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Novidades no Clima

Caiu a ficha. Muda a política do clima em toda parte. Sinais vêm dos EUA, da Europa e do grande capital. Resta saber se as medidas serão suficientes e virão no tempo certo.

16 de janeiro de 2007 · 17 anos atrás
  • Sérgio Abranches

    Mestre em Sociologia pela UnB e PhD em Ciência Política pela Universidade de Cornell

Quando começar a reunião do World Economic Forum, na estação suíça de Davos, no próximo dia 24, os grandes empresários e financistas que costumam freqüentá-la terão três surpresas. A primeira é que verão pouca neve em relação ao que estão acostumados. No início desta semana, por exemplo, só uma das estações de esqui de lá, tinha todas as suas pistas abertas. A segunda, é que encontrarão uma análise dos riscos globais mais precisa e focada. A terceira é que ouvirão falar em mudanças climáticas, aquecimento global e catástrofes naturais como nunca antes.

Ventos mais fortes começam a afetar o status quo da política do clima. A União Européia anunciou uma nova política energética, para reduzir unilateralmente em 20% as emissões de gases estufa até 2020. A Suécia foi além: decidiu praticamente zerar o uso de combustíveis fósseis no mesmo período. Do outro lado do Atlântico, enquanto a Agência Nacional de Oceanos e Atmosfera (NOAA) se tornava o primeiro órgão federal do EUA a reconhecer o aquecimento global e certificar que 2006 foi o ano mais quente da história, o Congresso, sob maioria democrata, começa a dar sinais concretos de que adotará legislação federal para controle de emissões. Vários projetos estão sendo apresentados. Diversas comissões, na Câmara e no Senado, convocarão audiências públicas. Em Davos, no final deste mês, o grande capital se cansará de ouvir relatórios sobre a mudança climática e a necessidade de mudar o paradigma global de uso de energia e recursos naturais. Caiu a ficha.

A Aposta Européia

Poucos imaginaram que a mudança de agenda começaria antes mesmo do início de seu mandato, quando Angela Merkel disse que, ao assumir a presidência rotativa da União Européia e do G-8, colocaria a política do clima no centro da agenda. Mas na quarta-feira passada, o português José Manoel Durão Barroso anunciou uma redução unilateral nas emissões de gases estufa, independentemente das negociações na Convenção do Clima e do que se decida para depois do Protocolo de Kyoto.

Embora os mais exigentes tenham achado a proposta européia ainda insuficiente, ela representa um avanço importante, principalmente de sinalização política. É um avanço razoável em relação à política hoje em vigor de redução dos níveis de emissões em 8%, em relação aos de 1990, no período 2008-2012, para os 15 membros. A nova política propõe uma redução de 20%, para os 27 países-membros da UE, com a ampliação de 2004, até 2020.

Mostrou que a Europa assumirá a liderança na política climática e fará pressão sobre Estados Unidos, Canadá, China e Índia. “Precisamos dos Estados Unidos conosco”, disse Durão Barroso ao anunciar a nova política, que segundo ele vai requerer uma nova revolução industrial. “Pessoalmente, acredito que os Estados Unidos vão mudar e se tornarão muito mais ambiciosos no futuro no que se refere à mudança climática”, concluiu.

No dia seguinte , ele se encontrou com o premiê japonês, Shinzo Abe e os dois advertiram os “grandes poluidores” – EUA, China e Índia – para que adotem medidas mais duras contra as emissões de gases estufa. O primeiro-ministro japonês disse que “é importante que todos os países façam seu melhor esforço para atingir as metas do Protocolo de Kyoto”. E adicionou: “após 2013, eu penso que é importante que tenhamos um marco efetivo para a redução dos gases geradores do aquecimento global que inclua países como o Estados Unidos, a China, a Índia, bem como outras economias emergentes” – leia-se Brasil, México e África do Sul.

Inglaterra quer mais mirando o Pós-Kyoto

A Inglaterra ainda prefere que a Europa adote meta de 30% e, provavelmente, irá propô-la na reunião de março, quando a proposta será examinada pela Comissão Européia. Mas o mais provável é que fique nos 20% anunciados, opção já referendada pela Alemanha, que assumirá a presidência nessa reunião.

Tudo indica que essa nova política é um ensaio da proposta Européia para o pós-Kyoto. Mas a diferença é que o que está sendo proposto ao Parlamento Europeu e à Comissão Européia é uma política unilateral, independente do que se negocie no contexto da Convenção do Clima e do que seja definido para vigorar após o fim do Protocolo de Kyoto, em 2012.

