A Conferência do Clima da ONU chega a suas últimas horas nos Emirados Árabes com o fantasma do fracasso se avizinhando. O texto principal do encontro, cuja expectativa era que trouxesse um acordo global pela eliminação dos combustíveis fósseis, foi divulgado na tarde desta segunda-feira (11) com linguagem considerada “surpreendentemente fraca”.
O rascunho do que será o acordo final da Cúpula foi divulgado pela presidência da COP 28 por volta das 17h, no horário de Dubai, sem uma menção clara pelo fim dos fósseis, o que desagradou diferentes nações, notadamente os países insulares, que já disseram que vão se opor à redação atual.
O Brasil se manifestou duas vezes sobre o documento. Em coletiva de imprensa logo após a divulgação do material, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que o Brasil não aceitará nenhum texto que não reflita os esforços de “tirar o pé do acelerador” do uso de fontes de energia poluidoras.
“A métrica de sucesso dessa COP vai depender da linguagem em relação a combustíveis fósseis”, disse.
Segundo a ministra, o Brasil defende um posicionamento claro no sentido de viabilizar os meios para acelerar as energias renováveis e, de forma justa, a redução dos fósseis.
“Queremos que os resultados que vamos ter até o final das negociações sejam no sentido de sermos coerentes com a missão que a ciência está dizendo que temos que assumir, a missão do 1,5 °C”, complementou a ministra, em referência à meta de limitar o aquecimento global a esta cifra.
O receio do Brasil não é somente que o acordo firmado pelos países membros da ONU seja insuficiente para fazer frente à emergência climática. Há também o temor que a decisão sobre pontos de difícil consenso acabe sendo adiada até o momento em que o Brasil irá presidir a COP, em 2025.
“Desde o começo, todo trabalho que o Brasil vem fazendo é no sentido de que a gente possa assimilar esse tema inadiável em relação ao combustível fóssil no percurso das três COPs: a COP 28, a COP 29 e a COP 30. Nós não queremos uma pororoca de pressão na COP 30 de algo que não foi sendo assimilado ao longo do processo”, disse a ministra.
No final da noite, por volta das 22h30, um novo posicionamento foi dado pelo governo brasileiro, reiterando que o texto agora em debate tem linguagem não apropriada e muitas insuficiências, com ausência dos esforços necessários para a garantia do cumprimento da meta de 1,5ºC.
O ponto positivo constante no texto – ainda que não da forma como desejada pelo Brasil – é a menção à importância de “inverter o desmatamento até 2030”, diz Marina Silva.
“[O acordo de Dubai] Salienta a importância de proteger, conservar e restaurar a natureza e os ecossistemas para atingir o objetivo de temperatura do Acordo de Paris, nomeadamente através de esforços redobrados para travar e inverter o desmatamento até 2030, da restauração florestal e através de outros ecossistemas terrestres e marinhos que atuem como sumidouros e reservatórios de gases com efeito de estufa e protegendo a biodiversidade, assegurando simultaneamente salvaguardas sociais e ambientais”, diz o material.
A Conferência do Clima está prevista para acabar amanhã (12), mas as dificuldades de consenso em pontos tão importantes – como é o caso da eliminação dos fósseis – não indicam que esse prazo será cumprido.
Veja abaixo a reação de algumas organizações sobre o rascunho do acordo:
“O novo texto parece ser uma tentativa inteligente de reformular a questão mais controversa – mas na ausência de metas claras sobre quanto e quando a produção e o consumo de combustíveis fósseis serão reduzidos, não avançamos muito além dos apelos anteriores para a sua eliminação gradual. Os investidores e consumidores precisam de garantias de que a economia global será net zero até 2050 ou antes, para que possam fazer as escolhas certas. Andrew Deutz, Diretor Geral de Política Global e Financiamento para Conservação na The Nature Conservancy.
“O rascunho do texto da COP 28 veio à tona. A sua linguagem não vinculativa, vaga e evasiva é extremamente decepcionante, para dizer o mínimo, e fica muito aquém da resposta urgente que a crise climática exige de nós e pela qual tantas comunidades, especialistas e negociadores têm lutado. Tal como o horizonte de Dubai, assolado pela poluição atmosférica, a menção aos combustíveis fósseis no resultado final é, na melhor das hipóteses, obscura e, na pior, perigosa”. Cansin Leylim, Diretor Associado de Campanhas Globais, 350.org.
“A proposta de acordo para o Balanço Global divulgada nesta reta final da COP 28 é surpreendentemente fraca, pois não reflete a intensidade das discussões nem a maioria dos posicionamentos vistos até aqui. Além de ignorar as demandas da sociedade civil ao não promover um acordo global pelo fim progressivo dos combustíveis fósseis, o texto também é especialmente frustrante aos países em desenvolvimento por não oferecer os meios de implementação, como previsão de financiamento, para que estes tenham condições de promover sua transição energética. A vitória – se é que temos um vencedor nessa crise climática – parece ser dos interesses dos grandes produtores de petróleo e suas empresas, que marcaram forte presença na COP 28”. Camila Jardim, especialista em política internacional do Greenpeace Brasil
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