Organizações ambientais cobram do governo de Pernambuco uma resposta sobre a proposta apresentada pela Beck Engenharia, empresa que lidera o consórcio responsável pelo projeto do Lote 01, do Arco Viário Metropolitano, que gera menos impacto à Área de Proteção Ambiental (APA) Aldeia Beberibe. A proposta, obtida por ambientalistas, via Lei de Acesso à Informação (LAI), apresenta um traçado por fora da APA. Além dessa mudança, estão previstas a instalação de pontos de preservação no curso do arco e a cobrança de pedágio para viabilizar ações de mitigação ambiental.
“Nós requeremos o acesso a esse estudo, via Lei de Acesso à Informação. Analisando a proposta feita pelo consórcio liderado pela Beck Engenharia, nós admitimos que esta é a mais viável, porque não passa por dentro da APA. O próximo passo seria consensuar com o governo para dar continuidade aos demais estudos. Nós solicitamos, via Lei de Acesso à Informação, os documentos das próximas etapas, mas até hoje, 03 de abril, não recebemos retorno. Até agora, não sabemos se houve progresso”, afirma Herbert Tejo, presidente do Fórum Socioambiental de Aldeia.
A reportagem de ((o))eco fez contato com o governo do estado para saber se o órgão havia recebido e analisado a proposta da empresa líder do consórcio responsável pelo Arco Metropolitano. Até o fechamento desta reportagem, não recebemos retorno do órgão. O espaço segue aberto.
A realização desses estudos atende parte das exigências do Tribunal de Contas do Estado (TCE) que, por meio de uma medida cautelar, vetou a licitação do projeto do lote 01, ao Norte do Arco Metropolitano, devido aos riscos ambientais. O projeto original demandaria a supressão de cerca de 65,54 hectares de Mata Atlântica, o equivalente a 91 campos de futebol. A licitação, estimada em R$ 3,8 milhões, trata da implantação do trecho entre os municípios de São Lourenço da Mata e Goiana, ambos na Região Metropolitana do Recife.
Criada em 2010 pelo Decreto Estadual nº 34.692, a APA Aldeia Beberibe mede 31 mil hectares. Ela abrange oito municípios: Abreu e Lima, Araçoiaba, Camaragibe, Igarassu, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata, na Região Metropolitana; e Paudalho, na Zona da Mata Norte. O local abriga o maior remanescente de Mata Atlântica ao Norte do Rio São Francisco. Dentro da APA estão outras cinco unidades de conservação, todas de proteção integral.
“Existem 46 espécies de fauna e flora ameaçadas de extinção, que vivem nessa APA. Ela abriga importantes mananciais hídricos subterrâneos e superficiais, que abastecem boa parte da população da Região Metropolitana e do Litoral Norte. É um importante ativo ambiental contra as mudanças climáticas. Por isso, é importante que a gente encontre um caminho para aliar a necessidade de mobilidade com a conservação ambiental, pois se a área não tivesse seus atributos, a APA não teria sido criada em 2010”, avalia Cinthia Lima, gestora e presidente do Conselho Gestor da da APA Aldeia Beberibe.
A realização dos estudos de viabilidade é fruto de uma decisão tomada pelo Ministério Público do Estado de Pernambuco (MPPE) durante uma audiência pública, realizada em maio de 2022, envolvendo o Governo do Estado e o Fórum Socioambiental de Aldeia. Na audiência, o MPPE acatou a denúncia dos órgãos ambientais sobre riscos ambientais ainda presentes no edital, relançado em janeiro de 2022. Essa segunda versão propunha reparar falhas encontradas no primeiro edital, lançado em julho de 2021, que também havia sido sustado por não apresentar medidas contra riscos ambientais.
“A partir do consenso sobre a nova proposta, a empresa daria continuidade aos outros diversos estudos para que se construa o projeto base de engenharia e a partir daí iniciar o estudo de impacto ambiental. Segundo o cronograma, eles deveriam concluir todos os estudos em novembro. Aparentemente isso não foi feito”, pondera Herbert Tejo. “Uma vez que a nossa solicitação de acesso aos documentos não foi cumprida, entramos com registro de recurso”, informa o representante do Fórum Socioambiental.
