A caça ao javali, um porco selvagem europeu, ou seja, uma espécie exótica que também tem sido declarada praga, foi proibida este ano pelo IBAMA através da Instrução Normativa Nº 08 publicada no Diário Oficial da União em 17 de agosto de 2010. Esta Instrução, como se verá, é uma peça legal que passará à história como uma das mais contraditórias e absurdas jamais escritas sobre o tema. Sua aplicação implicaria, ademais de favorecer o javali, um verdadeiro caos na gestão da fauna no país.
Os javalis são considerados pela própria UICN (União Internacional de Conservação da Natureza) como uma das 100 espécies invasoras mais danosas ao meio ambiente. O javali compete ferozmente por nichos com caititu e queixadas, espécies nativas do Brasil. Existem dezenas de documentos técnicos que apontam a extraordinária capacidade do javali de exterminar essas e muitas outras espécies competidoras, de interferir em processos da sucessão de regeneração de matas, de causar danos a diversos tipos de cultivos, de depredar ninhos e destruir tocas, de contaminar nascentes difusas em áreas de várzeas, etc. O bicho realmente é endiabrado, mas não é só destruindo culturas e fragmentos de ambientes nativos que prejudica aos nossos ecossistemas e à nossa produção agropecuária, tem-se que frisar ainda que o javali possa ser importante vetor da peste suína clássica e da peste africana.
É evidente que o javali não é um perigo se a sua população é controlada ou devidamente manejada. Na Europa praticamente todos os países permitem a caçada de javalis e, no nosso continente, a caça é autorizada em todos os países que, como a Argentina, tem permitido a introdução do animal. No Brasil, devido às restrições de caça bem conhecidas, a população do javali tem alcançado números enormes em algumas áreas, com prejuízos significantes à agricultura. Até nos considerandos da dita Instrução lê-se: “Considerando ser o javali-europeu e seus híbridos animais exóticos invasores e nocivos às espécies silvestres nativas, aos seres humanos, ao meio ambiente, à agricultura, e à pecuária” e após todos os outros considerandos, a maioria sobre o embasamento legal e o possível mau trato na caça ao javali, resolve proibir tudo, sem dar as necessárias e urgentes exceções.
Com efeito, o Artigo 3 º da Instrução diz textualmente: “Ficam proibidos quaisquer atos de caça de espécies consideradas pragas, que afetem a agricultura, a flora nativa ou coloquem em risco a integridade humana, sem que estudos prévios e pesquisas assim o determinem”. O artigo não se restringe ao javali, mas atinge todas as espécies que são consideradas pragas. Além do mais a Instrução constitui um grupo de trabalho por exigir estudos prévios e se entende que este grupo de trabalho é quem determinará que classe de estudos prévios que será exigida, ou qual a sua profundidade.
O que é mais notável com relação à proibição do abate do javali europeu é que foi lavrada justamente por uma das autarquias governamentais federativas responsáveis pela adoção de medidas voltadas a cumprir a prerrogativa constitucional de garantir o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado. É difícil conceber que os setores técnico-jurídicos consultados e responsáveis pela elaboração da Instrução Normativa Nº 08 não se preocuparam com as implicações práticas da referida norma sobre o que resta de nossos fragmentos bióticos nativos, as populações de animais silvestres, os impactos em setores sócio-econômicos envolvidos. Tampouco parece que se preocuparam com questões inerentes à saúde pública e tudo o que é tutelado na norma constitucional pretensamente atendida.
Que país é este, afinal? É o mesmo que deixa extinguir espécies endêmicas ou ameaçadas de extinção, sem dó nem piedade, quando se trata de obras de hidroelétricas, estradas e mineração. |
Mas, o Artigo 3° merece um exame mais aprofundado. A sua primeira frase estabelece claramente “Ficam proibidos quaisquer atos de caça de espécies consideradas pragas, que afetem a agricultura, a flora nativa ou coloquem em risco a integridade humana”. Não há dúvidas, o problema do javali é secundário. Agora pergunto: quando vou poder matar um rato em casa, ou contribuir como cidadã para ajudar no controle do mosquito Aedes aegypti para combater a dengue? Como poderia comer uma simples folha de alface sem que o peso da co-responsabilidade pela morte de bilhões de indivíduos de centenas de espécies animais, que são mortas em nossa agricultura como pragas, dia após dia, ao se infringir a norma “legal”, curve sobre os meus ombros? O rato e o mosquito da dengue são, como o javali, espécies exóticas que são pragas e, a maior parte das pragas da agricultura são, horror dos horrores, espécies nativas.
