extinção: com vinte milhões de anos de vida sobre a terra, o homem atingiu a civilização apenas nos últimos dez mil. Uma civilização, uma cultura, uma capacidade de domínio e apropriação das forças e mistérios da natureza de que nenhum animal jamais se aproximou. Com isso – vinte milhões de anos de vida, mas apenas dez mil de civilização – é o único animal que tornou possível uma coisa antes inacreditável – sua auto-destruição como espécie. Dando ainda, de lambuja, a destruição de todas as outras. Nada indica que o homem consiga escapar de sua própria fúria e estupidez nos próximos dez, cem ou, no máximo, mil anos.
Millôr Definitivo – A Bíblia do Caos, Millôr Fernandes
Millôr talvez seja um profeta ou, simplesmente um homem que vê as coisas como elas são. Não é difícil perceber que estamos cada vez mais próximos de cumprir sua profecia. Basta ler o noticiário sobre avanços tecnológicos e científicos. A maioria, hoje, tem a ver com trabalhos ou pesquisas que pretendem corrigir erros do passado, defender o homem de sua própria história.
Navegando pela Internet, encontrei uma reportagem sobre um novo tipo de casa, desenvolvida por engenheiros alemães e cujo principal atributo está na sua capacidade de resistir a catástrofes naturais. O tom do texto é laudatório, como se estivesse comemorando a subida de mais um degrau do processo da “evolução” humana. A tal casa espacial é uma maravilha tecnológica. Coisa de dar inveja aos Jetsons, que aparentemente serviram como inspiração para os cientistas.
A casa tem uma forma esférica, é construída com material de nave espacial e foi projetada para resistir a qualquer bordoada da natureza, como por exemplo, ventos de mais de 200 quilômetros por hora e enchentes de até três metros. O projeto teve a participação ativa da indústria de seguros alemã. Foi ela quem deu aos seus criadores os parâmetros de engenharia de uma casa que seus corretores aceitariam segurar sem se preocupar com o risco de algum dia, por conta de uma chuva mais forte, ou um tsunami, ter que pagar uma apólice.
Se esse projeto de moradia blindada é sinal de evolução tecnológica, eu certamente sou de uma espécie que não pretende evoluir e seguirei em busca do inverso. O projeto casa espacial me assusta. É fruto de uma ilusão que nos faz acreditar que temos a capacidade de nos tornarmos indestrutíveis. Sempre correndo atrás do rabo e cada vez com mais pressa. Parece ser mais fácil evitar as conseqüências de um comportamento ruinoso do que mudá-lo.
Como bem descreveu Millôr, “nada indica que o homem consiga escapar de sua própria fúria e estupidez nos próximos dez, cem ou, no máximo mil anos”.
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