Análises

Floresta em Pé: o modelo que nasce no Baixo Amazonas

Para gerar riqueza real, é preciso consumo. São necessárias estratégias ousadas de marca e produto, com identidade, canais de distribuição, rastreabilidade e logística

Décio Lima ·
22 de outubro de 2025

Há pouco mais de um ano, o imortal Ailton Krenak lançou um desafio: atuar nas regiões ribeirinhas e tornar o Sebrae o maestro-guardião das florestas brasileiras. “Nada seria mais revolucionário que transformar os ribeirinhos nos próprios fiscais e donos das matas e rios. São eles, os povos originários que podem manter a floresta em pé”, afirmou.

O que parecia uma utopia tornou-se realidade. Hoje, o visionário Krenak estava certo: uma verdadeira revolução floresce no Baixo Amazonas e será replicada em todo o Brasil. Um ecossistema vivo e pulsante – onde sustentabilidade e desenvolvimento caminham juntos – está gerando oportunidades, trabalho e renda.

Essa revolução silenciosa é o que o Brasil precisa conhecer. O mundo tem solução, e ela passa, inevitavelmente, pela educação sustentável, a única capaz de interromper o modelo econômico predatório que ainda domina o planeta. A “escola da floresta” ensina a manter as árvores em pé, o oxigênio fluindo e a vida resistindo à voracidade daqueles que só sabem acumular riqueza.

O desmatamento não tem origem apenas na ganância, expressa no garimpo ilegal, no avanço da soja, nas madeireiras ou no pasto para gado. Sua raiz mais profunda está na falta de alternativas econômicas para os milhões de brasileiros que vivem na Amazônia Legal. Faltava criar realidades produtivas que conciliem a preservação com o uso sustentável das riquezas desse Éden brasileiro.

A iniciativa pioneira do Sebrae começa como projeto-piloto em Santarém (PA) e se estenderá a outros biomas, respeitando as particularidades socioprodutivas e ecológicas de cada território.

A fase inicial envolve cerca de 150 agricultores familiares, abrangendo 15 mil hectares, dos quais 8,5 mil hectares estão sob manejo sustentável, sistemas agroflorestais e florestas conservadas. O apoio aos produtores inclui o mapeamento de cadeias produtivas, a capacitação e a criação de mecanismos para que tenham acesso direto à receita gerada pela venda de créditos de carbono. Parte desses recursos será reinvestida nas próprias comunidades, fortalecendo o ciclo de sustentabilidade e desenvolvimento local.

Esse modelo se estrutura na seguinte lógica: para que um medicamento seja desenvolvido a partir de uma planta da floresta, a nossa “árvore da vida”, é preciso primeiro ter acesso a essa planta. Entra em cena a comunidade local, organizada em cooperativas e associações, que coleta sementes, cultiva espécies e garante o uso sustentável dos recursos naturais.

Esse material é então trabalhado por pequenas empresas e startups, que, com ciência e tecnologia, a “árvore da ciência”, estudam os princípios ativos e os transformam em medicamentos, cosméticos ou alimentos. Aqui nasce a inovação, fruto da união entre o saber tradicional e o conhecimento científico.

Mas o ciclo não pode parar na coleta ou na bancada de pesquisa. Para gerar riqueza real, é preciso consumo. São necessárias estratégias ousadas de marca e produto, com identidade, canais de distribuição, rastreabilidade e logística. Assim, o produto ganha forma, propósito e chega ao mercado com o selo “Feito na Amazônia. Feito no Brasil”, um símbolo de origem, sustentabilidade e valor compartilhado.

Quando o consumidor escolhe um produto da floresta, produzido por uma startup amazônica, o ciclo da riqueza se completa. O valor pago remunera a pequena empresa, que, por sua vez, sustenta a cooperativa e a comunidade.

A verdadeira prosperidade da Amazônia – e do Brasil – só será alcançada quando essa equação se fechar: um ecossistema que se autoalimenta pelo local, pela cultura e pela força de quem vive na comunidade.

Dentro desses elementos estão a ciência, a sustentabilidade, a distribuição de riqueza e, acima de tudo, a manutenção daquilo que torna tudo possível: a floresta em pé.

Foto: Divulgação/Sebrae

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