Por isso torno a perguntar: quando o IBAMA vai fazer os estudos para que eu possa matar os ratos e baratas na minha casa? Já que o controle do Aedes aegypti fica proibido, como deveremos combater o mosquito da dengue para controlar a epidemia crescente? No setor agropecuário então a lista de implicações práticas nefastas se multiplica: Como farão os produtores rurais para controlar o bicudo do algodão? E os pulgões? E a mosca do chifre? Eu vou ter que correr o risco de morrer de febre maculosa por não poder controlar as infestações de carrapatos que volta e meia meus cães insistem em apresentar? O setor agropecuário é responsável por grande parte do PIB brasileiro e, se esta Instrução for mantida e aplicada, poderá acarretar em prejuízos severos para áreas econômicas, com reflexo social é claro, podendo até inviabilizar a competitividade do Brasil como grande exportador de produtos agropecuários.
Outra coisa: Como vão fazer as autoridades responsáveis para tipificar infração administrativa ou penal, de acordo com as normas vigentes, já que a caça a animais exóticos não é crime? Será que quem propôs isso sabe que não se é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão por força de Lei? A decisão de proibir a caça na forma como está na Instrução contradiz a Constituição, a Lei de Proteção a Fauna, a Lei de Crimes Ambientais e o Código Florestal. Se a intenção foi a de se coibir maus tratos, porque qualquer tipo de criação zootécnica não enfrenta o mesmo rigor? O que significa enfim, para as autoridades do IBAMA, maus tratos? Será que os maus tratos do javali ao homem não são mais importantes? Ou os maus tratos do javali a outras espécies nativas? Abate é mau trato? Se o é, o artigo que proíbe a caça de animais silvestres sem ou em desacordo com a autorização do órgão ambiental precisa ser revisto e a possibilidade de liberação da caça de um bem tutelado pelo órgão ambiental, não poderia ser prevista.
Diante de tanta firula e das enormes e importantes atribuições do IBAMA, dá para perguntar: porque alguns iluminados querem mais trabalho e chegar a esse nível de detalhe sobre matéria já dominada no Brasil e no mundo? Praga é praga, ainda mais quando se trata de uma espécie exótica e tem e deve ser combatida, quer seja um gafanhoto ou um javali. Será que o estrago bem conhecido do javali para agricultura e pecuária, e seus ataques também aos seres humanos, têm de ser pesquisados?
Que país é este, afinal? É o mesmo que deixa extinguir espécies endêmicas ou ameaçadas de extinção, sem dó nem piedade, quando se trata de obras de hidroelétricas, estradas, mineração, entre muitas outras; e que não tem pessoal nem recursos para implantar e fiscalizar as áreas protegidas, as áreas de preservação permanente ou combater os incêndios, o contrabando da fauna silvestre, entre muitas outras atividades ilegais, mas que para atender não sei que tipo de reclamos “pseudo-ambientalistas”, consegue gerar este monstrengo: a Instrução Normativa 08 de 17 de agosto de 2010.
Há uma enorme confusão e um sentimento de pena, quando o assunto é se abater animais, mesmo que sejam exóticos e pragas. Parece que comemos carnes de frangos, peixes, carneiros, porcos, camarões, entre outras, que milagrosamente não são de animais abatidos. O assunto do manejo de fauna silvestre sempre foi ignorado pelos políticos e autoridades responsáveis, porque não conseguiram passar à população em geral que muitas vezes, por vários motivos, tem-se mesmo de matar alguns animais de algumas espécies, mesmo que nativas, ou eliminar algumas espécies exóticas, em benefício das nativas. Todavia aqui entre nós, ou seja, no nosso país, o manejo de fauna, mesmo que científica e tecnicamente embasado, previsto na própria Constituição Federal, virou tabu, ou um dogma religioso, que ninguém tem a coragem de enfrentar.
Não é difícil de imaginar que os produtores rurais que não poderão matar ou caçar os javalis, logo poderão se unir e recorrer a sua vasta bancada para garantir novas leis mais permissivas no que diz respeito à ocupação de áreas antes destinadas à preservação permanente e à reserva legal. Isto porque a destruição de abrigos remanescentes poderá ser a única alternativa para minimizar as perdas causadas pela perigosa praga.
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A portaria está correta. Sim, são necessários estudos, por dois motivos. 1. Para demonstrar a magnitude dos danos (sim, existem muitos mitos sobre isso). 2. Para demonstrar que existem estratégias eficazes em reduzir os danos (sim, existem muitos mitos sobre isso também).
Não se trata de proteger as invasoras. Se trata de proteger a biodiversidade contra danos causados por estratégias mal delineadas, ineficazes e que geram mais custos que benefícios.
Hoje estamos vendo os resultado destas leis absurdas e infindáveis, pois infelizmente o interesse políticos são as propinas, as corrupções, são incapaz de enxergar o obvio.
A destruição da natureza e os enormes prejuízos causado a agricultura por essa praga que é o javali trazido da Europa, está nos causando, será que agora estão o que de fato estava diante do seu nariz dessa autoridade incompetente que está ai atuando no Brasil.