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Mais vermelha do que nunca

Levantamento anual de espécies ameaçadas revela que 70% das plantas no mundo correm risco. De 2006 para cá, 188 novas espécies passaram a ser consideradas em perigo de extinção.

Felipe Lobo ·
12 de setembro de 2007 · 17 anos atrás

A União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) divulgou nesta quarta-feira a sua tradicional Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas de 2007. Uma vez por ano, o mundo se atualiza quanto aos impactos de suas ações nas espécies vegetais e animais ao redor. E como era de se prever, o desempenho da humanidade é pior a cada dia. Para se ter uma idéia, mais de 41 mil espécies foram analisadas em todos os continentes e nada menos que 16.306 estão ameaçadas de extinção. Isso quer dizer que em relação à lista do ano passado, 188 novas espécies passaram a integrar essa categoria.

O levantamento – o mais conceituado deste tipo no mundo – concluiu que estão em situação de risco um entre cada quatro mamíferos, uma em oito aves, um terço de todos os anfíbios e 70% das plantas avaliadas. O anuário também destacou declínio acentuado dos grandes primatas e a inclusão de 10 tipos de corais das ilhas Galápagos no extenso conjunto dos seres vivos que correm extremo perigo. A situação é no mínimo preocupante, já que é a primeira vez que esses organismos são sequer pesquisados segundo os critérios da Lista Vermelha. Pesquisadores acreditam, por exemplo, que o coral solitário de Wellington, que costumava ser facilmente encontrado nas águas de Galápagos há alguns anos, esteja extinto. No caso dos gorilas ocidentais, eles passaram do status de muito ameaçados para extremamente ameaçados em virtude do forte comércio de sua carne e do vírus ebola. Sua população diminuiu cerca de 60% nos últimos 25 anos

E não apenas eles estão na corda bamba. As aves também correm riscos. Na verdade, 1.217 espécies estão listadas nas três categorias de maior perigo (criticamente ameaçada, muito ameaçada, vulnerável). Os urubus de cabeça vermelha e egípcio deram um salto em seu status na relação de um ano para o outro. Enquanto em 2006 o primeiro aparecia como quase ameaçado, emplacou em 2007 como perigo crítico. O pulo do segundo teve tanta importância quanto: se, no ano passado, a preocupação com o urubu egípcio era menor, este ano ele é muito ameaçado. Os motivos, mais uma vez, recaem sobre causas antrópicas. Nos últimos oito anos, a diminuição ocorreu graças ao uso de fertilizantes químicos em pastagens, que contaminam as aves.

Felizmente, um tipo de begônia da Malásia foi a única planta declarada extinta este ano. Mas a boa notícia pára por aí. Ao todo, os cientistas investigaram 12.043 espécies vegetais, sendo que 8.447 correm algum tipo de risco. E as ilhas de Galápagos contribuem novamente para a extensa relação, desta vez com 74 algas. Delas, seis devem ser consideradas completamente extintas muito em breve. “Com a sobrepesca, os efeitos na cadeia alimentar são muito catastróficos. Os grandes predadores são capturados e deixam de se alimentar de outros animais que comem as algas e os corais”, explicou o oceanógrafo e colunista de O Eco, Frederico Brandini.

Mais espécies ameaçadas no Brasil

O Brasil tem destaque na lista de 2007, muito provavelmente porque está entre os quatro países do mundo que mais abrigam espécies ameaçadas, junto com China, Austrália e México. Quando a América do Sul apresenta o considerável número de 10.930 animais e plantas avaliados pela IUCN este ano, o Brasil é responsável por 3.848 deles. Dentro do grupo, os cientistas contaram 725 espécies em risco nas terras nacionais, quatro a mais do que na última versão. O perigo aumentou, principalmente, para os peixes. Em 2006, eram 58 espécies ameaçadas. Agora são 66. A raia viola brasileira, por exemplo, é uma das que passaram da categoria de muito ameaçada para criticamente ameaçada por causa da pesca.

Cerca de 40% de todas as espécies do continente sul-americano encontram-se com algum grau de ameaça, sendo que 29 delas estão totalmente extintas, e outras seis já não podem ser encontradas na natureza, apenas em cativeiros. Deste total, o Brasil é culpado por 11 desaparecimentos completos. A preocupação é enorme entre os membros do IUCN por estas bandas. “Os valiosos esforços realizados até agora não são suficientes. O ritmo da perda de biodiversidade está aumentando e necessitamos atuar agora para impedir esta crise global da extinção”, disse em comunicado oficial a diretora geral da organização, Julia Marton-Lefèvre.

Estima-se que existam entre 10 e 100 milhões de espécies no mundo, com maior certeza para algo em torno de 15 milhões. Até hoje, no entanto, a ciência não conhece pouco mais de um décimo dessa estimativa, desafio que fica a cada ano prejudicado pelas conseqüências da diminuição de hábitats, alterações climáticas, poluição e espécies invasoras.

Categorias de risco

Produzida por pesquisadores que compõem a Comissão de Sobrevivência de Espécies da UICN, a lista conta com a colaboração de mais de 800 especialistas e de centenas de organizações associadas no planeta. Ela começou a ser feita em 1963, mas a partir de 1994 passou a adotar os atuais critérios de avaliação. As espécies estudadas são alocadas em nove categorias: extinta, extinta na natureza (indivíduo apenas em cativeiro), criticamente ameaçada, muito ameaçada, vulnerável, quase ameaçada, menor preocupação (muitos indivíduos espalhados), dados insuficientes e não examinadas. Mas foi apenas em 2000 que animais e plantas foram contemplados na mesma publicação.

Na página oficial da Lista Vermelha, é possível encontrar uma galeria de fotos e um mapa interativo com animais e plantas separados pelas regiões do planeta, além de informações da lista comparadas com os outros anos. Em relação ao ano passado, 74 espécies desceram no status de ameaça, enquanto outras 76 ficaram sob riscos ainda maiores.

O site traz ainda dados mais do que justificáveis para a implantação imediata de estratégias mais eficazes de conservação nos países. De acordo com a presidente da comissão, Holly Dublin, é preciso “mais atenção e ação do público em geral, do setor privado e dos responsáveis pela política, a fim de assegurar que a biodiversidade global permaneça intacta para as gerações futuras”. Enquanto este discurso não for colocado em prática, no entanto, as listas tendem a ficar bem mais vermelhas.

  • Felipe Lobo

    Sócio da Na Boca do Lobo, especialista em comunicação, sustentabilidade e mudanças climáticas, e criador da exposição O Dia Seguinte

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