Medida gera Controvérsia sobre seu alcance

A maioria dos observadores considera as novas metas ousadas e desejáveis em relação ao status quo. Claude Mandil, diretor-executivo da Agência Internacional de Energia disse, em Paris, que considerava a proposta “ousada mas realista”. Há quem considere muito pouco. Jan Kowalzig, responsável pela campanha sobre o clima da ONG Amigos da Terra – Europa, disse que “as evidências científicas mostram que simplesmente não será suficiente para a União Européia reduzir as emissões de carbono em 20% até 2020 se quisermos evitar uma mudança climática catastrófica”.

Não só os ambientalistas mais exaltados falam em catástrofe. A própria União Européia acaba de divulgar relatório alertando para as dramáticas conseqüências da mudança climática em seu território, que “aprofundarão a brecha entre o Norte e o Sul da Europa”. O relatório diz que o aquecimento produzirá safras exuberantes no Norte, porém secas prolongadas terão graves efeitos sobre a economia do Sul, inclusive da Itália e da Espanha.

O presidente da Agência Alemã para Assuntos Marítimos e Hidrografia (BSH), Peter Ehers disse em Hamburgo que os efeitos do aquecimento global no Mar do Norte e no Báltico não poderiam mais ser evitados, apenas mitigados, se houver efetiva redução das emissões de dióxido de carbono. “Temos que examinar muito mais intensamente agora do que no passado quais são as conseqüências da mudança do clima nos mares, na navegação, no ambiente marítimo e nas costas”.

Suécia mais à frente

Algumas semanas antes, o primeiro-ministro da Suécia, Göran Persson, no lançamento da Comissão para a Independência em Petróleo, revelou a nova política do país que pretende aumentar sua eficiência energética em 20% até 2020, reduzir o uso de gasolina e diesel em toda a frota em 50% e o consumo de óleo combustível na indústria em 25%-40%. O consumo de óleo combustível para aquecimento, por exemplo, já caiu 70%, desde 1975. Começou a cair com a crise do petróleo e deu início a um processo de substituição que não parou nas décadas seguintes. Quase simultaneamente, a Islândia anunciou que pretende ser uma economia sem petróleo em 2050.

As metas suecas equivalem a transformar a sua economia numa economia sem petróleo no final do período. A matriz energética sueca, hoje, tem em torno de 40% de petróleo, praticamente 40% de renováveis e 20% de energia nuclear. A Suécia é importante importadora de álcool do Brasil, que responde por 80% do etanol consumido no país.

A Associação Mundial de Energia Nuclear comentou o plano sueco de uma maneira curiosa. Disse em nota oficial que o plano continha metas ambiciosas. A energia nuclear foi mencionada pela ministra do Meio Ambiente, diz a nota, para justificar porque a Suécia tem níveis históricos baixos de emissões, embora não haja sinal de como a nova política tratará o setor. “A energia nuclear é sensível demais, politicamente, para ser mencionada como uma fonte de suprimento futuro, considerando a coalizão controlada pelos Social-democratas, em aliança com a esquerda e os verdes”, conclui a nota, com toda franqueza.

Entre os ambientalistas há duas reações: uma parte acha que não é suficiente e que mesmo que a Europa cumpra essas novas metas, não dará para mitigar os riscos de mudança climática; outra parte acha que é um passo fundamental que fixa uma nova direção para a política do clima.

Os dois grupos têm razão. Não é suficiente, porque sem mudanças significativas no EUA e na China, principalmente, o esforço europeu seria insuficiente. Mas é um passo político muito importante, cujo alcance é maior que seu efeito ambiental. A mudança na dinâmica da política do clima é um pré-requisito para medidas mais ousadas. Essa nova atitude política européia certamente gerará pressão sobre os governos do EUA, da China, do Canadá, da Austrália, da Índia e do Brasil, que hoje lideram a atitude contrária.

Avanços e Polêmica nos Estados Unidos

Instalação do novo Congresso, de maioria democrata, mudou a dinâmica da discussão política sobre o clima no EUA. Só isso já é um avanço. Nas últimas duas semanas foram introduzidas inúmeras propostas criando novos marcos legais para a política federal de energia. Há projetos isolados, de grupos de deputados ou senadores democratas, e projetos bipartidários.

O mais emblemático deles é o apresentado pelos rivais John MacCain, senador republicano por Ohio, e Barack Obama, o senador democrata por Illinois, sucesso-instantâneo de público desde que chegou ao Senado. Os dois são apontados como presidenciáveis de seus partidos para a sucessão de Bush. Eles pretendem que seu projeto reduza as emissões do EUA em dois terços até meados do século. Também assinarão a proposta o senador democrata por Connecticut, Joe Lieberman – ele e MacCain propuseram legislação semelhante na legislatura passada rejeitada por Bush – a senadora Olympia Snowe, republicana pelo Maine e a senadora Blanche Lincoln, democrata do Arkansas, terra de Bill Clinton. Lincoln é uma “recém-convertida”. Ela votou duas vezes contra projetos similares e até mais moderados.

