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Voar é uma habilidade muito preciosa para ser gasta com luzes artificiais

Se o falso brilho das luzes artificiais exige a devoção das mariposas iludidas, a ciência exige apenas dedicação e vontade, que abramos nossas asas e voemos sem amarras

10 de março de 2019 · 6 anos atrás
  • Reuber Brandão

    Professor de Manejo de Fauna e de Áreas Silvestres na Universidade de Brasília. Membro da Rede de Especialistas em Conservaçã...

Foto: ReneCiampaArt/Pixabay.

Me interessa muito as mariposas. Mesmo dotadas de asas de beleza estupenda, capazes de voarem em busca da lua e das estrelas, ficam deslumbradas e ofuscadas por luzes artificiais. Ao invés de se lançarem em longos voos rumo ao céu, se atabalhoam ao redor de luzes artificiais, até que percam sua energia, sua beleza e caiam perplexas e perdidas no solo.

Ao invés de buscarem luzes verdadeiras e perenes, se enganam com o brilho falso das fontes artificiais de brilho e luminosidade. Perdem seu tempo que chocando contra superfícies que não são naturais ou perenes.

Alucinadas com os neons da mediocridade, as mariposas se voltam contra as mariposas livres, que alçam voo em direção aos céus. Desdenham das estrelas pois, para estas, os postes e luminárias estão ao alcance de um bater de asas rápido e superficial, iludidas pela relativa proximidade das luzes artificiais.

É impressionante observar a quantidade de mariposas perdidas e enganadas, que pululam ao redor de falso brilhantismo, de falsa luminosidade, de falsos faróis, num afã trôpego e sôfrego, de alcançar alguma luz que disfarce a insegurança diante da grandiosidade do céu e da força inexorável da natureza e da vida. Rebanhos de mariposas. Multidões de mariposas.

Essas mariposas, pasmadas e apresadas pela falsa luz, se tornam incapazes de usarem suas lindas asas para voarem além. Já não enxergam a verdade, já não podem escapar da pretensão mesquinha das falsas luzes em brilharem mais que as estrelas. Nunca conhecerão o propósito de suas vidas, ou o brilho e o poder de suas asas, pois se engalfinham por migalhas de luzes falsas que nunca serão mais poderosas que as luzes da Natureza. Nesse tropeço, perderão a grandiosidade do céu, enquanto invejam, criticam ou ignoram as mariposas que usam as asas para investigarem o além, para ganharem os horizontes, para irem além da farsa, para pensarem com independência. Perseguem fantasmas, se iludem com fantasias, enquanto fantasiam presas no nada.

“Fatos científicos não deixam de existir quando deixamos de acreditar neles. Se o falso brilho das luzes artificiais exige a devoção das mariposas iludidas, a ciência exige apenas dedicação e vontade, que abramos nossas asas e voemos sem amarras”.

Infelizmente não percebem a vacuidade do brilho precário das luzes de ocasião. Embasbacadas, engrossam a geleia geral que pensa ser a terra plana, que vacinas causam autismo, que evolução não existe, que nazismo é de esquerda, que universidades são antros de doutrinação e de imoralidade, que a posição relativa dos planetas no momento do seu nascimento irá determinar sua vida, que a água tem memória, que mudanças climáticas não existem, que a conservação da natureza é inimiga do desenvolvimento econômico, que dinossauros morreram no dilúvio enquanto toda fauna do planeta (incluindo carrapatos e mosquitos vetores) flutuavam numa arca ou, ainda, que fetos abortados são usados para adoçar refrigerantes.

No entanto, a luz verdadeira existe. Ela se chama Ciência. É a única luz de brilho real e cristalino. Fatos científicos não deixam de existir quando deixamos de acreditar neles. Se o falso brilho das luzes artificiais exige a devoção das mariposas iludidas, a ciência exige apenas dedicação e vontade, que abramos nossas asas e voemos sem amarras.

É o entendimento sólido da realidade que deve nortear a vida. Ciência (e por consequência, a natureza) não é de esquerda ou de direita, hétero ou homo, crédula ou ateia. A ciência é simplesmente (e completamente) ciência. A ciência busca entender a essência da realidade da natureza, enquanto a falsidade busca que ignoremos a realidade. A ciência liberta, a falsidade aprisiona.

É a cegueira da falsidade que cria os ataques à verdade. Os ataques às universidades, os ataques à ciência, os ataques à conservação da natureza, à educação, à criatividade, à liberdade de pensamento, nada mais são que sintomas dessa cegueira estúpida e destrutiva, que irá, em última instância, transformar a sociedade em uma massa de mariposas moribundas e miseráveis, prostradas aos pés de um poste de luz, já apagado sob a luz do sol.

