A ofensiva ruralista contra a proteção das Florestas de Araucárias colecionou más notícias na tarde de ontem, terça-feira, em Curitiba.
Os madeireiros, empresários e políticos que partiram da cidade de Ponta Grossa pela manhã, em caravana de 19 ônibus, deram com a cara na porta do Palácio do Governo. Informado da manifestação, Roberto Requião transferiu para sua residência oficial a reunião com representantes do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e da Força-Tarefa Araucárias, para tratar da criação de áreas de preservação do ameaçadíssimo ecossistema, que já sumiu de mais de 99% de seu território original.
Instalados na praça do Centro Cívico da capital paranaense, os cerca de 300 manifestantes anti-araucárias tiveram que dividir espaço com um igual número de defensores do projeto. Estes eram estudantes secundaristas e de várias universidades de Curitiba, de rostos pintados e munidos de bandeiras nacionais e faixas em defesa das araucárias. No fim do dia, chegaram à praça notícias sobre o saldo da reunião: o governador não só apóia integralmente a proposta das cinco unidades de conservação no Paraná (um Parque Nacional, duas Reservas Biológicas e dois Refúgios de Vida Silvestre) como demonstrou insatisfação quanto às tentativas violentas de obstrução do processo pelos ruralistas e alguns políticos locais.
A última reunião de consulta pública para discutir a criação das áreas protegidas, que seria realizada na cidade de Palmas no dia 27 de abril, foi suspensa por falta de segurança, depois que madeireiros insuflaram a população a barrar a entrada dos organizadores. Em Santa Catarina, outras duas consultas públicas já haviam sido impedidas na marra pelos anti-araucárias. Eles se apegam ao argumento de que a criação das reservas ambientais vai tirar empregos da população e penalizar os pequenos produtores. Apesar do maciço apoio da população à proteção das araucárias (estimada em cerca de 97% pelo Ibope), a imprensa local começa a comprar o discurso catastrofista. Em sua edição de quarta-feira, 11, o principal jornal de Santa Catarina, A Notícia, publicou artigo assinado pelo deputado federal Gervásio Silva (PFL), em que ele afirma que “a revolta do povo de Santa Catarina contra a criação das áreas de preservação se dá porque ela não leva em conta o desenvolvimento socioeconômico da região Oeste, uma das que detêm Índices de desenvolvimento humano entre os mais baixos do Estado”. Outra reportagem do jornal, na mesma edição, afirma que R$ 700 milhões em investimentos podem ser perdidos caso as áreas protegidas sejam efetivadas.
“Eles querem promover o desenvolvimento às custas do menos de 1% do que restou das Florestas de Araucária?”, pergunta Miriam Prochnow, da ong Associação de Preservação do Meio-Ambiente do Alto Vale do Itajaí (Apremavi). Assim como ela, os ambientalistas envolvidos no processo estão surpresos com a resistência dos ruralistas e consideram as críticas desprovidas de qualquer embasamento técnico. “O impacto sobre atividades econômicas será ínfimo. Nenhuma pequena propriedade será desapropriada e a área onde haverá mais moradores afetados é o Parque Nacional de Ponta Grossa, onde eles não passam de 32 famílias”, afirma João de Deus Medeiros, membro da Força-Tarefa.
Ele também considera absurdas as queixas de que o processo foi feito sem a devida participação da sociedade. “Nenhum processo de criação de unidades de conservação no Brasil foi tão discutido quanto este!”, afirma João de Deus, no que é endossado pelo Secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Capobianco: “Em março de 2003 foi criado um Grupo de Trabalho com lideranças políticas, ruralistas, empresários e representantes do movimento social. Desde então foram feitas várias reuniões nos municípios, dezenas de debates, entrevistas de rádio e intensa discussão local. O levantamento das áreas envolveu as agências ambientais estaduais (Fatma, de Santa Catarina, e IAP, do Paraná)”.
Por causa dos protestos, a ministra Marina Silva recomendou aos governadores que aceitem pedidos de novas consultas públicas por parte das prefeituras onde elas não foram realizadas normalmente: Abelardo Luz (SC), Ponte Serrada (SC) e Palmas (PR). Fez porém a ressalva de que os prefeitos precisam se responsabilizar pelas reuniões e pela segurança dos participantes. O prazo para a solicitação de novas consultas acaba sexta-feira, dia 13.
Com o apoio oficial do governador, a situação no Paraná parece definida. Mesmo que seja necessário fazer mais um encontro em Palmas, Capobianco espera que já na semana que vem o presidente Lula assine o decreto de criação das áreas protegidas.
Sobre Santa Catarina, a previsão não é tão otimista. Até porque o governador Luiz Henrique (do PMDB como Requião) está do lado dos madeireiros. Ao contrário de seu colega paranaense, Luiz Henrique fez da reunião com o MMA, na semana passada, um ato público de madeireiros contra as três unidades de conservação a serem criadas no estado (uma Estação Ecológica, um Parque Nacional e uma Área de Preservação Ambiental, APA). A pressão surtiu efeito: o Ministério aceitou colher mais sugestões sobre a APA das Araucárias, localizada entre os municípios de Ponte Serrada e Passos Maia, com 425 mil hectares. O prazo das negociações foi estendido até o mês que vem.
Mas Capobianco avisa aos anti-araucárias que não adianta alimentar esperanças de derrubar o projeto. “As audiências servem apenas para ajustar os limites, melhorar a proposta. Não se trata de plebiscito. A decisão da criação já está tomada”, encerra a questão.
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