No final do ano passado, o Instituto Baleia Jubarte sonhava com a possibilidade de, finalmente, fazer um planejamento estratégico de longo prazo. A instituição, que pesquisa e monitora a presença de jubartes de julho até setembro no litoral da Bahia, tinha acabado de negociar, junto com outras quatro ONGs também envolvidas com a conservação marinha na costa brasileira, um contrato de patrocínio com a Petrobras para sustentar sua atividade por três anos. Mas o dinheiro da estatal até agora não saiu e ao invés da tão sonhada estabilidade, o Baleia Jubarte vem sendo administrado na base da emergência. O aperto no caixa obrigou a redução das atividades de monitoramento e pesquisa e verbas de alguns projetos específicos acabaram sendo remanejadas para o pagamento de salários e alimentação de seus funcionários.
“Tivemos de nos reorganizar”, diz Márcia Engel, responsável pela direção do Baleia Jubarte. Como ela, os dirigentes dos projetos Tamar e Golfinho-Rotador, baseados em Fernando de Noronha, e Peixe-Boi e Baleia Franca também se viram forçados a fazer conta e a adequar suas expectativas a um momento de aguda crise financeira. Karina Groch, coordenadora do Baleia Franca, conta que foi obrigada a cancelar um encontro de pesquisadores estrangeiros que deveria ocorrer este mês em Santa Catarina, base da ONG, e a diminuir o trabalho de pesquisa. Para manter a atividade que ela considera vital, os sobrevôos de helicóptero para fazer a indentificação e o controle das baleias, teve que apelar ao bom coração de um velho amigo rico, que emprestou seu próprio aparelho e, por enquanto, não cobrou a gasolina consumida em 20 horas de vôo.
Groch diz que a direção do Baleia Franca está apelando ao cheque especial para pagar as contas de telefone da entidade e, para manter um mínimo de estrutura funcionando, foi forçada a abrir mão de salários. O dinheiro para cobrir a remuneração dos estagiários que monitoram a costa catarinense durante a temporada das francas, que também começa em fins de julho e vai até o início de outubro, está saindo de um financiamento da Fundação Avina originalmente alocado para um programa de capacitação técnica. O Baleia Franca cancelou as comemorações pelos 25 anos do projeto e suspendeu, pelo menos temporariamente, seu festival anual em Imbituba, cujo principal objetivo é educar a população local e divulgar a presença das baleias no litoral catarinense.
O atraso inédito no desembolso do patrocínio a esses cinco projetos ameaça uma das parcerias de maior sucesso na área de conservação ambiental no Brasil. A Petrobras tem uma antiga tradição de apoio a esses cinco projetos de preservação na costa brasileira. Até o ano passado, ele era renovado anualmente. A estatal, no entanto, com o apoio do Ibama, sugeriu aos coordenadores dessas entidades uma pequena revolução na maneira como o patrocínio era concedido. Propôs estendê-lo para três anos desde que elas apresentassem uma proposta integrando seus trabalhos. As ONGs se reuniram e apresentaram o projeto no fim de 2006 e ele foi aprovado pela estatal no início desse ano. Mas o dinheiro não sai. Em troca da esperança de estabilidade de longo prazo, lamenta Groch, as ONGs acabaram caindo num ano de sufoco.
Ela diz que se soubesse que 2007 ia ser assim, teria defendido a manutenção do modelo antigo, de patrocínios anuais. “Podia dar menos segurança num certo sentido, mas pelo menos o desembolso atrasava no máximo 2 meses”, diz. Agora, o atraso, está prestes a comemorar seu primeiro aniversário. Em retrospectiva, a Petrobras começou a dar sinais de que a renovação do patrocínio demoraria a ser concretizada já em agosto de 2006, quando ofereceu ao pessoal que cuida das francas e jubartes o primeiro de três aditivos ao contrato antigo para poder adiantar algum dinheiro. O último aditivo, conta Eduardo Camargo, diretor administrativo do Instituto Baleia Jubarte, é de abril. De lá para cá, a estatal não abriu mais o bolso. Marcia Engel diz que foi informada pela empresa que no máximo na semana que vem os contratos de renovação serão assinados, permitindo a liberação do dinheiro.
Groch, do Baleia Franca, não tem tanta certeza assim e prefere, por enquanto, continuar fazendo planos para enfrentar uma situação de emergência. Na Petrobras, qualquer tentativa de saber a quantas anda a liberação do dinheiro para esses projetos gera um evidente estresse. A reportagem de O Eco procurou a estatal ao longo da quarta-feira com duas óbvias perguntas: por que o dinheiro desses patrocínios, que têm história tão bonita na conservação marinha do país, não sai, e se há previsão para a assinatura dos contratos e o início dos desembolsos? A assessoria de imprensa, depois de muito desconversar, não quis ou não soube responder.
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