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Época de corte

Começam em maio ações contra desmatamento no sul da Amazônia. Acabou a chuva e madeireiros já estão no mato. Equipamentos mais modernos serão usados para agilizar fiscalização.

Vandré Fonseca ·
26 de abril de 2007 · 17 anos atrás

Em maio, quando as operações de combate ao desmatamento no Sul do Amazonas começarem, o Ibama vai ter uma ferramenta importante para planejar as ações e identificar os responsáveis pelo crime: um banco de dados integrado, operado pelo Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam). O sistema vai ser abastecido com informações do Ibama no Amazonas e em outros estados, Incra e Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam). “Vamos poder descobrir o desmatamento e, no mesmo dia, saber se há alguém reivindicando a área e quem vai ser responsabilizado pelo desmatamento”, afirma o superintendente do Ibama no Amazonas, Henrique Pereira.

As ações foram divulgadas durante uma entrevista coletiva, na última qurta-feira, pouco antes de uma reunião entre os diversos órgãos que vão participar das operações no Sipam, em Manaus. O diretor de Proteção Ambiental do Ibama participou do encontro. Polícia Federal, Polícia Militar e Exército também devem ser chamados a integrarem as ações. Uma reunião semelhante já havia ocorrido no Pará e outras estão programadas para Mato Grosso e Rondônia.

A base de dados foi montada sobre mapas do Sipam e vai receber informações atualizadas, tanto das equipes que estiverem em campo, quanto do Deter, usado pelo Ibama para identificar desmatamentos em Unidades de Conservação e Áreas Indígenas. Os dados do Deter são atualizados a cada 15 dias. “Eles poderiam ser diários, mas percebemos que para nossos objetivos o intervalo de tempo pode ser maior”, diz.

O Sipam ofereceu também a possibilidade de usar aeronaves de sensoreamento para o planejamento de ações especiais. Essas aeronaves poderiam fazer o sensoreamento detalhado de uma grande área, que antes demoraria meses em apenas dez dias.

De acordo com Henrique Pereira, antes desta base de dados estar disponível, em pelo menos metade dos desmatamentos identificados pelo instituto, os responsáveis não eram identificados. Porque se ele não era pego em flagrante, o Ibama precisava enviar um ofício ao Incra pedindo informações sobre a propriedade ou reivindicação de propriedade. Após uma consulta ao banco de dados, o Incra repassava a informação. Um procedimento extremamente demorado.

Nos doze municípios do sul do Amazonas, por exemplo, onde foram desmatados cerca 120 mil hectares, em média, nos últimos quatro anos, apenas os responsáveis por derrubar entre 60 e 65 mil hectares de florestas foram multados. A situação na região é considerada a mais grave em todo o estado, devido à proximidade com Pará, Mato Grosso, Rondônia e Acre, que formam o Arco do Desmatamento, nome dado à região onde a pecuária, a soja e a extração ilegal de madeira avançam mais rapidamente sobre a floresta.

Lábrea, município a 700 quilômetros de Manaus, se destaca negativamente quando o assunto é desmatamento – além do histórico de conflitos por terra que ocorrem por lá. Estima-se que existem 100 mil cabeças de gado no município, sem que haja empreendimentos legalizados para suportar este rebanho. O município sofre a influência de uma frente de desmatamento que cresce a partir da BR-364, entre Rondônia e Acre. O acirramento desses conflitos já levou o Ibama a fazer uma reunião com o Gabinete de Segurança Pública do Estado e participar de uma audiência na Assembléia Legislativa.

Uma das dificuldades para combater o crime ambiental nesses municípios é que as atividades ultrapassam as divisas estaduais, com isto o responsável foge da jurisdição do órgão fiscalizador ou policial. “A madeira ilegal retirada do sul de Lábrea abastece serrarias na Ponta do Atumã, em Rondônia”, conta Henrique Pereira. Só uma ação integrada, entre institutos de proteção ambiental e policias, federal e estadual, deve poder combater esta situação. “É isto que vamos fazer agora”, garante Henrique Pereira.

Existem dificuldades também para punir os responsáveis. O desmatamento não resulta em prisão, conforme explica o superintendente do Ibama no Amazonas. O instituto pode embargar a atividade, apreender equipamentos, mas não pode levar ninguém que esteja destruindo a floresta para a cadeia. Existe até casos em que um único acusado de desmatamento ilegal foi autuado 48 vezes. “Enquanto ele não for julgado, não tem solução”, diz Pereira.

O crime ambiental geralmente está associado à grilagem de terras. O único mandante de desmatamento preso em Manaus acabou na cadeia devido a crimes associados à destruição da floresta, como formação de quadrilha e exploração de trabalho escravo.

Para lidar com esta realidade, as ações terão apoio da Polícia Federal, Polícia Militar e Exército, importante entre outras coisas para o transporte de equipamentos apreendidos de madeireiros, como tratores e caminhões. O orçamento para o Ibama do Amazonas, R$ 1,5 milhões, é comparável com o do Acre, mas muito inferior ao de Rondônia (cerca de R$ 4 milhões) e Mato Grosso e Pará (cerca de R$ 6 milhões cada). O objetivo é que, no futuro, o Amazonas não esteja precisando de tanto dinheiro quanto os vizinhos para tentar impedir a destruição da floresta.

* Vandré Fonseca é jornalista formado em São Paulo, há oito anos vivendo na Amazônia. Atualmente, é repórter da TV Amazonas.

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