Reportagens

Carne de primeira

Ser ecologicamente correto e comer carne vermelha no Brasil parecem ser duas coisas incompatíveis, mas não são. Supermercados já oferecem carne orgânica com certificado.

Felipe Lobo ·
18 de abril de 2007 · 18 anos atrás


As diferenças entre a pecuária orgânica e a tradicional vão além da saúde e do gosto da carne. A preservação ambiental é uma das condições a serem cumpridas por quem deseja receber a certificação do IBD. As restrições de impacto à natureza começam no manejo da pastagem. É permitido somente a adubação verde, sem fertilizantes sintéticos, além de ser proibido o uso de pesticidas, agrotóxicos, uréia e fogo. Todos esses elementos são utilizados na pastagem do boi tradicional (ou verde, como também é conhecido).

O boi na pecuária orgânica é 100% vegetariano e nove entre dez ingredientes incluídos na sua alimentação diária são orgânicos. Ao contrário da pecuária tradicional, é proibido o uso de hormônios e promotores de crescimento. Há apenas uma exceção: o uso de medicamentos. “Se o animal tiver algum problema, alguns insumos podem ser usados caso haja um atestado de necessidade clínica de uso. Mas ele só pode ter três aplicações (se passar perde a classificação orgânica)”, afirma Graziella Vasconcelos, gerente de certificação do IBD. Ela lembra, ainda, que geralmente são os bezerros quem têm pequenos problemas, o que significa que os bois vão para o abate por volta de 20 semanas depois da última aplicação, caso ela seja necessária.

A certificação verifica se todo esse processo foi cumprido à risca. Existem algumas empresas com essa incumbência, mas o IBD é quem faz a fiscalização de todas as fazendas filiadas à ASPRANOR. De acordo com Vasconcelos, a fazenda deve seguir algumas diretrizes. Todos os bois, desde que nascem, recebem um brinco com uma numeração que o acompanhará até depois de ser abatido. Isso permite que seja feita uma rastreabilidade de toda a sua vida, já que existem técnicos capacitados para perceber a eficiência dos manejos alimentar e sanitário dos animais em auditorias anuais e surpresas – que ocorrem a partir de denúncias ou de sorteios.

Segundo a gerente de certificação da empresa, existe o controle inclusive no momento do abatimento no frigorífico. Uma vez que a peça de carne ainda com a numeração é retirada após o abatimento, o IBD certifica se aquela quantidade é equivalente ao peso e medida do boi que a gerou. Para isso, eles têm conhecimento de todos os abates que acontecem regularmente, além de liberar apenas os animais com idade e saúde suficiente para a prática. “Um animal orgânico não pode passar por sofrimento nunca. Para o frigorífico, que também é certificado, são exigidas práticas do abate humanitário. Por isso existe a insensibilização, que torna o animal insensível antes da morte”, ressalta Vasconcelos.

Auxilio ao Pantanal


O trabalho da WWF nesta parceria foi de apoiar a estruturação da cadeia de produção orgânica na região, historicamente recheada de pecuária tradicional. E a principal função de Henrique Balbino, presidente da ASPRANOR, é gerir os negócios de cerca de 40 fazendas de pecuária orgânica. Segundo ele, tudo é feito da forma mais natural possível, desde a criação livre dos animais até o uso de homeopatia e ervas no desenvolvimento dos bichos, o que contribui para a retirada da carne mais pura e nobre.

A distrubuição da carne orgânica no país ainda não é as mil maravilhas. O frigorífico Friboi vende o produto para as maiores redes de supermercado brasileiras, mas não há regularidade na compra. Ou seja, o leitor pode dar sorte de achá-la – exija sempre o selo de certificação -, mas não é garantido. A carne é mais cara do que a tradicional porque exige maior tempo de manejo e por ter melhor qualidade. Mas vale a pena. Além de consumir um produto bastante limpo, livre de suplementos sintéticos, existirá também o apoio à natureza. As fazendas de pecuária orgânica devem seguir à risca os mandamentos da legislação ambiental, como a manutenção de uma Reserva Legal, por exemplo. Dessa forma, o técnico que as inspeciona anualmente poderá e deverá ver pássaros voando, ninhos em árvores e outra série de animais nativos entre as pastagens.

  • Felipe Lobo

    Sócio da Na Boca do Lobo, especialista em comunicação, sustentabilidade e mudanças climáticas, e criador da exposição O Dia Seguinte

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