Em 2030, dois terços da humanidade viverão em centros urbanos. São neles que 73% da energia mundial são consumidos, segundo relatório da Agência Internacional de Energia (IEA). Isso significa que o modo como as cidades se desenvolvem e mitigam suas emissões de gases estufa são ponto chave para a política climática que será decidida na Conferência do Clima de Copenhague. No momento, o papel das cidades e dos governos locais é citado em ações de mitigação e adaptação no rascunho dos documentos que emergiram aqui em Copenhague até agora. Mas organizações que reúnem governos locais querem mais: que a ação desta esfera de poder seja reconhecida internacionalmente em um documento legalmente vinculante.
Na última quarta-feira, foi lançado na COP-15 um documento chamado “Mapa do Caminho dos Governos Locais”. Nele, os representantes de prefeituras, estados e províncias pedem que do encontro de Copenhague saia um acordo “forte e compreensivo” para o pós-2012 e que inclua parceria locais. “Estamos trabalhando num texto que emergiu em Barcelona (na última reunião preparatória antes da COP-15), tentando obter um acordo vinculativo significativo”, disse David Cadman, presidente da associação Internacional ICLEI (Governos Locais para a Sustentabilidade).
Durante a COP-14, realizada em Poznan em 2008, os governos locais apresentaram aos negociadores da ONU o texto “Cidades, autoridades locais e Mudanças Climáticas”. Depois disso, um grande esforço foi feito mundialmente para mobilizar os governos locais neste processo. Em junho de 2009, mais de 700 líderes fizeram um encontro preparatório para a COP-15, também em Copenhague, e em todos os eventos que precederam a Conferência do Clima eles estavam lá, para angariar cada vez mais apoio.
O documento lançado ontem é assinado por associações como União das Cidades e Governos Locais (UCLG, na sigla em inglês), Conselho Mundial das Maiores Cidades pela Mudança Climática (WMCCC), Grupo das 40 Maiores Cidades do Mundo e Projeto Internacional Metropólis, além do ICLEI. Aqui na COP-15, estão representados 1500 governos locais, credenciados por estas organiza. Isso sem contar membros de outras delegações registradas por outros meios.
Mapa do Caminho
O texto sugerido pelas autoridades locais adota 2°C como limite máximo no aumento da temperatura global, pede como meta a estabilização das emissão em 2015 e a redução de 85% dos gases estufa até 2050, com base nos níveis de 1990. Considerando as diferenças regionais e circunstâncias nacionais, estes governos admitem que cidades de países desenvolvidos tenham maiores responsabilidades na redução de emissões, com meta de médio prazo para administrações em países desenvolvidos de 40% até 2020. O documento também defende a adoção do conceito de ações Mensuráveis, Reportáveis e Verificáveis (MRV), estejam as cidades em países pobres ou ricos.
“Nós já começamos os cortes. O que a cidade de São Paulo já está fazendo é maravilhoso, é esse o caminho que queremos seguir em frente”, disse Cadman. A mensagem que os governos locais querem passar é que nenhum acordo será concretizado se não houver ações locais e que, para ocorrer, precisam de investimentos públicos. Os exemplos são inúmeros.
No quesito adaptação, Chicago saiu na frente com um plano para minimizar e se preparar para os impactos das mudanças climáticas. As estratégicas já adotadas pela cidade americana incluem ações de manutenção da qualidade do ar, preservação das áreas verdes, implementação de um “design urbano verde” etc. Em mitigação, a cidade chinesa de Rizhao, com três milhões de pessoas, pode servir de modelo de como implementar usinas solares de energia. Lá, há meio milhão de metros quadrados de painéis solares para aquecimento de água e todos os novos prédios que são construídos devem ter, obrigatoriamente, sistemas próprios de geração energética a partir de energia solar. O Banco Europeu de Investimento vem promovendo financiamentos facilitados para ajudar cidades a melhorar sua eficiência energética. Cerca de 15 milhões de euros já estão sendo destinados ao projeto, mas o banco fala em ajuda de “bilhões”.
O projeto Ações de Energia e Sistemas para o Mediterrâneo, que envolve cidades da Croácia, Grécia, Itália e Espanha poderia ser usado como exemplo de transferência de tecnologia. O projeto fornece consultoria para a definição de modelos locais de sistemas de energia sustentável para pequenos e médios centros urbanos do Mediterrâneo, como Ancora (Itália), Sykies (Grécia), Villa-Real (Espanha) e Split (Croácia). “As cidades, que abrigam mais da metade da população mundial, número que em algumas décadas aumentará para três quartos, são individualmente únicas, mas com atribuições comuns”, disse o economista Nicholas Stern.
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