Reportagens

Casa do saber em cima da árvore

Parceria do IPÊ e Natura vai inaugurar Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade em 2011. 

Thiago Camara ·
23 de novembro de 2010 · 14 anos atrás
A maquete eletrônica da sede da Escola de Conservação (divulgação IPÊ)
A maquete eletrônica da sede da Escola de Conservação (divulgação IPÊ)
Nazaré Paulista – Foi um longo e doloroso parto até o nascimento da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (ESCAS). E essa história terá um grande desfecho quando as obras de construção do seu novo campus estiverem prontas. A iniciativa é do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) em parceria com a Natura e vai acolher estudantes do mestrado já oferecido pela ESCAS desde a sua criação, em 2005. Os pesquisadores vão dispor de 26 hectares de área total, cercados pela Mata Atlântica da cidade de Nazaré Paulista, interior do estado de São Paulo.

Obras de construção da Escas. (Fotos: Thiago Camara)
Obras de construção da Escas. (Fotos: Thiago Camara)

A obra é ousada e pretende ser um tipo de casa da árvore do saber. O projeto dos arquitetos Newton Yamoto e Tânia Regina Parma mantém a unidade da paisagem local e faz com que sua estrutura influencie o mínimo possível as espécies que vivem na região. “Nossos prédios estão fincados no solo com uma base de concreto a 26 metros de profundidade. Eles ficarão elevados para dar a sensação de uma grande casa na árvore. Além disso, já estamos promovendo o plantio de mudas no entorno da construção para que os bichos não percam seu habitat e possam livremente circular envolta das estruturas do campus”, conta o Controller do IPÊ e responsável pela obra Arnoldus Wigman.

Já foram investidos pela Natura mais de R$10 milhões de reais no projeto. Mas ainda faltam verbas para que o campus seja entregue concluído no final de 2011. A partir de então, toda a estrutura do IPÊ será transferida para o novo local. A demora se deu pela burocracia brasileira. Com o investimento liberado e o projeto arquitetônico prontos em 2005, o organizadores do IPÊ foram em busca das licenças ambientais para iniciarem as obras. Três anos de espera e, enfim, a estrutura que mistura ferro, madeira e concreto pode subir. Houve um desejo de manter a coerência do discurso feito pelo instituto e realizar o que Arnoldus chamou de ‘tipo de construção inédita no Brasil’. “Todas nossas madeiras são certificadas com documento de origem ambiental e nenhuma árvore foi derrubada para realizarmos a construção, não haverá asfalto nas ruas do campus, o escoamento da água foi feito para evitar erosão do solo. Nós estamos fazendo tudo conforme o que ensinamos, de forma totalmente sustentável”, defende Arnoldus.

Escola ativa no campus provisório

A atual sede do IPÊ (foto: divulgação)
A atual sede do IPÊ (foto: divulgação)

Enquanto a ESCAS não se muda para sua casa nova, suas atividades continuam a pleno vapor. Duas turmas já foram formadas e o entusiasmo de Claudio Pádua, reitor da escola e idealizador do projeto é o mesmo do começo. “A ESCAS está na posição de formar uma nova geração de profissionais em que o mercado carece. O profissional da sustentabilidade. As empresas me pedem essas pessoas, no mundo acadêmico, nos governos me pedem isso. O tema é atual. Está sendo discutido, trabalhado na imprensa. Mas o mundo acadêmico não está formando esse profissional. A ESCAS está querendo formar novos líderes para os três setores com essa visão e essa formação”, orgulha-se.

E o reconhecimento desse ineditismo é internacional. Robert Lacy, pesquisador do Departamento de Biologia da Conservação do Zoológico de Chicago, nos EUA, passou uma semana aplicando um curso para os alunos do mestrado e defende que o Brasil tem um papel importante no continente latino americano. “O Brasil não está no nível de países como Canadá e Austrália que já possuem pessoas se dedicando ao tema há pelo menos 10 ou 15 anos. Mas por outro lado, aqui há um número maior de pessoas sendo capacitadas sobre a Biologia da Conservação o que torna o país uma referência na América Latina. Não conheço nenhum curso deste tipo em toda a América do Sul. Isso faz com que pessoas desses países venham para o Brasil aprender”, elogia ele.

Claudio vê um tempo favorável para o país. E prevê que ele e a ESCAS estão vivendo um momento único no campo da educação. “O Brasil está num período extraordinário. Em vários campos nós estamos nos tornando referência. Esse momento é de um grande salto na ciência e educação. Se a gente não fizer um investimento nestes campos para darmos um passo à frente, poderemos perder essa liderança. Temos a possibilidade de tornar um Brasil como exemplo de uma economia que se desenvolve de maneira sustentável”, prevê.

Desafios da ESCAS

No futuro da ESCAS está a consolidação de seu mestrado, em Nazaré Paulista, e da turma que estuda no sul da Bahia. Os alunos são todos profissionais estabelecidos na região para que seus trabalhos finais sejam desenvolvidos depois que defenderem suas teses. Na Bahia, o curso é feito em parceria com o Instituto Arapyaú. O corpo docente está disposto a repetir a experiência com os baianos em outras áreas do Brasil. Outro desafio é a legitimação do mestrado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Hoje, o mestrado já tem o reconhecimento da coordenação. “Quando montamos a ESCAS a ideia era trazer a interdisciplinaridade para os nossos centros acadêmicos, como experimentamos (eu e o Claudio) nos estudos que fizemos nos EUA. Daqui há três anos vamos ser julgados pela CAPES. Como será esse julgamento? Nós não sabemos. Temos uma autonomia de atuação e qualidade nos trabalhos que já foram apresentados. Se quem vier nos avaliar não tiver uma aceitação da interdisciplinaridade vai ficar complicado termos um grau alto ou subirmos de nível. Isso é essencial para oferecermos o doutorado que queremos, mas vai depender do grau que obtivermos”, explica Suzana Pádua, presidente do IPÊ.

Entre os alunos, a diversidade de temas e disciplinas, agrada. Alexandra Alcântara é arquiteta, em Bauru, São Paulo, e faz parte da turma atual do mestrado. “O grande objetivo de estarmos aqui é mudar um comportamento em função de novas práticas. A multidisciplinaridade neste caso é fundamental. São pessoas de meios diferentes, com as habilidades diferentes que se juntam para um bem comum. Antigamente, os ambientalistas tinham um comportamento e o mercado outro, contrário. Estamos num momento de diálogo em que esses pensamentos se unem para um futuro de ações mais humanas”, empolga-se.

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