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Meus amigos ambientalistas que se foram na última década

Conheça um pouco da trajetória de onze homens que dedicaram a carreira em defesa das áreas e recursos naturais da América Latina.

10 de fevereiro de 2015 · 10 anos atrás
  • Marc Dourojeanni

    Consultor e professor emérito da Universidade Nacional Agrária de Lima, Peru. Foi chefe da Divisão Ambiental do Banco Interam...

Entre 2006 e 2013, ou seja, só nos últimos sete anos, onze dos mais destacados defensores de áreas naturais, recursos naturais e do meio ambiente na América Latina, que serviram muito ao Peru e ao Brasil, morreram. Isso foi um duro golpe para a defesa do meio ambiente, porque, embora alguns morreram quando pelas regras da biologia isso estava na ordem natural das coisas, quase a metade deles desapareceu muito mais cedo do que era de se esperar. A dor e a saudade são sempre as mesmas, mas no caso dos que morreram jovens demais, soma-se a perda das contribuições que não puderam fazer e que todos esperávamos. Se foram quando mais precisávamos deles.

Todos eram amigos pessoais meus ou da minha esposa, Maria Tereza, e vários eram amigos íntimos, colegas de muitas décadas e de tantas lutas. Por isso eu me atrevi a preparar esta nota que os reúne e que pretende dizer algo mais sobre eles para que não sejam esquecidos.

Os comentários são apresentados na ordem dos falecimentos e falam ao respeito de suas contribuições especiais a nossa região e a minha relação com eles. Suas histórias de vida completa são enormes e estão na Internet.

JOSEPH TOSI (2006†)

Ele trabalhou em toda a América Latina, especialmente no Peru, onde aplicou as teorias de Holdridge para produzir em 1960 sua obra-prima “Zonas de Vida Natural no Peru”, que é a base científica do Sistema Nacional de Áreas Naturais Protegidas do Peru.

Joseph viveu um longo tempo no Peru, mas principalmente na Costa Rica, onde foi professor. Seus discípulos formam legiões.

Entre outras obras, ele criou na Costa Rica a primeira e a mais famosa reserva natural particular da América Latina, conceito que felizmente foi imitado em toda a região.

Ninguém, nem os índios, conheciam a floresta tropical tão bem como ele. Mas ele também conhecia todos os biomas da América Latina.

Jo Tosi, a partir dos anos 1950 e 1960, foi o pioneiro anônimo da conservação e da gestão sustentável dos recursos naturais no Peru e em todo o continente.

CARLOS PONCE DEL PRADO (2007†)

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Carlos foi o primeiro peruano que nos deixou. Ele era o meu confidente, meu compadre e meu parceiro nas boas e nas más.

Sua capacidade de exercer a concertação e de conseguir que cães, gatos e ratos dialoguem era extraordinária. Sua vocação era, certamente, a diplomacia e a boa política. Além disso, ele era um estudioso da história.

Suas contribuições para o movimento ambiental peruano foram enormes, promovendo precisamente a união e a harmonia entre os muitos e tão diferentes atores.

Carlos não era do campo, mas acompanhando Rudolf Hoffman em uma expedição ao rio Heath contribuiu para demonstrar que no Peru também há o lobo-guará e o cervo-do-pantanal.

Seus aportes aos esforços internacionais para as reservas da biosfera, corredores biológicos e unidades de conservação binacionais são muito reconhecidos.

PABLO SÁNCHEZ (2010†)

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Foi ele quem possibilitou cobrir de verdes pinheiros os Andes de Cajamarca graças a sua visão e empenho.

Pablo começou como um especialista em pastagens, tema que nunca mais abandonou. Mas ele percebeu a importância do reflorestamento para uma solução mais definitiva dos problemas andinos.

Ele dedicou sua vida ao reflorestamento e a uma gestão cuidadosa dos recursos naturais andinos, criando e dirigindo instituições, tendo inclusive tendo sido Reitor da Universidade Nacional de Cajamarca.

Uma de suas obras-primas foi Aylambo, onde em um espaço pequeno e com recursos modestos conseguiu demonstrar a viabilidade econômica e social do desenvolvimento sustentável, transformando teoria em prática evidente.

KENTON MILLER (2011†)

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Kenton, como Carlos Ponce, foi um dos meus amigos mais próximos e sua perda precoce me afetou muito.

Era o gringo mais latino-americano que conheci, e em todos os seus cargos sempre deu prioridade ao nosso continente.

Diretor Geral da UICN e Presidente da Comissão Mundial de Áreas Protegidas, ele foi o principal criador e promotor do planejamento de áreas protegidas no continente, desde os planos de manejo até o desenho dos sistemas e ordenamento territorial.

Kenton morou na Costa Rica e no Chile, onde deixou obras e discípulos, mas seu interesse pela natureza levou-o por todos os países do continente e do mundo.

Foi um homem do campo e explorador, tendo sido um dos primeiros a escalar o Tepui do Salto del Ángel, na Venezuela.

Os anos de 2013 e 2014 foram particularmente cruéis. A morte de 7 dos 11 amigos vieram apenas nesses dois anos.

