Somada a falta de chuvas, a elevada irradiação solar no Brasil tem contribuído para o baixo nível das represas nos lagos das hidrelétricas. Sem que a água chegue aos níveis ideais, as usinas termelétricas a carvão, óleo e gás são ligadas como forma de se poupar o volume dos reservatórios. Entretanto, o Brasil e o Nordeste recebem grande incidência solar. Se usássemos o sol como fonte de energia poderíamos fazer do problema, a seca, uma solução, energia fotovoltaica, transformando limão em limonada.
A média de insolação do Brasil é de cerca de 3 mil horas ao ano e, em determinadas regiões do nosso mapa, a média é mais alta, de acordo com os dados disponíveis no Atlas Solarimétrico do Brasil. É o mesmo sol que hoje nos castiga com um dos mais longos períodos de estiagem no semiárido. Embora ruim para a população e a agricultura, essa estatística mostra nosso potencial para gerar energia limpa, renovável e de baixo impacto ambiental.
Esse dado está no início da conversa com defensores da geração de energia por fontes alternativas, como o professor Heitor Scalambrini Costa, mestre em energia solar e doutor em energética pela Faculte Saint- Jerôme, em Marselha, França. Scalambrini classifica o sertão nordestino como uma região com o nível de insolação de fazer inveja a qualquer país europeu. “Nossos recursos solares são abundantes e bem distribuídos. Na Europa, com muito menos, os países investem muito mais”, compara o professor da Universidade Federal de Pernambuco.
O interesse das grandes empresas em investir recursos destinados à geração de energia solar começa a aumentar. A Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf) é uma das maiores empresas do sistema Eletrobrás e possui seus principais investimentos na região Nordeste. Desde 2012, em Petrolina, aplicou R$ 44 milhões em um centro de pesquisas e geração de energia através de painéis fotovoltaicos.
A Chesf está acompanhada por outras grandes do setor no interesse pela energia solar. A Petrobras está tirando do papel um projeto para instalação de uma usina de 1,1 MW em Alto do Rodrigues, a 200 quilômetros de Natal, no Rio Grande do Norte. O plano da Petrobras é utilizar o mesmo terreno no qual está instalada a usina termelétrica Jesus Soares Pereira para adquirir mais conhecimento sobre a geração a partir de painéis fotovoltaicos. A título de comparação, 1,1 MW é energia suficiente para o consumo de 1.800 domicílios em um ano.
O Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) são parceiros da Petrobras nesse projeto. Eles vão instalar uma plataforma experimental no laboratório de eletrônica e energias renováveis do departamento de engenharia elétrica. Também querem implantar seis estações para capturar informações para o Sistema Nacional de Organização de Dados Ambientais (Rede Sonda) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A Rede Sonda cria uma base de dados com informações sobre os ventos e a radiação solar, considerando sua distribuição no território do país e durante o ano.
Os novos estádios construídos para sediarem as disputas pela Copa do Mundo de 2014 também trataram de incluir em suas estruturas painéis fotovoltaicos. Em São Lourenço da Mata, na Região Metropolitana do Recife, onde se conclui a Arena Pernambuco, por exemplo, também está sendo construída uma usina fotovoltaica que será capaz de gerar 1 MW nas horas de pico.
Chesf, Petrobras e Odebrecht são três exemplos de empresas que atenderam à chamada 013/2011 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que pede arranjos técnicos e comerciais para inserção da geração solar fotovoltaica na matriz energética. Além de projetos de geração, a Aneel pede a instalação de instrumentos de medição da energia solar pelo país.
Os instrumentos de medição são fundamentais. Todos precisam de dados confiáveis sobre o potencial da energia solar. O Atlas Solamétrico existe há 11 anos e nos últimos anos foram sensíveis para os eventos climáticos. Os dados são necessários para que os investimentos de porte em grandes parques fotovoltaicos ocorram.
Por raciocínios diversos, o professor Heitor Scalambrini Costa e o presidente da Chesf, João Bosco, consideram abundante o potencial de energia solar disponível no país |
É nessa rubrica que está o centro de pesquisas da Chesf em Petrolina, no centro do semiárido brasileiro, a pouco mais que 700 quilômetros do Recife. A companhia energética está investindo na instalação de um centro que pode gerar no máximo 3 MW, detalha Helder Falcão, gerente de pesquisa, desenvolvimento e inovação da empresa. Parte dessa produção, 2,5 MW, será vendida para o sistema. Os 0,5 MW restantes serão utilizados para mais estudos. “Os painéis de geração também vão servir para analisarmos os custos de operação da planta, qual sua manutenção necessária, melhor instalação para a transmissão, qualidade e custo dos equipamentos utilizados. Tudo para obtermos maior conhecimento sobre essa área”, explica Falcão.
O interesse maior da Chesf pela geração de energia através da força do sol cresceu com o presidente João Bosco de Almeida. Ele é entusiasta das possibilidades apresentadas pelas fontes renováveis de energia. Com relação à energia solar, João Bosco fala que já fez e refez uma conta utilizando as informações atuais. “A insolação média no Nordeste é da ordem de 6 quilowatt/hora por metro quadrado. O semiárido tem 1 milhão de quilômetros quadrados. Nós estamos falando de insolação de 250 mil MW/h”. Em comparação, João Bosco lembra que o Brasil todo gera 100 mil MW/h.
Esses números são absolutos, adverte o presidente da Chesf. Não se pode imaginar colocar painéis solares em cada centímetro quadrado nordestino, mas pode-se pensar em se aproveitar 30%, 40% desse total, o equivalente a 80 mil MW. “Além do mais, é uma realidade que mudaria a região, que passaria a receber royalties pela produção de energia”.
O conhecimento será o passo mais seguro em direção à participação da energia solar na matriz energética brasileira. Outras condições também estão se mostrando favoráveis. O professor José Bione, especialista da Chesf com pós-doutorado em energias renováveis, cita que a entrada da China como um dos principais fornecedoras do setor fez os preços dos painéis solares despencarem. Bione estima que até 2020, o preço para geração por células fotovoltaicas estará competitivo, em relação a geração por pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Hoje, o preço do MW gerado por fotovoltaico é da ordem de R$ 250 a R$ 300. O preço do MW gerado por uma PCH é de R$ 140, R$ 150.
A utilização de painéis fotovoltaicos não é a única forma de se transformar a força do sol em eletricidade. A geração pode ser por uma usina heliotérmica, que é uma usina termelétrica cujo aquecimento da água é feito pelo calor do sol. No mesmo terreno onde a Chesf desenvolve seus estudos com painéis fotovoltaicos, em Petrolina, o governo de Pernambuco possui um estudo financiado pelo Finep com uma usina heliotérmica.
Ao se considerar os custos atuais, a heliotérmica não é uma forma competitiva de se produzir energia, comenta Bione. No entanto, a termelétrica solar é considerada por ele como o futuro do setor, entre outras razões por possibilitar o armazenamento da energia – coisa que a geração fotovoltaica não permite.
Outras formas de se utilizar os benefícios da luz solar são velhas conhecidas da arquitetura e utilizados nas construções mais modernas. A água armazenada no alto de casas e edifícios pode dar uma utilidade ao calor solar e, com isso, reduzir o uso de chuveiros elétricos. O uso abusivo da iluminação natural também contribui para a economia de energia ao poupar horas de uso das lâmpadas fluorescentes.
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