Não é a única, mas é a mais importante das proposições, exatamente porque já desenha uma coalizão que pode ser vitoriosa no Congresso e se impor a Bush, evitando que ele vete a legislação que venha, finalmente, a ser aprovada.

A proposta é tímida e insuficiente do ponto de vista climático. Mas do ponto de vista político, pode ser um “ponto de virada” que determinará uma nova trajetória para a política do clima no EUA. Nós politólogos temos um vasto banco de dados mostrando que em temas de grande resistência, como é o da energia, que tem poderosos e focados interesses do lado do status quo e interesses emergentes, também fortes, mas mais difusos, do lado da mudança, é preciso, antes de tudo haver uma fissura no paradigma das decisões políticas. No EUA isso significa aprovar a idéia de controle de emissão de gases estufa, introduzindo na agenda política o sistema de cota e crédito. Após essa ruptura, que permite a adoção da idéia, ainda que tão mitigada a ponto de ser inócua, as mudanças se sucedem com rapidez. O passo mais difícil é romper o bloqueio. E é isto que parece estar acontecendo no EUA.

Buscando o compromisso

O presidente da poderosa Comissão de Energia e Recursos Naturais, senador Jeff Bingaman (Democrata, Novo México), disse que seu compromisso é desenvolver uma proposta de lei bipartidária sobre mudança climática que seja capaz de ser aprovada ainda este ano. Para isso, se propõe a sintetizar todas as idéias em uma solução de compromisso que possa receber a aprovação do Congresso e desencorajar o veto de Bush.

Esse mesmo clima se observa na Câmara: muita discussão e iniciativa sobre o clima, propostas com distintos graus de exigências, todas, entretanto, propondo o que até agora era tabu econômico no EUA: controle compulsório de emissões de gases estufa.

A possibilidade de adoção de algum esquema de cota-e-crédito no EUA aumentou com uma outra ruptura recente. Pela primeira vez uma agência oficial do governo federal disse formalmente que um sistema de controle de emissões e comércio de créditos de carbono não desorganizaria a economia do país, desmentindo a opinião corrente na Casa Branca e entre os agentes do mercado. Respondendo a uma consulta de seis senadores dos dois partidos, a Administração de Informação em Energia (EIA) do Departamento de Energia, concluiu que um sistema nacional de cotas, regulado pelo governo, permitiria reduzir as emissões de gases estufa, sem prejuízo para o PIB do país. Aplicando a legislação em seus cenários energéticos, a EIA diz, que ela afetar a estrutura de preço de energia e, após um período de acomodação, produziria significativas mudanças nas decisões energéticas do mercado estadunidense, contribuindo para mudar a matriz energética do país.

Todas as palavras

Dentro em breve começará talvez a mais importante série de audiências públicas do Congresso do EUA sobre meio ambiente da história de Capitol Hill, desde os anos 60. Falarão os principais cientistas, as ONGs, os lobbies e os formadores de opinião. Até o ex-vice presidente Al Gore já foi convocado. No memorando sobre as audiências que pretende fazer, o deputado democrata por Michigan, John Dingell, diz que há uma ampla variedade de opiniões no tema da mudança climática e pretende que o Congresso “ouça todo o espectro de visões”. Ele é, hoje, o mais sênior congressista dos Estados Unidos, com maior número de mandatos. E isto lhe dá enorme influência.

Analistas “off-Hil”, como são conhecidos na imprensa de Washington os analistas da cena parlamentar que não operam no Congresso, para lobistas, partidos ou ONGs, avaliam como “muito boas” as chances de aprovação de uma lei para combater a mudança climática. Imaginam que na primavera as decisões comecem a tomar forma, embora o processo decisório possa se prolongar até o verão.

Duas outras questões criarão muita controvérsia no Congresso e na sociedade no Estados Unidos: o aumento dos padrões de economia de combustível (CAFE – Corporate Average Fuel Economy), que tem sofrido violenta oposição da indústria automobilística, e as tecnologias carvão-para-líquido (coal-to-liquid), de produção combustíveis líquidos a partir de carvão, muito condenada pelos ambientalistas.