“É a ciência que mostra que, sem natureza, não haverá nada. Que não conservar a natureza é o maior ato de estupidez da existência humana.”

Os que tentam desmerecer aqueles que abrem suas asas ao conhecimento se nutrem dessa cegueira. Infelizmente, ofuscados pela falsa luz, se tornam incapazes de vislumbrar a luz das estrelas. Porém, devotos cegos, atacam os que ousam usar asas e olhos para aprender, para criar, para ensinar e para dotar novas gerações das ferramentas que às levarão além.

Não podemos esquecer que é a ciência que permite pensar o presente e planejar o amanhã, num mundo cada dia mais complexo e repleto de desafios. É a ciência que mostra que, sem natureza, não haverá nada. Que não conservar a natureza é o maior ato de estupidez da existência humana. Em todas dimensões de estupidez.

Por isso, apesar da idiotia, da estupidez, da eloquência e da violência das milhares de mariposas iludidas, não podemos ter vergonha em saber. Não podemos ter vergonha em querermos voar além, de usarmos as ferramentas que a evolução nos deu. Caso a ignorância da busca pelo falso brilho acabe transformando tudo em escombros, caberá aos cientistas o resgate de nossa humanidade e à natureza, a nossa salvação.

 

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Comentários 15

  1. Carlos Sá Ganem diz:

    Lógico que falta lógica no seu discurso. Tranquillo, resolução cega faz parte.


  2. Ói procê vê diz:

    Onde o autor afirma acreditar em comunismo ou socialismo? Acho que você não consegue enxergar além do que querem que você veja…


  3. Fábio Hepp diz:

    Muito bom! Nada como um pouco de divulgação científica sobre a própria nobreza da ciência para trazer luz natural para cômodos tão escuros e pesados dos momentos atuais. Feliz em saber que temos pessoas tão qualificadas e interessadas nesta missão que, por vezes, soa como impossível. Parabéns pelo texto!


  4. Reuber diz:

    Certamente o declínio de insetos é razão de grande preocupação, especialmente devido ao impacto que possuem na dinâmica dos ecossistemas. Receber um elogio seu é razão de grande satisfação. Muito obrigado Marc!


  5. Marc J Dourojeanni diz:

    Gostei muito da nota. Parte de um fato corriqueiro para chegar a conclusões e recomendações sobre um tema fundamental.
    De outra parte, voltando as "coisas" cientìficas, a grande luminosidade noturna em todo o planeta pode ser outra das causas da confirmada desaparição de espécies de insetos voadores e, em especial, da redução das suas populações. Interessante!


  6. José pombal diz:

    Como esperado, ótimo texto. Parabéns!


  7. Everardo diz:

    O cara vem falar de ignorância, liberdade, etc e defende o socialismo sem corar o rosto. E ainda por cima com um ar de intelectual com um texto aparentemente rebuscado. É melhor fingir de doido no Brasil mesmo pra viver…
    E quem vier me encher o saco já aviso: não perca seu tempo, estou cagando e andando pra mimimi alheio.


  8. Michelle diz:

    Falar que universidades não são
    antros de doutrinação só poderia ter vindo de um professor de universidade mesmo, usando de inocência (o que duvido) ou má fé.


    1. Ói procê vê diz:

      Não beba refrigerante. Seu guru intelectual afirmou serem adoçados com células de fetos humanos.


  9. Cynthia diz:

    Texto iluminado, Reuber! Parabéns!


  10. Mariana Damasco diz:

    Que as mariposas livres inspirem cada dia mais as mariposas que ainda não tiveram a oportunidade de enxergar além do poste de luz 🌟


    1. Reuber diz:

      ❤ Saudades! Bom te ver aqui!


  11. Michelle diz:

    E eu reclamando dos textos do Cláudio Ângelo achando que não podia piorar. Fui inocente…


    1. Leonardo diz:

      inocente como as mariposas


  12. Alberto diz:

    Coloque tudo no mesmo balaio no "texto" e pronto! Parece que todas as coisas são sérias. Por exemplo, se eu criticar questão controversa como a ideologia do nazismo estou automaticamente no grupo de quem acredita na besteira da terra plana. Fora que ele foi sutil como um elefante pra criticar tudo que não gosta. E quem disse que as universidades não são antro de doutrinação?
    Pra piorar, o autor fala de estupidez e ignorância e acredita no socialismo/comunismo. Mas vindo de um professor de universidade federal não da pra esperar outra coisa.
    Como diria o Barão de Itararé: "De onde menos se espera é de onde não sai nada mesmo."
    Agora é só esperar o antro de esquerdistas comentaristas do Eco virem encher o saco…
    P.S. Ainda bem que esse cidadão saiu do Ibama em 2006, poderia estar fazendo estrago lá até hoje.