Análises

Predadores de topo e assassinos em massa

Os tubarões já foram os predadores de topo dos mares. Embora continuem temidos, hoje, somos nós humanos que ocupamos esta posição.

Fabio Olmos ·
20 de agosto de 2012 · 12 anos atrás
Tubarões azuis (Prionace glauca) sendo retalhados após capturados por um espinheleiro operando fora de Santa Catarina. A pilha de barbatanas (atrás) será preparada para secagem.
Tubarões azuis (Prionace glauca) sendo retalhados após capturados por um espinheleiro operando fora de Santa Catarina. A pilha de barbatanas (atrás) será preparada para secagem.

Cerca de 70 a 100 milhões de tubarões são mortos por ano e várias espécies estão desaparecendo rapidamente. Um gráfico publicado neste interessante blog de surfistas mostra a magnitude do declínio de espécies fantásticas como martelos, tigres e raposas.  Este holocausto é resultado da pesca com técnicas predatórias como espinhéis (que também matam albatrozes e tartarugas-marinhas) e redes de espera (que matam tudo) e é alimentado pelo mercado na China e sua diáspora que consome a famosa sopa de barbatana de tubarão, um símbolo de status. É mais um caso de como a necessidade de compensar alguma carência humana produz desastres.


Clique para ampliar

Extinções locais de tubarões são registradas em várias partes do mundo, do Pacífico Central ao Arquipélago de São Pedro e São Paulo, aqui no Brasil. Em um país civilizado, o Arquipélago de São Pedro e São Paulo deveria ter se tornado uma zona de exclusão de pesca faz tempo.

A pesca artesanal em Santa Catarina também destruiu o que poderia ser uma tremenda atração turística ao exterminar os tubarões-peregrinos que ali se reuniam.

Tubarões despertam paixões porquê além de lindos e fascinantes eles também podem matar. O que provoca um exemplo de como a percepção humana é enviesada. A construção de portos em áreas de manguezal, a sobrepesca e o lançamento de efluentes de matadouros alteraram a ecologia dos tubarões cabeça-chata e tigre no litoral de Pernambuco, as mesmas espécies que em lugares menos destruídos fazem a alegria dos mergulhadores e até têm página no Facebook.

De 1992 a 2012 foram registrados 55 ataques de tubarão no litoral pernambucano, com 20 mortos. Isso resultou em ações pedindo o extermínio dos bichos, devidamente repudiadas pela comunidade científica e exemplos interessantes de como a necessidade de compensar algo leva a comportamentos patéticos.

Enquanto que a cada ano os tubarões mataram uma média de uma pessoa entre as centenas de milhares (ou milhões ?) que frequentam as praias da Grande Recife, só em 2007 foram mortas 2.680 pessoas naquela região metropolitana. A capital pernambucana tem uma taxa atual de homicídios de 41,8 / 100 mil habitantes. Não é a carnificina de Maceió (79,8 / 100 mil), mas é um número absurdo em um mundo onde países civilizados e alguns nem tanto têm taxas menores que 5 / 100 mil.

É interessante como a baixíssima probabilidade de ser atacado por um tubarão desperta muito mais medo do que a probabilidade nada desprezível de ser morto por outro humano. Como turista, prefiro me arriscar dentro d’água.

  • Fabio Olmos

    Biólogo, doutor em zoologia, observador de aves e viajante com gosto pela relação entre ecologia, história, economia e antropologia.

Leia também

Reportagens
28 de outubro de 2024

COP16 ainda não viu a cor do dinheiro para proteger a biodiversidade mundial

Chefes de estado tentarão desatar os nós do financiamento, enquanto países investem 2% do orçamento anual em conservação

Reportagens
25 de outubro de 2024

Segundo turno em João Pessoa traz disputa entre candidatos de direita

Atual prefeito Cícero Lucena (PP) é favorito contra o ex-ministro Queiroga (PL); ele promete terminar obra de parque paralisada por problemas ambientais, e bolsonarista quer afrouxar legislação urbanística

Notícias
25 de outubro de 2024

Degradação florestal na Amazônia em 2024 é a maior dos últimos 15 anos

De acordo com números do SAD-Imazon, a degradação no bioma atingiu 26 mil km², o equivalente ao estado de Alagoas. Queimadas são responsáveis, diz instituto

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.