Estudos demonstram a intrínseca relação entre a disponibilização de serviços ambientais – tais como qualidade da água, fertilidade do solo, polinização e manutenção de microclima – e o potencial econômico de uma sociedade. Por isso, as Unidades de Conservação (UCs), desempenham um papel essencial, pois são as maiores responsáveis pela preservação e manutenção do nosso patrimônio natural. O Brasil, no entanto, tem investido pouco em suas UCs.
Em 18 de julho de 2000 o país assinou a Lei 9.9985, a lei do SNUC (Sistema Brasileiro de Unidades de Conservação), que regulamenta suas áreas protegidas, cerca de 17% do território nacional. Embora esse número pareça grande, um olhar mais profundo mostra que na prática a situação é diferente.
Temos hoje 313 UCs federais, protegendo pouco mais de 75 milhões de hectares. Porém, mais de 50% desse total são Unidades de Conservação de Uso Sustentável, ou seja, pertencem a categorias menos que permitem o uso dos recursos. Em um sistema de conservação, áreas protegidas de uso menos restritivo são essenciais, em especial quando funcionam como zonas de proteção em torno de Unidades de Conservação que não permitem qualquer tipo de uso além de visitação, educação ambiental e pesquisa, e que vão atuar como áreas fontes dos recursos.
Para que em longo prazo cumpram seu papel na conservação da biodiversidade, os dois grupos precisam ser bem manejados e adequadamente implementados. Atualmente, há uma enorme dificuldade nesse segmento. O orçamento do Ministério do Meio Ambiente é o segundo menor da União, e, em 2013, o orçamento destinado ao ICMBio, órgão que responde pela gestão das Unidades de Conservação federais foi de R$211 milhões, 0,012% do PIB Nacional, ou cerca de R$3,00 por cada hectare de área protegida. Uma fração do necessário.
O olhar por biomas
“(…)o Brasil pode atingir as Metas de Aishi, sem de fato ter Unidades de Conservação que protejam os 10% exigidos pela Convenção da Biodiversidade em cada bioma.” |
O Brasil é signatário da Convenção da Biodiversidade (CDB), que estipula que pelo menos 10% de cada bioma deve ser protegido por Unidades de Conservação. Também assinou as Metas de Aishi, que diz que o percentual a ser protegido por bioma é de 17%. Vale aqui um esclarecimento, pois enquanto que pela Convenção de Biodiversidade a porcentagem a ser protegida refere-se exclusivamente a Unidades de Conservação, para o segundo caso, das Metas de Aishi, a porcentagem seja maior abrange também outras formas de proteção, como Terras Indígenas, Áreas de Proteção Permanente, e até mesmo Reservas Legais.
Se analisarmos a Caatinga, Por exemplo, a constatação é de que há menos de 8% em áreas protegidas, das quais somente 2% se enquadram em categorias mais restritivas. Para o Bioma Marinho, esse valor não chega a 1,5%. Isso significa dizer que o Brasil pode atingir as Metas de Aishi, sem de fato ter Unidades de Conservação que protejam os 10% exigidos pela Convenção da Biodiversidade em cada bioma.
O atual governo foi o que menos criou áreas protegidas na história do País. Historicamente, a primeira Unidade de Conservação do Brasil foi o Parque Nacional do Itatiaia, criado em 1937, e dezenas de outras foram criadas nas décadas seguintes, em especial nos governos militares. Com a promulgação da Lei do SNUC, em 18 de julho de 2000, os governos seguintes, FHC e LULA, aceleraram e criaram mais de dois terços do que temos hoje em Unidades de Conservação federais: em torno de 25 milhões de hectares em cada uma das gestões. Esse bom desempenho, no entanto, sofreu uma abrupta estagnação no governo Dilma, que criou apenas 3 Unidades de Conservação, cobrindo ao todo apenas 44 mil hectares.
Sem apoio no Congresso
“Um dos projetos com consequências mais graves é o PL 3682/2012, que propõem a utilização de 10% das UCs de proteção integral pela mineração.” |
O enfraquecimento político do tema refletiu-se também no Legislativo. Atualmente há no Congresso Nacional uma divisão entre os setores ambientalista e ruralista, exacerbada a partir do Código Florestal. Embora a área ambiental busque um caminho do meio, em que a conservação seja incorporada ao desenvolvimento do país, os 162 deputados da bancada ruralista favorece o uso de territórios no país por setores como o de mineração e agropecuária.
Prova disso é a tramitação de centenas de Projetos de Lei na Câmara que impactam as Unidades de Conservação, sejam em áreas específicas ou, de forma generalizada, atacando a própria Lei do SNUC. Um dos projetos com consequências mais graves é o PL 3682/2012, que propõem a utilização de 10% das UCs de proteção integral pela mineração. Esse Projeto de Lei também subverte os objetivos do SNUC, ao propor que Unidades de Conservação sejam criadas apenas a partir de Projetos de Lei e não por Decretos, como hoje acontece, enquanto a desafetação ou recategorização seria feita por Decreto. Caso seja aprovado, o PL 3682/2012 é uma fragilização sem precedentes na legislação que resguarda as áreas protegidas.
Outro ponto de destaque é a regularização fundiária, questão essencial no fortalecimento e implementação das Unidades de Conservação nacionais, recebe pouca atenção e um orçamento menor ainda. Estima-se que dos 75 milhões de hectares das Unidades de Conservação federais certa de 7%, ou 5,44 milhões de hectares estejam ocupados. A verba necessária para regularizar esta área é de R$7,13 bilhões, 100 vezes mais do que os R$70 milhões que o governo investiu nos últimos anos. Se a quantia necessária parece grande, uma estimativa recente do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) diz que o Brasil perde todos os anos R$200 bilhões para a corrupção. Ou seja, menos de 4% do desvio anual dos cofres públicos seria o suficiente para resolver o problema que gera os maiores conflitos e descontentamento sobre as Unidades de Conservação.
Se quisermos ter nossas áreas naturais realmente protegidas, é necessário que o governo invista mais e reduza a burocracia dos processos de regularização. Enquanto isso, a sociedade brasileira precisa entender que sem conservação adequada dos ambientes naturais cenas como falta de água em grandes centros, desertificação de áreas agrícolas, escassez de chuva e empobrecimento do solo se tornarão cada vez mais corriqueiras.
De qualquer forma, feliz 14º aniversário, SNUC. Tomara que os próximos sejam melhores.
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