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Após pressão, Pacheco adia votação de projeto que regulariza a grilagem de terras

Senadores não tiveram acesso ao relatório de Carlos Fávaro e nem a todas as 98 emendas feitas ao texto. Representantes do agronegócio, ambientalistas e famosos protestam nas redes contra PL

Duda Menegassi ·
28 de abril de 2021 · 4 anos atrás

Após colocar o Projeto de Lei nº 510/2021 sorrateiramente na ordem do dia, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), cedeu à pressão de parlamentares e da sociedade civil e tirou a votação do projeto de lei da pauta do Senado nesta quarta-feira (28). O projeto de autoria do senador Irajá Silvestre (PSD-TO), batizado de PL da Grilagem, amplia a anistia aos invasores de terras públicas e às infrações ambientais, e herda a polêmica discussão da sua antecessora, a Medida Provisória 910 – de quem recicla boa parte do texto –, que caducou no último ano na Câmara dos Deputados. O PL será pauta de audiência pública nesta quinta-feira (29) na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). A expectativa é de que o tema possa ser debatido com maior profundidade entre os parlamentares e possa ser construído um acordo acerca das 98 emendas que o texto original do projeto já recebeu, para que o PL vá para votação dentro das próximas semanas.

A maioria dos senadores, assim como as organizações ambientais, foram pegas de surpresa quando na noite de ontem veio a notícia de que Pacheco havia pautado a votação do polêmico PL para a sessão virtual desta quarta-feira. A ausência de debates prévios, a não disponibilidade de todas as 98 emendas (até a noite de ontem havia apenas 53 emendas disponibilizadas no site do Senado) e do próprio texto do relator Carlos Fávaro (PSD-MT), assim como a falta de tempo para aprofundar a leitura da matéria e a complexidade do tema, foram os principais argumentos dos senadores que solicitaram a retirada do projeto de pauta. 

“Nós pedimos que esse projeto não fosse colocado na ordem do dia, sem que necessariamente antes passasse pelas comissões, especificamente as de agricultura e meio ambiente. Ontem, eu fui surpreendida, assim como demais colegas de parlamento e várias autoridades da área ambiental, de que o projeto estava na pauta do dia. Nem mesmo o conhecimento do substitutivo [texto final do relator, com as emendas] nós tínhamos até hoje pela manhã. Então imaginem, um projeto dessa magnitude, a gente não ter tempo de ter uma leitura mais aprofundada e ao mesmo tempo não propor as alterações, não passar pelas comissões, não ter audiência pública, traz um resultado muito danoso para o Brasil”, pontuou a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), uma das seis que se manifestou pela retirada do PL 510 da pauta. Eliziane reforçou ainda o pedido de que neste período de pandemia e diante da limitação das sessões remotas do Senado, a casa se concentre em votar as ações relacionadas com a Covid-19.

“Nós estamos discutindo aqui sem sequer conhecer o relatório do relator Carlos Fávaro”, ressaltou o senador Jaques Wagner (PT-BA). “Nós já vamos para a terceira lei de regularização. Em cada uma, o perdão daqueles que eventualmente ocuparam terras públicas vai se estendendo, era 2008, 2011, 2014… Eu não consigo entender, algo que é tão necessário, por que fazê-lo de afogadilho?”, questionou o senador baiano.

O único que pediu para que o projeto se mantivesse na ordem do dia foi o senador Marcos Rogério (DEM-RO).

Após o anúncio de Pacheco de que acataria a manifestação majoritária dos parlamentares e tiraria o PL da pauta, o relator do projeto, Carlos Fávaro (PSD-MT), se pronunciou em defesa do projeto de lei que, em sua opinião, não possui “uma única frase que precarize o meio ambiente”.

Além do PL 510, também saiu de pauta o item número dois na ordem do dia do Senado: o projeto de lei nº 6.539/2019, que atualiza a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), instituída por lei em 2009, em função do compromisso brasileiro assumido no Acordo de Paris em 2015.

Pressão nas redes

“@Anitta: Atenção para a boiada da grilagem! O senador Rodrigo Pacheco quer colocar o PL 510 em votação hoje, na surdina! Hoje, às 14h, vamos todos marcar o @rpsenador e o @Carloshbfavaro e reforçar que #@GrilagemÉCrime e #PL510Não! Não podemos deixar esse trator passar!”, tuitou Anitta.

O anúncio de que o PL 510 poderia ser votado nesta quarta-feira (28) mobilizou as redes sociais desde a noite de ontem com as hashtags “GrilagemNão” e “PL510Não”. que chegou a ocupar a lista dos assuntos mais comentados no Twitter na tarde desta quarta. As publicações contrárias à votação do PL foram desde organizações socioambientais a celebridades, como a cantora Anitta, e até o próprio agronegócio.

A Coalizão Brasil, Florestas e Agricultura, movimento formado por mais de 280 representantes do agronegócio e dos setores financeiro, industrial e academia, enviou ao Senado uma carta na qual aponta que o PL representa uma ameaça às florestas públicas e às populações tradicionais da Amazônia brasileira. “Essa lógica de constante flexibilização do marco temporal e do tamanho dos imóveis a serem titulados acaba por legitimar práticas de grilagem e estimular novas ocupações ilegais, aumentando a pressão sobre as florestas públicas”, ressalta o posicionamento da Coalização.

Audiência na Comissão de Agricultura

Nesta quinta-feira (29) a partir das 13h30 está prevista uma audiência pública sobre a regularização fundiária na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária. A princípio, o objetivo seria discutir principalmente o Projeto de Lei nº 4.348/2019, que também traz novas regulamentações ao tema, mas os holofotes devem mudar para o PL 510/2021. 

Para o debate foram convidados a coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, Mariana Mota, e representantes da Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag).

A audiência será transmitida online através deste link.

  • Duda Menegassi

    Jornalista ambiental especializada em unidades de conservação, montanhismo e divulgação científica.

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