Mudança de padrão

Vários senadores e deputados estão trabalhando propostas para elevar a CAFE, os padrões de economia de combustível da indústria automobilística. Está em preparação no senado uma proposta bipartidária nesse sentido, inspirada em um projeto também, apresentado no ano passado e que não chegou a ser votado pelo Congresso então dominado pelos republicanos. Essa medida tem o apoio de setores mais conservadores no EUA, mais preocupados com a segurança nacional no campo energético, que desejam maior eficiência de uso para, juntamente com o incremento da produção doméstica de combustíveis, eliminar a dependência à energia importada. Até recentemente, a preocupação com a segurança energética foi usada por Bush e vários grupos de interesses contra a política do clima. Agora, vários setores estão descobrindo que as duas podem ser atendidas com as mesmas medidas.

Essa preocupação também está por trás da outra questão, da produção de combustíveis líquidos a partir do carvão. Os ambientalistas detestam a idéia, dizendo que ela é intensiva em energia e, ao invés de reduzir, pode dobrar as emissões no EUA. Mas há quem diga o contrário.

Carvão líquido

A liquefação de carvão, em si, nada tem de novo. O processo mais comum, “Fischer-Tropsch”, foi estabelecido por Franz Fischer e Hans Tropsch, em 1923 e usado pela Alemanha e pelo Japão na Segunda Guerra, para produzir combustível. A África do Sul produz 30% de seus combustíveis por esse processo. Novidade é transformá-lo numa fonte limpa e de baixa emissão de carbono.

Em um seminário na universidade de West Virginia, no ano passado, Richard Bajura, do Centro Nacional de Pesquisa em Carvão e Energia e Edward Ehring da Universidade de Utah, defenderam tecnicamente a alternativa de carvão-para-líquido, dizendo que as tecnologias de “poligeração” permitem gerar combustíveis líquidos, eletricidade e hidrogênio e podem ser suficientemente limpas e eficientes para atender a metas exigentes de eficiência energética e ambiental.

Em uma audiência pública, no ano passado, David Hawkins, diretor do Centro do Clima do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais, uma ativa ONG ambiental do EUA, propôs a busca de soluções conjuntas para os dois principais problemas do país no campo da energia: dependência a fontes estrangeiras de suprimento e aquecimento global. Mas condenou o uso de líquidos de carvão, como resposta. Essa alternativa, segundo ele, exacerbaria os problemas de aquecimento global, poluição convencional do ar e os impactos ambientais da produção e do transporte de carvão.

Já há setores do mercado de venture-capital em busca de alternativas tecnológicas para a via “limpa” de carvão para combustíveis líquidos. Eles consideram que o único obstáculo à transformação desse setor em um “setor de crescimento” para os próximos anos é o tecnológico. O outro, preço do combustível, eles descartam, porque apostam numa mudança significativa na estrutura de preços, por causa da regulação de emissões, que certamente será adotada no futuro breve, e da possibilidade de um imposto sobre o carbono. Isso viabilizará o preço de alternativas hoje mais caras que as derivadas do petróleo e do carvão convencionalmente utilizado.

Artigo publicado em dezembro pela Nature, apresenta um caminho novo e aparentemente promissor que é a associação entre seqüestro de carbono e mistura de biomassa ao carvão na produção de combustíveis líquidos. O pesquisador do Instituto Ambiental de Princeton, Robert Williams, disse à reportagem da Nature que pelos seus cálculos, uma mistura de 89% de carvão e 11% de biomassa poderia reduzir as emissões de carbono em 19%, em relação aos processos convencionais. O resto pode ser seqüestrado e estocado ou reutilizado.

Não sei dizer se existe, hoje, um caminho limpo para liquefazer carvão. Não cheguei a consultar fontes científicas e técnicas que me deixassem seguro a respeito. Mas sei dizer, com certeza, que o impulso político dessa via carvão-para-líquido é forte demais para ser desprezado. Essa é uma alternativa que se tornará foco privilegiado de políticas federais e estaduais no curto prazo no EUA.

A poderosa Comissão de Energia dos Estados do Sul, formada por governadores e parlamentares de 16 estados e dois territórios, acaba de divulgar estudo no qual propõe a completa independência energética do país até 2030 e a resposta para esse desafio existe, diz: “combustíveis alternativos de usinas carvão-para-líquido e de biomassa e de empresas de óleo de xisto”. A Associação dos Governadores do Oeste, emitiu uma decisão na qual propõe políticas de alternativa de energia, com especial atenção para o etanol, o hidrogênio e o carvão-para-líquido.

