Conversando sobre parques com amigos estrangeiros e brasileiros com experiência fora do país, descobrimos a existência de uma ferramenta para monitoramento do uso público de parques: os eco-contadores. O sistema monitora o fluxo de visitantes e já está bastante difundido fora do Brasil. Ele é instalado nas trilhas e gera informações precisas sobre como são utilizadas. A partir daí, é possível pensar como diluir a quantidade de visitantes, saber qual trilha é mais utilizada, qual necessita maiores cuidados ou presença de guarda-parques, etc. Porém, nos parecia distante a possibilidade de ter acesso a essa tecnologia.
Com o início do Projeto de Fortalecimento do Uso Público no final de 2012, que contempla 12 unidades de conservação estaduais no Estado do Rio de Janeiro, idealizado pelo INEA (Instituto Estadual do Ambiente) e executado pelo ITPA (Instituto Terra de Preservação Ambiental), veio grande apoio para o desenvolvimento de atividades e ferramentas de gestão do uso público. Dentre elas, a implementação de projetos-piloto de eco-contadores.
A iniciativa era pioneira na América Latina e foi necessário selecionar os parques para participar do projeto-piloto. Os critérios de seleção incluíam a demanda de visitação nas trilhas, a proximidade com o Rio de Janeiro e a segurança dos equipamentos. Solicitou-se à equipe do Parque Estadual da Serra da Tiririca – PESET (localizado em Niterói e Maricá) a elaboração de um projeto que contemplasse 3 trilhas. Entre os aspectos a analisar no ambiente ao redor da trilha estavam a declividade e largura, tipo de solo, recepção de sinais GSM, presença de pedras ou outros obstáculos. O resultado do estudo foi enviado à empresa francesa Eco-compteur, fabricante dos equipamentos.
A empresa selecionou os eco-contadores mais adequados, entre sensores que medem a visitação via infravermelho, lousas acústicas enterradas no solo, ou que diferenciam pedestres de ciclistas.
Poucos meses depois dos primeiros contatos feitos pela equipe do Projeto Fortalecimento do Uso Público, já estávamos com os franceses no Brasil instalando o equipamento e mostrando como usá-lo. O negócio era ainda melhor do que pensávamos. Os sensores possuem autonomia energética de 10 anos e a transmissão de dados é feita diariamente utilizando a rede de celular. Além disso, o software que recebe os dados (via GSM) realiza análises e gera relatórios com gráficos personalizados para cada Unidade de Conservação. Estávamos prestes a entender melhor (24 horas por dia) o fluxo de visitantes da trilha onde iríamos instalar o equipamento, um salto na capacidade de gestão.
O equipamento instalado foi uma “lousa acústica” (Foto 1): sensor que fica enterrado no leito da trilha, invisível e sensível à variação da pressão exercida através de uma pisada de pelo menos 10 kg. O equipamento coleta e transmite dados sobre quantidade de visitantes, sentido da marcha (entrada e saída da trilha) e a hora de passagem por aquele ponto.
Após 5 meses de contagem, a primeira surpresa foi quanto ao número total de visitantes da trilha de acesso ao Alto Mourão. Antes, ele era contabilizado por estimativa, que gerou os seguintes números: 3.600 pessoas ao ano em 2010, 3.800 (2011) e 4.334 (2012). Com o eco-contador, descobrimos que o potencial das trilhas do parque é imensamente maior, pois em apenas 5 meses passaram nesta trilha 4.474 visitantes!
Os dados mostram a variação de visitantes durante os meses de inverno (temporada de montanha) – Figura 1.
Além disso, os dados mostraram que houve uma diferença razoável entre o número de visitantes que entraram e saíram (Figura 2), o que nos leva a crer que os visitantes utilizaram uma trilha que estava fechada para recuperação, devida à intensa erosão. É uma variante inclinada, escolhida parte dos usuários por que permite uma volta mais rápida do que a trilha normal.
Outra informação valiosa para a gestão é a distribuição dos usuários ao longo dos dias da semana (Figura 3). Há dados também da distribuição do uso ao longo do dia (Figura 4). Descobrimos que o pico de uso é no horário entre 8h e meio-dia. Do ponto de vista do gestor, a informação sugere, por exemplo, que os guarda-parques deveriam se concentrar em instruir os visitantes nesse período.
O software permite análises com corte específico, como feriados ou eventos, ou com situações particulares, como a visitação durante uma lua cheia (Figura 5). É possível observar a quantidade de pessoas por hora que sobem ou descem a trilha. Com esta informação é possível melhorar o controle sobre essas áreas, pois o ingresso nesta trilha não passa pela sede ou centro de visitantes do Parque (Figuras 5 e 6).
Hoje, após 5 meses da instalação dos eco-contadores no Parque Estadual da Serra da Tiririca, temos um perfil detalhado de utilização desta trilha. Os dados mostram o padrão de horário de utilização da trilha, fluxo de visitantes distribuídos nos dias da semana e a influência do clima sobre a visitação. Essas informações chegam diariamente, acessíveis por internet ou enviadas por email. Agora, podemos otimizar a atuação da equipe de guarda-parques, economizar recursos e melhorar o atendimento aos visitantes. Com precisão e discretamente.
Leia também
“Turbinando” o uso público nas UCs do Rio de Janeiro
Nossos parques nacionais vistos do espaço
Explorando o uso público em unidade de conservação
Planos de manejo de UCs III: hora de virar o jogo
ICMBio: cai diretor que apoiava abertura dos parques
Leia também
Quase 5 milhões de hectares de floresta na Amazônia já foram queimados em 2024
Números do INPE consideram áreas florestais onde ainda não houve a supressão total da vegetação. Bioma já acumula mais de 120 mil focos no ano →
Países emergentes podem contribuir com quase metade da meta de redução de CO2 no transporte global
Uso de biocombustíveis no Brasil e em outras nações em desenvolvimento pode evitar a emissão de quase 400 milhões de toneladas do gás de efeito estufa pelo setor até 2030, aponta relatório →
A insalubre, mas proveitosa, COP16 de Biodiversidade
É fundamental haver um esforço coordenado para garantir investimentos necessários para enfrentar a crise da biodiversidade (o que não foi alcançado nas negociações) →