O pintor Nicolas Taunay está neste momento com uma exposição no Museu Nacional de Belas Artes e pelo menos três livros na praça, dois da historiadora Lilia Moritz Schwarcz, outro do bibliófilo e editor Pedro Corrêa do Lago. Correndo por fora, ele chegou ao bicentenário mais depressa que D. João. O príncipe levou 200 anos. Ele fez em 182, desde de seu desembarque no Rio de Janeiro, como um deserdado da França imperial de Napoleão Bonaparte.
Taunay ficou cinco anos aqui, sem desencarnar da politicagem acadêmica que veio de Paris na bagagem da Missão Francesa. Nem tentou aclimatar à cor local o olho estrangeiro que punha na paisagem carioca, pintando paisagens ao mesmo tempo documentais e distantes, como se visse o Brasil através do Atlântico. Voltou assim que pôde à Europa, sem levar saudades dos trópicos, embora deixando aqui um irmão e três filhos. O caçula, Adrien, morreu precocemente na Amazônia, afogando-se no rio Guaporé como desenhista da expedição científica do Barão de Langsdorff. Mas o sobrenome se enraizou para sempre no quem-é-quem da sociedade brasileira.
Florestas Virgens
Taunay morou no Alto da Boa Vista, onde na época cresciam os primeiros cafezais fluminenses e hoje fica o Parque Nacional da Tijuca. A vizinhança da floresta não mudou sua perspectiva. Para ele, a mata vinha em segundo plano. Quem a enxergou de perto pela primeira vez foi outro francês de passagem pelo Rio de Janeiro, o adido diplomático Claude François Fortier, Conde de Clarac.
Como o pintor Jean-Batiste Debret e o naturalista Auguste de Saint-Hilaire, que registrou a existência de “florestas virgens velhas como o mundo” nas portas do Rio de Janeiro, Clarac gravitava em torno do embaixador Charles de Montmorency, em cuja órbita organizou-se na prática uma segunda missão francesa. Clarac passou bem menos tempo no Brasil do que Taunay. Mas foi mais fundo do que ele nos trópicos. E, quando entra no livro “Taunay e o Brasil”, de Pedro Corrêa do Lago, rouba a cena – ou, pelo menos, quatro páginas decisivas do encontro das artes plásticas com a natureza brasileira.
Foi Clarac quem livrou a Mata Atlântica da camisa de força do paisagismo neoclássico, que tornava meio européia até a selva bruta. Ele não era um artista profissional, mas desenhava como se fosse e estava a poucos passos de assumir na vida pública o acervo do Louvre. Viera ao Brasil escolado pela fama de Alexander von Humboldt, que fazia na época a cabeça dos europeus cultos com seus diários de viagem pela América selvagem. Nada que se pudesse pendurar então numa parede ou botar numa página, segundo Humboldt, traduzia as impressões que ele levara da floresta tropical.
Foi a machado e fogo que tomou conta da Zona da Mata em Pernambuco, como continua fazendo até hoje, a monotonia do canavial nordestino, uma paisagem genuinamente colonial, “tão nossa”, como dizia Gilberto Freyre, que aparentemente sempre esteve ali. Faltou ao Nordeste um Clarac, quando ainda era tempo, para nos convencer de que o Brasil não era bem assim.
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