Reportagens

Conflito de equações

Se Dilma Rousseff torce o nariz para a economia de Palocci, o que ela diria da economia ecológica defendida nos auditórios da Universidade de Brasília?

Carolina Mourão ·
25 de novembro de 2005 · 18 anos atrás

Eco-invasores, refugiados ambientais, carbono social. Biodiplomacia e Poluição Ótima. Para quem já havia se acostumado com os termos do tipo Eia-Rima para entender a questão ambiental brasileira, é isso o que vem por aí. No VI Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica (EcoEco), sediado em Brasília entre os dias 23 e 25 de novembro, se discutiram idéias e novos termos que enfrentam muita dificuldade de serem aceitos pelo mundo, mas principalmente pelo Brasil.

“Estamos chegando em um ponto em que a Amazônia vai se consumir sozinha, não vai ter mais volta. Discutir este tema no Brasil é como fazer uma viagem de volta no tempo. Parece que estamos falando as mesmas coisas da década de 60. Possivelmente não vai dar tempo”, confessa um importante representante do setor financeiro convidado a participar do encontro. Por ser em Brasília, um dos objetivos do EcoEco deste ano foi debater a ecologia econômica na política e no setor financeiro.

A perspectiva do Planalto é um pouco melhor. Gilney Viana, secretário de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente, lembra que foi criado há um ano e meio um departamento de Economia dentro da sua secretaria. Propostas envolvendo descontos do imposto de renda, do tipo lei Rouanet, e crédito sustentável foram feitas aos ministérios da Fazenda e do Planejamento, mas nada foi aceito. Algumas idéias mais modestas receberam aval parcial ou estão em negociação. “Estamos afinando a parceria, mas é dificultoso”, confessa.

Dentro das universidades a falta de interesse pelo assunto também é notória. Recentemente, os alunos de graduação se interessaram em saber um pouco sobre economia ecológica por causa do surgimento dos créditos de carbono. Mas só para não ficarem desinformados sobre a novidade no mercado financeiro. Estudar a especialidade pra valer, são poucos que querem. Professores de universidade do Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Brasília queixaram-se da falta de economistas em seus cursos de pós-graduação. Os mais interessados são graduados de outras áreas. Ao ser perguntado se a falta de interesse era um sinal de que os jovens economistas brasileiros não se preocupam com o bem coletivo, Ademar Romeiro, presidente da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica e professor da USP, nem titubeou: “Nunca se preocuparam”.

“O mundo não muda, mas as taxas cobradas para poluir podem mudar. O custo-poluição vai ser inevitável. A sociedade, as empresas e os governos terão de enfrentar mais cedo ou mais tarde a questão da barganha que inclua o meio ambiente na jogada. O empresário vai preferir investir na preservação ambiental”, completa. A solução, segundo o professor, é que o Estado conceda o direito de propriedade aos bens ambientais comuns, que hoje são públicos. “Ninguém se importa com o que é público, mas se lhe pertence de direito, a coisa muda. As comunidades que dependem da venda de peixes de um determinado rio, por exemplo, passam a ser detentoras daquele patrimônio e passam a exercer a ação fiscalizadora na região. Parte da taxa paga pelo custo-poluição vai para ela”.

“É claro que alguns empresários vão preferir fazer uma média entre redução da poluição e investimentos em preservação ambiental. O custo-poluição vai depender da disposição do empresário em pagar o passivo ambiental que produz. Esta vai ser o dilema do mundo em breve. Preservar vai ser uma questão de economia, de baixar os custos”. Esse ponto pacífico entre a taxação da poluição e os investimentos em preservação é conhecido nos gráficos da economia clássica como Poluição Ótima. É ali que está o problema.

A maior crítica à economia tradicional em relação ao meio ambiente é que os indicadores de sustentabilidade são variáveis desprezíveis. “A Terra contém a economia do homem. A própria matéria-prima que movimenta a economia vem do meio ambiente. Não incluir a variável da sustentabilidade resulta em uma equação cujo resultado é irreal. Os recursos naturais não são infinitos, mas a demanda para o desenvolvimento não dá sinais de freio”, acrescenta Ademar.

Há pelo menos dez anos o movimento da economia ecológica começou a ganhar forma entre os especialistas no Brasil. Surgiu depois que se confirmou uma tendência, na economia clássica, de repensar a equação da lógica do ganho de forma que o planeta possa se sustentar ambientalmente. O que a economia ecológica propõe é a necessidade de se fazer indicadores de sustentabilidade, para saber o que há disponível no meio ambiente e a capacidade de perda desses recursos. Essa equação pode mudar o planeta. O drama é que não se sabe até que ponto os ecossistemas brasileiros resistirão até que o pensamento ecoeconômico seja de fato aplicado no Brasil, como já acontece em muitos países.

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