O Arco Viário Metropolitano tem o objetivo de sanar um problema de mobilidade que envolve a Região Metropolitana do Recife. A obra pretende criar um fluxo mais rápido entre o Complexo Industrial Portuário de Suape, no Litoral Sul, e o município de Goiana, na Mata Norte. Assim, a BR 101, principal via de acesso, inclusive para veículos de grande porte que atendem ao setor industrial, seria desafogada.
O trecho Norte, que ainda está na fase de elaboração de estudos e ajustes, compreende 50 km, ligando os municípios de Paudalho, na BR 408, à Goiana, na BR 101 Norte. Já o trecho Sul, que já possui o atestado de viabilidade ambiental, possui 45,3 quilômetros de extensão e liga os municípios de Paudalho, na BR 408, e o Cabo de Santo Agostinho, na BR 101. Esse último trecho aguarda a renovação da licença prévia, inicialmente emitida pela Agência Estadual do Meio Ambiente (CPRH), em 2015, mas que expirou.
Uma licitação foi aberta em fevereiro de 2022 para contratar a elaboração dos estudos complementares do trecho compreendido entre a BR-408 e a BR-101 Sul, “com extensão de 45,3km”. Duas empresas foram classificadas para o contrato, conforme publicado no Diário Oficial do Estado de Pernambuco, em 1º de abril de 2022.
Após a apresentação dos estudos à CPRH, caberá ao órgão analisar e conceder, ou não, a Licença de Instalação, documento que, de fato, autoriza o início das obras.
Onde está o impasse
A proposta defendida pelo governo do estado, que corta a APA ao meio, possui 20 km a menos de via a ser construída. De acordo com Herbert, na defesa da sua proposta, os representantes do governo do Estado alegam “que demanda menos custos com as obras e que torna o trajeto mais atrativo por não ter um acréscimo de 20km”.
“O cara que sai lá de Goiana e vai atravessar Igarassu, Abreu e Lima, Paulista, Recife, ele vai passar umas duas horas para fazer esse trajeto, que em alguns momentos do dia, não anda. Ao passo que ele vai percorrer esse trecho Norte, via Arco, em cerca de 12 minutos. Quem é que não vai fazer essa opção?. Outra coisa: nós demonstramos que quem sai do Pólo Industrial Norte até a BR 408, onde o trecho Sul se inicia, não terá que andar 20km a mais. No final das contas a diferença é de 4km. Porque ou ele anda na estrada que já existe para se encontrar bem na frente com o Arco, ou ele se encontra com o Arco antes e anda menos na [BR] 101”, explica.
15 anos de impasse
A saga do Arco Metropolitano teve início em 2009, quando o governo de Pernambuco, sob o comando de Eduardo Campos, do PSB, contratou uma empresa para construir o Projeto Executivo de Engenharia do Traçado do Arco Metropolitano. Esse projeto propunha um traçado que cortava a APA por dentro, bem na Mata da Pitanga, um importante remanescente florestal.
Em 2012, por meio de uma Parceria Público Privada, o projeto avançou à fase de análise de impacto ambiental. À época, o consórcio contratado considerou três alternativas de traçado. Duas passavam por dentro da APA e uma por fora. Uma dessas alternativas era a apresentada pelo governo de Pernambuco. Ao fim, a empresa recomendou o traçado por fora, em função do menor impacto ambiental.
Em 2014, o Governo do Estado passou o projeto para o Governo Federal, comandado pela então presidenta Dilma Rousseff (PT), que lançou um edital de execução, via o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit). O projeto a ser executado levava em conta o traçado que cortava a APA por dentro e não o recomendado pelo consórcio, que oferecia menor impacto ambiental.
Em resposta, as organizações ambientais acionaram o Ministério Público do Estado de Pernambuco (MPPE). A denúncia questionava a execução da obra sem um Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), que no caso existia, porém baseava-se na proposta de traçado que passava por fora da APA.
Na presença do governador João Lyra Neto (PSDB), foi fechado um acordo entre sociedade civil, MPPE e Dnit. “O acordo era que o Dnit ficasse com as obras do trecho Sul, retirasse o trecho Norte do edital e viabilizasse estudos de traçado para este último trecho por fora da APA”, relembra Herbert Tejo.
O edital foi impugnado e cancelado. Na ocasião, foi fechado um acordo entre a sociedade civil, governo do estado e o Dnit. Em 2021, um novo edital foi lançado pelo governo pernambucano, que levou ao processo atual.
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