Notícias

Para conceder crédito, bancos brasileiros vão exigir que frigoríficos provem legalidade da carne

Novas regras criam protocolo comum nas operações de crédito com frigoríficos e exigem monitoramento de fornecedores diretos e indiretos, mas só em 2025

Cristiane Prizibisczki ·
30 de maio de 2023

Bancos instalados no Brasil vão passar a exigir que frigoríficos na Amazônia Legal e no Maranhão comprovem não ter comprado gado de área de desmatamento ilegal, antes de oferecer créditos. Assim como vários dos grandes frigoríficos brasileiros, no entanto, o compromisso só passa a valer a partir de 2025. 

A norma faz parte de um novo protocolo, aprovado pelo Conselho de Autorregulação da Federação Brasileira de Bancos (Frebraban) em março passado, e divulgado nesta terça-feira (30) pela Federação.

Oito bancos fazem parte do Conselho: Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Banco Votorantim, BMG, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Daycoval e Santander. De acordo com a Febraban, 21 instituições financeiras aderiram ao protocolo (veja lista abaixo).

A nova norma estabelece que os bancos brasileiros, ao oferecer crédito a frigoríficos e matadouros, terão de cumprir um protocolo com requisitos mínimos comuns para combater o desmatamento ilegal. 

Atualmente, a pecuária é o principal vetor do desmatamento na Amazônia: pastos para o gado cobrem cerca de 90% da área total desmatada no bioma e mais de 90% dos novos desmatamentos são ilegais.

Pelo protocolo da Febraban, eles devem solicitar que seus clientes frigoríficos implementem, até 2025, um sistema de rastreabilidade e monitoramento tanto de seus fornecedores diretos quanto dos indiretos. 

Tal sistema deverá fornecer informações como embargos, sobreposições com áreas protegidas, identificação de polígonos de desmatamento e autorizações de supressão de vegetação, além do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades de origem dos animais. Aspectos legais de empregados também devem ser considerados, de forma a excluir a possibilidade de trabalho análogo ao escravo.

A ideia é que cada banco crie seus planos de adequação junto aos clientes, com incentivos e consequências cabíveis. Para medir o progresso dos frigoríficos, a Febraban informa que o programa de autorregulação criou indicadores de desempenho, a serem divulgados periodicamente pelos frigoríficos.

Segundo o diretor de sustentabilidade da Febraban, Amaury Oliva, o entendimento do setor é que o financiamento de atividades associadas ao desmatamento pode ampliar riscos de crédito, reputacionais e operacionais.

“Sabemos que há uma série de entraves para que a rastreabilidade atinja todo o ciclo, principalmente os produtores em estágios iniciais da cadeia de fornecimento. Esses desafios passam pela existência de bases de dados atualizadas, precisas e abrangentes, além da própria capacidade de pequenos pecuaristas, por exemplo,

em se adequar. Por isso, iniciamos com os fornecedores diretos dos frigoríficos e o primeiro nível dos indiretos, o que já demonstra avanço, e definimos alguns mecanismos alternativos, por exemplo para os frigoríficos de pequeno porte”, explicou Oliva.

De acordo com Paulo Barreto, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, a adoção da medida deveria ser imediata. 

“A manchete deveria ser: Bancos aceitam continuar atrelados ao desmatamento até 2025. O que farão sem rastreamento completo do gado até 2025? Desconsiderarão que frigoríficos estimulam o desmatamento indiretamente comprando bezerros e novilhos de terras desmatadas ilegalmente?”, disse, em sua conta no twitter, ao comentar a notícia, antecipada pelo Estadão na noite de segunda-feira (29).

A adesão à autorregulação é voluntária, mas, segundo a Febraban, bancos que aderirem podem ser punidos, em caso de descumprimento das normas.

Bancos que aderiram ao protocolo de autorregulação da Febraban

  • Banco ABC Brasil S.A.
  • Banco Bradesco S.A.
  • Banco BTG Pactual S.A.
  • Banco Citibank S.A.
  • Banco Cooperativo Sicredi S.A.
  • Banco Daycoval S.A.
  • Banco do Brasil S.A.
  • Banco do Estado do Pará S.A.
  • Banco do Estado do Rio Grande do Sul S.A.
  • Banco do Nordeste do Brasil S.A.
  • Banco Fibra S.A.
  • Banco Mercantil do Brasil S.A.
  • Banco Original S.A.
  • Banco PAN S.A.
  • Banco Safra S.A.
  • Banco Santander Brasil S.A.
  • Banco Toyota do Brasil S.A.
  • Banco Votorantim S.A.
  • Caixa Econômica Federal
  • China Construction Bank Banco Multiplo S.A.
  • Itaú Unibanco S.A.
  • Cristiane Prizibisczki

    Cristiane Prizibisczki é Alumni do Wolfson College – Universidade de Cambridge (Reino Unido), onde participou do Press Fellow...

Leia também

Reportagens
9 de março de 2023

Gigantes da carne ainda negam transparência sobre indiretos, mesmo após firmarem compromissos

Empresas não autorizaram a publicação dos resultados individuais na ferramenta Radar Verde, que insere fornecedores indiretos na equação. Setor alega discordância na metodologia

Notícias
27 de fevereiro de 2023

Banco francês é processado por financiar frigorífico brasileiro ligado ao desmatamento ilegal

Organizações querem que BNP Paribas, principal banco europeu, seja responsabilizado por investir na Marfrig, frigorífico ligado à destruição ilegal da Amazônia e ao trabalho escravo

Salada Verde
12 de abril de 2023

Consumidores aceitam medidas para reduzir consumo de carne em prol do bem-estar animal

Na Alemanha, bem-estar animal é um determinante mais forte do apoio público à tributação da carne do que a mitigação das mudanças climáticas, mostra estudo

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.