No novo Congresso, formou-se um “caucus”, uma coalizão bipartidária, com vários senadores e deputados influentes, entre eles o democrata Barack Obama, o influente republicano do Kentucky, Jim Bunning, o presidente da Comissão de Recursos Naturais da Câmara, o democrata por West Virginia, Nick Rahall. A proposta de uma lei de promoção dos combustíveis carvão-para-líquido já foi apresentada no Senado, patrocinada por uma dezena de senadores. Não adianta lutar contra essa alternativa. O carvão é a maior reserva de energia do EUA e da China. Ou ele será usado “limpo”, ou continuará a ser usado como hoje e comprometerá a maior parte dos esforços de redução dos gases estufa do mundo. O único caminho realista é o desenvolvimento de tecnologias de “limpeza” do carvão e de seqüestro e reuso das emissões.

Entra o Grande Capital

Por isso, ao chegarem a Davos para o World Economic Forum, os grandes empresários e encontrarão menos neve e mais calor. O calor estará presente também na análise dos riscos globais muito mais precisa e bem feita que a dos relatórios anteriores. É a primeira, na minha opinião, a refletir inteiramente a entrada em cena das metodologias de análise de risco do Centro de Gestão de Risco e Processos Decisórios da Wharton School. E ouvirão falar em mudanças climáticas, aquecimento global e catástrofes naturais como nunca antes.

É que a ficha caiu. Hoje, não existe um centro de análise estratégica ou de risco que adote visão estritamente técnica que não inclua a mudança climática como o risco definidor dos rumos do século XXI. É assim que o relatório do World Economic Forum está caracterizando o risco de mudança do clima: “a mudança climática é agora vista como um dos desafios definidores do século 21 – e como um risco global com impactos muito além do meio ambiente. A mitigação efetiva da mudança climática, pode ter, em última instância, a conseqüência de melhorar a resiliência dos países desenvolvidos aos choques de preços do petróleo ao fazê-los mudar dos hidrocarbonos para fontes alternativas de energia; mitigação ineficaz da mudança climática será quase certamente um fator de conflitos violentos significativos entre estados e de guerras civis, nos próximos 50 anos. A forma pela qual se lidará com a mudança climática no plano global será um indicador principal da capacidade do mundo para administrar a globalização de uma forma eqüitativa e sustentável”. O relatório diz, ainda, que aumentou o consenso sobre o lado negativo da mudança climática e a consciência de que a situação é bem pior do que imaginavam no ano passado.

Por razões semelhantes, a Exxon organizou um encontro com representantes de ONGs ambientalistas, incluindo o Worldwatch Institute, o Interfaith Center on Corporate Responsibility e o US Climate Action Network, para discutir, em Virginia, questões relativas à mudança climática e aos direitos humanos. A empresa está preparando, também, um encontro de empresas que operam no EUA – em torno de 20 – para discutir opções de políticas para reduzir as emissões de efeito estufa no país. Gary Cook, diretor da ONG US Climate Action Network, disse que a Exxon deve ter visto que a adoção de controles de emissões está ficando iminente. O pesquisador do Greenpeace em Washington Kert Davies, é mais afirmativo: “estamos ganhando”, diz ele, embora não esteja seguro de que a Exxon, histórica oponente de qualquer política de controle de emissões esteja mesmo mudando de opinião. Pode não estar.

Como a Exxon acompanha de forma competente o risco político, doméstica e globalmente, eu diria que ela já sabe que o vento está soprando contra e que terá que mudar. Deve ter sentido os novos ventos em Washington e já os havia sentido antes na Europa. Sua estratégia, agora, quase certamente, será de gestão de risco. Atuará politicamente, para evitar as piores alternativas, no curto prazo e, corporativamente, para mudar suas estratégias de negócios, para adaptá-las ao novo ambiente regulatório que virá.

Anos de análise política me permitem a ousadia de espetar o dedo para cima e dizer, com convicção, que os ventos estão mesmo mudando. Os sinais são tênues ainda, mas já dá para vê-los e sentí-los. Acompanhando de forma razoavelmente sistemática a política do clima nos últimos dois anos, vi como a sua dinâmica mudou. Mudou a posição do tema na pauta da imprensa diária. Mudou o grau de firmeza dos cientistas a respeito da presença real e iminente do risco climático e de sua correlação com a ação humana. Mudou a análise de risco estratégico das principais empresas do mundo. Aumentou a intensidade da preocupação da opinião pública, mundialmente, com o clima. Começa a se alterar a correlação política de forças em relação à política do clima.

Daqui em diante teremos notícias, quase semanalmente, de novas mudanças e os períodos em que veremos novas rupturas vão se encurtar. A questão agora é saber se haverá mudança suficiente, no tempo necessário. Não se discute mais a probabilidade da mudança.

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