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A descarbonização da energia

Falta muito, mas mesmo sem ter chegado ao nirvana do hidrogênio, a história mostra que aos poucos estamos nos livrando das fontes intensivas em carbono, as mais poluentes.

3 de janeiro de 2007 · 18 anos atrás
  • Eduardo Pegurier

    Mestre em Economia, é professor da PUC-Rio e conselheiro de ((o))eco. Faz fé que podemos ser prósperos, justos e proteger a biodiversidade.

Nos últimos 200 anos, a humanidade passou a ser uma voraz consumidora de energia. Esse caminho, iniciado com a Revolução Industrial, começou com o carvão mineral. Em seguida, passou para o óleo combustível, gás natural e energia elétrica. Em cada um desses passos, a fonte de energia perdeu um átomo de carbono. Estaremos de fato descarbonizando a nossa geração de energia até chegar a formas limpas?

Jesse Ausubel, professor da universidade Rockefeller, em Nova York, chama atenção para o processo de descarbonização da energia e qual a estratégia para levá-lo a um happy end: o uso do hidrogênio, que deixa como único resíduo o inofensivo vapor d’água. Ele conta essa história no artigo “Energy and environment: the light path” (Energia e meio ambiente: o caminho leve).

Ausubel defende que o desenvolvimento sustentável, que combina alto padrão de vida com o uso em escala da energia só será possível em grandes aglomerados urbanos. “Dominamos o fogo há meio milhão de anos”, diz ele. “Com a invenção da agricultura, há 10 mil anos, nossa espécie finalmente obteve os meios para um crescimento constante”.

E continua: “as altas taxas de produtividade e eficiência do trabalho obtidas com a mecanização da agricultura liberaram as pessoas da terra e alimentaram o crescimento das cidades. No século XIX, Londres era o maior centro metropolitano do mundo, com uma população da ordem de 10 milhões. Hoje, o corredor Tóquio-Osaka tem 80 milhões de habitantes. No mundo todo, 55% da população humana já é urbana”.

A industrialização inglesa aumentou a densidade da população e, também, do uso de energia. No início do século XIX, as principais fontes de energia eram madeira e feno. Ambas são difíceis de transportar e armazenar. “Imagine se todo o morador urbano precisasse, no seu dia-a-dia, de uma braçada de madeira para se aquecer e de um monte de feno para mover o seu Honda?”, brinca o autor. Por essa razão, a energia de biomassa acabou perdendo o lugar para o carvão no abastecimento de Londres.

“O carvão dominou o panorama da energia por um longo período, embora o seu uso tenha acabado com a saúde dos mineiros, tenha poluído o ar e a terra de onde era retirado”, narra Ausubel. Mas logo ficaram evidentes as vantagens dos combustíveis fluidos. Locomotivas podem ser movidas a carvão, mas como criar um sistema de abastecimento de carros à carvão? Começou a era do óleo, que tem mais capacidade energética do que o carvão, além de ser fluido, facilitando o seu transporte e armazenamento. Assim, em torno de 1950, os derivados de petróleo tomaram do carvão a liderança na geração de energia.

Mas em áreas urbanas densas, o ideal é um sistema de energia que possa ser usado de acordo com a demanda. Nesse caso, o gás natural e a energia elétrica são superiores aos derivados de petróleo. Ambos podem ser ligados e desligados, além de transportados discretamente por redes que atingem cada lar. Ambos são muito mais limpos do que o petróleo. Nos Estados Unidos, a energia elétrica já fornece cerca de 40% do total nacional. Nos próximos 30 anos, o caminho é aumentar ao máximo a eficiência do uso dessas duas fontes.

Mas para onde caminhamos? “Por 200 anos, a dieta energética do mundo se moveu na direção de favorecer átomos de hidrogênio sobre os de carbono, no nosso ensopado (stew) de hidrocarbono”, afirma Ausubel. “O carvão tem apenas um hidrogênio para cada átomo de carbono, óleo dois, e gás natural (metano), claro, é o CH4.

A parada final é o hidrogênio. Quando isso acontecer, ele se beneficiará da tecnologia de infra-estrutura desenvolvida para o gás, já que ambos são transportados de forma parecida. Será que chegaremos nesse estágio? Ele esbarra em grandes dificuldades, tanto do ponto de vista tecnológico quanto ético. Para tornar o hidrogênio amplamente acessível, a saída mais provável será a energia nuclear.

Mas mesmo com percalços, não é um mau sinal saber que, mesmo sem ter chegado ao nirvana do hidrogênio, a história mostra que, aos poucos, estamos nos livrando das fontes intensivas em carbono, as mais poluentes.

Aproveito para desejar um feliz 2007 para os leitores de O Eco. Que seja um ano em que aprendamos a desperdiçar menos, favorecer qualidade sobre quantidade; e que nele surjam grandes personalidades e idéias para tornar a vida melhor e o meio ambiente mais limpo.

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