fama de destruidor de máquinas por acaso. Na realidade, teve um ataque de fúria com duas crianças, e invadiu a casa da mãe delas, quebrando dois teares que encontrou pelo caminho.

O movimento luddista não durou muito nem foi importante. Logo, o governo britânico prendeu seus líderes, condenando alguns à morte e mandando outros tantos para a Austrália. Mas é lembrado até hoje, porque capturou vivamente a relação ambígua, de amor e ódio, que mantemos com o progresso tecnológico.

Dois artigos recentes publicados no jornal Valor Econômico me fizeram pensar na relação entre a mentalidade anti-tecnológica e o movimento ambiental.

Transgênicos

O primeiro é a tradução de uma reportagem sensacional, da The Economist, sobre a história do trigo. Junto com o arroz e o milho, esse grão garantiu as calorias necessárias para que a população humana, há 10 mil anos, saltasse de algo como 10 milhões para ultrapassar, hoje, os 6 bilhões. Se não fosse esse progresso, eu provavelmente não estaria aqui. Da minha parte, passei a adorar ainda mais o trigo.

A reportagem chama a atenção para um fato pouquíssimo conhecido. Boa parte do movimento ambientalista está em guerra contra os transgênicos. No entanto, diz a The Economist, o método anterior para produzir novas variedades de grãos era bombardear as plantas com cancerígenos como raios-x ou metano sulfonato de etila. A idéia era danificar o DNA das plantas para produzir mutações aleatórias, contando que algumas viessem a ser mais produtivas.

Ao que consta, todas as variedades atuais de trigo e cevada foram geradas assim. E nunca ninguém protestou. Por outro lado, afirma a revista, as lavouras transgênicas aumentaram a produtividade, reduziram o uso de pesticida e, até agora, não causaram um único problema de saúde. Os cientistas que desenvolveram os trangênicos buscavam uma forma mais sutil, previsível e segura de produzir mutações. Será a resistência aos transgênicos, em parte, uma fervorosa censura aos cientistas por “brincar de Deus”?

África

O outro artigo se chama “Abraçando a ciência” (“Embracing science”). Quem o assina é Jeffrey Sachs, economista da Universidade de Columbia, dedicado nos últimos anos a propor medidas que reduzam a miséria, principalmente, na África. O assunto não é meio ambiente. Mas o texto lembra que a produtividade agrícola africana é um terço da média mundial. Além de causar fome em massa, essa ineficiência leva os africanos a desmatarem mais e caçarem animais em extinção.

Diz Sachs: “O progresso econômico de longo prazo decorre principalmente da invenção e da proliferação de tecnologias melhoradas. A revolução científica tornou-se possível em função da prensa tipográfica, a revolução industrial, da máquina a vapor, e a saída da Índia da fome coletiva, em função do aumento da produtividade agrícola – a chamada Revolução Verde”.

Segundo ele, a África precisa de tecnologia na veia. O continente precisa de ajuda em dinheiro, sim. Mas aplicado em programas de disseminação de equipamentos e métodos de alto impacto na produção e no bem-estar. Entre as sugestões, telefones celulares para comunicação rural e redes de mosquito para controlar a malária. No campo, variedades de sementes adequadas ao clima local e tecnologias de recuperação do solo e gerenciamento de água. Tudo isso pede escala de produção e mudanças nas culturas tribais.

Dilema nuclear

É preciso desapego ideológico para analisar alternativas consideradas “ambientalmente incorretas”, mas que podem gerar um benefício líquido. As plantações de eucalipto para a produção de celulose são um exemplo. Foram apelidadas pelos movimentos ambientais de “desertos verdes”. A razão é a baixa biodiversidade dessas florestas cultivada. No entanto, a existência delas é que permite poupar as florestas naturais. Dentro de limites razoáveis, os eucaliptos são a solução, ao invés do problema.

Existe uma polêmica incendiária no horizonte. Alguns cientistas preocupados com o efeito estufa advogam o uso maciço da energia atômica como forma de contê-lo. O assunto cala fundo nos ambientalistas, pois a bandeira anti-nuclear foi uma das origens do movimento. Mas fica a pergunta: e se essa for a solução viável para o problema?

Tecnologia se traduz em conhecimento que nos permite tirar mais produção de uma dada quantidade de insumos. Quanto mais avançada for, menos insumos serão necessários para satisfazer as demandas humanas. Em outras palavras, quanto mais avançado for o estado da arte de produzir, maior será o progresso econômico compatível com a proteção ambiental.

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