Reportagens

Florada Juruena

Redação ((o))eco ·
19 de março de 2008 · 17 anos atrás

No dia 10 de março chegou ao último acampamento da expedição no Juruena um lote de um jornal regional de Mato Grosso. Não era para trazer notícias frescas para os participantes da expedição, afinal, havia reportagens do dia cinco de dezembro do ano passado. O material, esperado com ansiedade pelos pesquisadores responsáveis pelo levantamento de vegetação, ia literalmente absorver muita coisa interessante do parque do Juruena. As amostras de plantas precisavam ser prensadas e os jornais que já estavam em campo ameaçavam acabar. A grande quantidade de coletas consumiu, seguramente, mais de 20 quilos de jornais. Ayslaner Victor Gallo de Oliveira, pesquisador titular de vegetação para o plano de manejo, estima que deva dobrar o volume de plantas coletadas nesta expedição em relação às pesquisas realizadas no sul do parque, em novembro de 2007. Naquela ocasião, foram enviados aos laboratórios 45 quilos de materiais, abrangendo pouco mais de 300 espécies de flora. Mas sobre as espécies da expedição de março, ele não dá palpites antes de ver analisadas em laboratório todas as coletas. Mas garante que, entre uma expedição e outra, algumas lições importantes foram aprendidas, principalmente no que se refere ao transporte e embalagem de materiais tão preciosos para a botânica. Segundo ele, ao contrário do que aconteceu na primeira expedição, todas as coletas serão enviadas de avião para Belo Horizonte, para que possam ser estudadas no laboratório da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) pelo taxonomista Marcos Sobral, que também participou dos trabalhos em campo. Nesta campanha, as coletas de plantas deixaram os pesquisadores muitíssimo animados. Encontraram, mais do que em qualquer outra área de estudo no Juruena, muito material para coletar. “Tivemos mais coletas em beira de rio e isso se deve também à área de abrangência desta expedição, pegando os rios Juruena, Teles Pires e Tapajós, além da época do ano favorável”, diz Ayslaner. Este é o momento em que as plantas estão com frutos e se dispersando. Ótimo para quem precisa coletar o maior número de materiais férteis. “Para chegarmos ao nível de espécie, até com frutos às vezes é complicado. O ideal é analisarmos também as flores”, explica o engenheiro florestal. Trabalho de campo De acordo com Ayslaner, o trabalho no parque do Juruena ultrapassa em muito a tarefa de simplesmente coletar. “Além da coleta, a gente faz a descrição dos ambientes, sua densidade, estrutura e anotamos essas informações todas ao longo da trilha. Sempre o máximo que podemos”, diz o pesquisador. Depois, levam o material para a área de acampamento num saco plástico simples e aí acondicionam-no no jornal. Tudo fica empilhado, como num “sanduíche de jornal e planta”, diz, didaticamente. Segundo Ayslaner, depois de secar por uns dois dias, o material é novamente embalado em um saco mais resistente com álcool, para agüentar até seu destino final. Ele explica que procura coletar materiais repetidos, com folhas, frutos e flores, pois futuramente serão destinados a diferentes locais para análise. De acordo com Ayslaner, uma amostra deverá ser encaminhada ao herbário da UFMG. Estão com pretensão de enviar uma segunda cópia para o herbário da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) em Alta Floresta, e uma terceira serviria a especialistas em algum gênero em específico, caso haja necessidade. “Geralmente os especialistas ficam muito felizes em receber algum material desta região”, considera Ayslaner. Raríssimas pessoas – que dirá pesquisadores especialistas em plantas – tiveram a oportunidade de conhecer a região do Alto Tapajós e as confluências dos rios Juruena e Teles Pires, que ainda guarda exemplos da Amazônia conservada como em poucos lugares. Conforme recorda Ayslaner, foi feito um trabalho de levantamento biológico na reserva ecológica do governo de Mato Grosso, existente no ‘biquinho’ do estado, sobreposto totalmente pelo parque nacional. Mas só quem coletou vegetação nesta região mais vasta (e publicou suas descobertas) foi a expedição Langsdorff, entre 1826 e 1828, as equipes do projeto RADAM Brasil na década de 1970, e agora a expedição científica para subsidiar o plano de manejo do Parque Nacional do Juruena. Um grande privilégio, sem dúvida. “Tenho até mesmo um sentimento de gratidão por ter tido a oportunidade de estar aqui, fazendo um trabalho que tão pouca gente fez”, considera. É por causa dessa falta de referências mais completas para estudo de vegetação na Amazônia que o taxonomista Marcos Sobral prefere não comentar o que foi coletado na região. “Ainda há um mundo a ser pesquisado. E as grandes coleções amazônicas que existem hoje são na verdade muito pequenas perto da vastidão dessa região. Por isso, sobre qualquer coisa que se encontre, não é possível dizer se é raro, comum ou incomum. Simplesmente não se conhece para dizer”, pondera o pesquisador.

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