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Planos climáticos internacionais são insuficientes e levarão a aquecimento de 2,5ºC, diz ONU

Relatório divulgado hoje pela Organização indica aumento de 10,6% nas emissões mundiais. Brasil continua com meta “inflada”, retrocedendo no Acordo de Paris

Cristiane Prizibisczki ·
26 de outubro de 2022 · 1 anos atrás

A poucos dias do início do início da Conferência do Clima, que será realizada entre 6 e 18 de novembro no Egito, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou o balanço dos planos climáticos internacionais para 2030 e sentenciou: as metas estabelecidas pelos 193 países signatários do Acordo de Paris são insuficientes e permitirão que muitos gases de efeito estufa ainda sejam lançados na atmosfera. O Brasil é um dos vilões da história, diz entidade brasileira.

Segundo o novo relatório da Organização, divulgado nesta quarta-feira (26), apesar de os países signatários estarem no esforço de dobrar para baixo a curva das emissões globais de gases de efeito estufa, as metas de corte combinadas dos 193 países vão permitir um aumento de 10,6% nas emissões até 2030, em comparação com os níveis de 2010. 

O resultado esperado é o aquecimento em 2,5ºC do planeta até o final do século, quando o esforço pretendido era a limitação do aquecimento em 1,5ºC, preferencialmente. 

A Organização salienta que, apesar da estimativa de emissões ter melhorado em relação à avaliação do ano passado – quando as metas então apresentadas indicavam que os países estavam no caminho de aumentar as emissões em 13,6% até 2030 – elas não demonstram a rápida tendência de queda que a Ciência diz ser necessária nesta década.

“A tendência de queda nas emissões esperada para 2030 mostra que as nações fizeram algum progresso este ano”, disse Simon Stiell, secretário executivo do braço da ONU para Mudanças Climáticas. “Mas a Ciência é clara, assim como nossos objetivos climáticos sob o Acordo de Paris. Ainda não estamos nem perto da escala e do ritmo das reduções de emissões necessárias para nos colocar no caminho de um mundo de 1,5 graus Celsius. Para manter esse objetivo vivo, os governos nacionais precisam fortalecer seus planos de ação climática agora e implementá-los nos próximos oito anos”.

Baixa participação

O Acordo de Paris, de 2015, prevê a atualização dos planos nacionais de ação climática – conhecidos como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) –  a cada cinco anos. Com a pandemia da Covid-19, a Conferência do Clima de 2020, quando as metas teriam de ser revistas, não foi realizada. Portanto, 2021 era o prazo máximo para a revisitação das metas.

O relatório divulgado hoje, no entanto, mostrou que até 23 de setembro de 2022, apenas 24 nações apresentaram ou atualizaram suas NDCs. Em conjunto, esses planos cobrem 94,9% do total de emissões globais, mas a ONU esperava um comprometimento maior.

“O fato de que apenas 24 planos climáticos novos ou atualizados terem sido

 apresentados desde a COP 26 é decepcionante. As decisões e ações governamentais devem refletir o nível de urgência, a gravidade das ameaças que enfrentamos e a falta de tempo que nos resta para evitar as consequências devastadoras e descontroladas das mudanças no clima”, diz Stiell.

Um relatório divulgado no início deste ano pelo IPCC, corpo de cientistas da ONU, indicou que as emissões de CO2 precisariam ser cortadas em 43% até 2030, em comparação com 2010, se quisermos manter a temperatura abaixo dos 1,5ºC até o final do século, a fim de evitar os piores impactos das mudanças no clima, como inundações, secas severas, ondas de calor e outros desastres naturais relacionados ao clima.

Planos Brasileiros

Em abril de 2022, o governo de Jair Bolsonaro atualizou as metas nacionais de redução de emissões, oficializando o que foi chamado de “pedalada climática”. Ao submeter a nova meta à ONU, o atual governo inflou artificialmente seu compromisso, dando o direito de emitir até 73 milhões de toneladas de CO2 equivalente em 2030 a mais do que a proposta feita originalmente, em 2015.

O movimento de jovens Fridays for Future faz parte do grupo que processa o governo brasileiro por pedalada climática. Foto: Fridays For Future.


Ao propor seus cortes, o governo brasileiro mudou – para mais – a base de cálculo da meta estipulada originalmente. Isto é, propôs praticamente o mesmo percentual de redução de emissões – era 43% de redução até 2030 e passou a ser 50% de redução no mesmo ano – só que sobre um número base maior.

A manobra do governo foi duramente criticada por pesquisadores, organizações da sociedade civil e movimentos sociais e ambientalistas. Ainda em 2021, logo depois de ela ser proposta pelo governo brasileiro em sua primeira versão, a meta chegou a ser alvo de ação civil pública, assinada pelos coletivos de jovens Engajamundo e Fridays For Future Brasil. Eles pedem a anulação desta NDC, a mesma considerada pela ONU no seu relatório divulgado hoje.

“O governo de Jair Bolsonaro apresentou duas atualizações piores do que a meta original de 2015, mesmo com um agravamento da crise climática. Ou seja, enquanto o mundo se esforça, ainda que a passos muito lentos, para reduzir as emissões nessa década crítica, o Brasil promete entregar mais emissões até 2030”, disse a ((o))eco a especializa em política climática do Observatório do Clima, Stela Herschmann.

  • Cristiane Prizibisczki

    Cristiane Prizibisczki é Alumni do Wolfson College – Universidade de Cambridge (Reino Unido), onde participou do Press Fellow...

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