Os últimos dias de dezembro se provaram fatídicos. Robert Goodland em 2013 e Antonio Brack deixaram-nos nos últimos dias de 2014.

PEDRO AGUILAR (2013†)

Pedro era menos conhecido do que outros nesta lista, mas ele, junto com Oscar Beingolea, também falecido, foi um dos principais promotores do controle biológico e do manejo integrado de pragas no Peru.

Professor durante cinco décadas, formou inúmeras vocações ambientais que já deram grandes frutos para o conhecimento e a conservação da natureza no Peru.

Além de professor, Pedro foi a pedra angular da institucionalização da Sociedade Entomológica do Peru e do sucesso de suas conferências anuais, e também ele, conseguiu elevar a Revista Peruana de Entomologia ao nível de qualidade internacional mais alto alcançado por uma revista científica peruana.

Pedro foi um dos personagens mais modestos, gentis e generosos que conheci.

PAULO VANZOLINI (2013†)

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Paulo era amigo da minha esposa. “Vanza” foi um dos zoólogos mais importantes do Brasil e seus trabalhos serviram de fundamento para o desenho das unidades de conservação da Amazônia brasileira.

Ele foi professor da Universidade de São Paulo ao longo de décadas.

Mas ele é muito mais conhecido no Brasil como músico, tendo escrito algumas das obras mais populares e importantes do país. E como é de se esperar, ele era um grande boêmio.

Ele foi o idealizador da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e foi colaborador do Museu de Zoologia da Universidade, que, com suas contribuições, aumentou a coleção de répteis de menos de 1.200 para mais de 230.000 exemplares.

ROBERT GOODLAND (2013†)

Ele foi o primeiro ecólogo do Banco Mundial e tornou-se, não sem grandes lutas, a consciência ambiental do Banco e no guia dos ambientalistas em outros bancos multilaterais.

Ele foi meu chefe no Banco Mundial e um muito bom amigo nosso.

Ninguém contribuiu mais do que ele para o desenvolvimento de metodologias de avaliação de impactos ambientais e sociais de todos os tipos de empreendimentos, especialmente de hidrelétricas e mineração.

Durante a sua permanência no Brasil, escreveu “Do Inferno Verde ao Deserto Vermelho”, um livro precursor da realidade de hoje. Ele também analisou os impactos do Projeto de Gás de Camisea, no Peru.

GERARDO BUDOWSKI (2014†)

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Possivelmente, o mais influente pensador e educador da área florestal do continente. Precursor do ambientalismo regional.

Por décadas ele foi professor e autoridade acadêmica na Costa Rica, no CATIE e na Universidade das Nações Unidas.

Ele, quando era Diretor Geral, abriu as portas da União Internacional para a Conservação da Natureza para os latino-americanos e para os assuntos da nossa região.

Ele foi um amigo querido, dotado de uma memória extraordinária, conhecedor de qualquer assunto e capaz de relatar mil e uma histórias que podia oferecer em sete línguas.

Visitou muitas vezes o Peru, um país que ele amava e ajudou muito a partir de seus diferentes cargos.

DAVID HARCHARIK (2014†)

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David teve a sua primeira experiência internacional na Universidade Nacional Agrária La Molina, e logo iria se tornar Subdiretor Geral da FAO para o Departamento Florestal, sempre apoiando as questões ambientais.

IBSEN DE GUSMÃO CÂMARA (2014†)

Ibsen foi vice-almirante da Marinha do Brasil e, simultaneamente, um dos principais estudiosos e defensores dos recursos naturais e do meio ambiente em seu país.

Ele publicou sobre temas de ecologia e foi também um grande especialista em mamíferos aquáticos, além de ser um paleontólogo destacado.

Minha esposa, Maria Tereza, e Ibsen eram grandes amigos e colaboradores por quase quatro décadas.

Ele foi promotor da criação de unidades de conservação marinhas no Brasil e participou ativamente da criação de parques e reservas na Amazônia e na Mata Atlântica.

O “Almirante Verde”, o mais civilizado dos militares que eu conheci, autor de centenas de livros e artigos, deixou uma enorme herança a seu país e ao mundo.

ANTONIO BRACK (2014†)

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O primeiro ministro do Meio Ambiente do Peru foi o último falecido nesta triste lista de amigos ambientalistas ilustres.

Nos uniam décadas de trabalho e de causas comuns, mas mais do que tudo, está a minha grande admiração por sua sabedoria e dedicação ao Peru.

Ele foi o maior educador e formador de consciência ambiental que o Peru teve, através de seus livros, seus programas de TV, suas aulas e palestras.

Foi também um grande cientista e ativista de causas ambientais, tendo contribuído para o estabelecimento de várias unidades de conservação.

E ele não era um teórico. Ninguém conhecia melhor a realidade biológica do Peru, centímetro por centímetro.

Nunca deixarei de sentir falta dos personagens desta lista. Eu sei que eles não são os únicos que merecem estar nela, mas estes foram os que eu melhor conhecia.

Eu só quero que eles sejam lembrados e que as suas contribuições sejam bem aproveitadas. Eles tiveram uma boa vida, já que todos fizeram o que gostavam de fazer. Satisfizeram suas curiosidades, viveram intensamente, e todos eles foram úteis à sociedade.

 

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