O incêndio que atingiu o Instituto de Biociências (IB) da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro na tarde de quarta-feira (31) levou consigo quase todo acervo histórico da coleção didática de zoologia, que vinha sendo construído ao longo dos últimos 60 anos. Também foram perdidas centenas de pesquisas, equipamentos e outros materiais científicos. Alunos e professores se reuniram na tarde desta quinta-feira (01) para tentar levantar as perdas.
Em nota, a assessoria de imprensa da Unesp informou que “os prejuízos materiais e, sobretudo, científicos, ainda estão sendo dimensionados pelas equipes que trabalham no local”.
No entanto, segundo apurou ((o))eco, já se sabe que toda coleção de vertebrados do acervo didático foi perdida para o fogo e que, da coleção de invertebrados, só os insetos foram salvos.
O acervo era composto por milhares de animais, entre eles alguns já extintos na natureza. Eles serviam de material de estudo e pesquisa durante aulas práticas.
“A coleção era usada no ensino da graduação e da pós-graduação e vem sendo usada por biólogos que se formam aqui desde a década de 60”, disse o professor do Departamento de Zoologia da Universidade, José Paulo Guadanucci, a um jornal local.
Para o zoólogo Célio Haddad, professor titular do Departamento de Zoologia da Unesp, o incêndio comprometeu o ensino de turmas futuras. “São materiais raríssimos, de difícil obtenção, alguns dos animais que foram perdidos até desapareceram, estão extintos. Nós nem sabemos como vamos fazer para manter as aulas práticas dos estudantes daqui para frente”, disse
Além do material científico, o fogo também consumiu equipamentos dos laboratórios de Genética, Evolução e Mutagênese. Entre os materiais perdidos estão microscópios, freezers, ultrafreezer e computadores.
Incêndio
O incêndio começou por volta das 16h, no laboratório de Mutagênese do Instituto de Biociência e, segundo a Unesp, atingiu cerca de 30% do prédio principal do Instituto. Antes de serem evacuados, professores e alunos tentaram salvar materiais de pesquisa e controlar as chamas com extintores, sem sucesso.
O Corpo de Bombeiros foi chamado e demorou cerca de quatro horas para controlar as chamas. Ninguém ficou ferido.
As causas do incêndio ainda estão sendo apuradas, mas a universidade suspeita que o fogo tenha sido causado por pane na rede elétrica.
Alunos e professores se reuniram na tarde desta quinta-feira em uma assembleia para tentar levantar as perdas.
“A gente está devastado e com muita raiva, principalmente porque tudo isso poderia ter sido evitado com investimento público” disse a ((o))eco a estudante do último ano do curso de Ciências Biológicas, Vanessa Souza.
Segundo ela, o prédio atingido precisava de várias manutenções e o risco de incêndio era iminente. “Em 2019 ele alagou porque o telhado quebrou com a chuva. Mesmo assim, nada foi feito. Há anos que [a universidade] pedia dinheiro para as reformas e manutenções. Esse ano, a verba foi aprovada e seria disponibilizada para o IB no ano que vem”, acrescentou a estudante.
A assessoria de imprensa da Unesp confirmou, em nota, que a universidade previa realizar a troca de toda rede elétrica e hidráulica do prédio central do IB de Rio Claro no próximo ano. “Era uma das principais metas da unidade universitária”, diz o comunicado.
No total, a Unesp pretende investir R$ 700 milhões, para toda a universidade, em um “programa de infraestrutura”. “A direção da unidade universitária tinha conhecimento da necessidade de uma ampla reforma estrutural na edificação, construída em 1977, e estava preparando o processo licitatório neste semestre, com recursos destinados às unidades pelo programa de infraestrutura lançado neste ano pela atual Reitoria”.
Além disso, a universidade informou que a administração local tem liberado, desde o final de 2021, recursos para investimentos pontuais em infraestrutura, tendo sido destinados, para tais fins, R$ 5,5 milhões ao Instituto de Biociência somente em 2022.
“A Unesp está consternada com as perdas do instituto e se solidariza com todos os docentes, pesquisadores, estudantes e funcionários técnico-administrativos que tiveram seus trabalhos interrompidos por esta terrível ocorrência. A administração central se dedicará diuturnamente para que a rotina acadêmico-científica seja retomada o mais breve possível”, diz o comunicado da universidade.
As salas de aula não foram atingidas pelo fogo, mas as atividades acadêmicas foram suspensas.
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