Notícias

Carta – Itatiaia, entre o tudo e o nada II

De Maria Teresa de Mehr Moradora do Núcleo Colonial Itatiaya e membro da AAI (Associação dos Amigos do Itatiaia) É verdade que "o ótimo é inimigo...

Redação ((o))eco ·
4 de abril de 2006 · 18 anos atrás

De Maria Teresa de Mehr
Moradora do Núcleo Colonial Itatiaya e membro da AAI (Associação dos Amigos do Itatiaia)

É verdade que “o ótimo é inimigo do bom”. Ótimo seria ter 30.000 hectares de parque nacional sob o controle total do Ibama a um alto custo econômico e social; bom seria ter 29.700 com o grande beneficio de dar um passo numa direção que garante a sustentabilidade ambiental: a valorização do capital humano. O mundo está vivenciando uma dupla quebra de paradigma: A premissa de que o homem é por natureza o inimigo do seu habitat e, por tanto, se deve mantê-lo o mais longe possível da natureza, é hoje uma posição tão questionável quanto a crença de que uma autoridade externa é absolutamente necessária para que os recursos naturais sejam preservados.

O exemplo norte-americano é, sim, um exemplo válido apesar de que os comentários dos leitores Sergio Brant e Daniel Toffoli digam o contrário. O fato do Cape Cod National Seashore pertencer a uma ou a outra categoria parece ser irrelevante para a mesma IUCN. Traduzo aqui o que a CEESP (a Comissão da IUCN para Políticas Ambientais, Econômicas e Sociais) diz ao respeito de “Áreas Conservadas pela Comunidade e Áreas Protegidas Co-gerenciadas”, um dos seus temas chave:

“As abordagens convencionais dominantes durante os últimos 100 a 150 anos para as áreas protegidas tenderam a ver as pessoas e a natureza como entidades separadas, requerendo frequentemente a exclusão das comunidades humanas das áreas de interesse, proibindo-lhes o uso dos recursos naturais e enxergando seus interesses como incompatíveis com a conservação. Enquanto é aceito que algumas áreas protegidas (ex. aquelas correspondentes às categorias V e VI da IUCN) possam acomodar comunidades, parece ser dada mais importância a aquelas desenhadas para excluí-las tanto como residentes quanto como tomadores de decisão (normalmente correspondentes às categorias I,II e III). Já que a maioria das áreas protegidas no mundo tem pessoas morando nelas ou dependendo delas para sua subsistência, as abordagens convencionais de exclusão tem engendrado profundos custos sociais. Isto é particularmente verdadeiro quando os povos indígenas e as comunidades locais afetados se encontravam já dentro dos grupos mais marginados, também antes da definição da área protegida”.

Quer dizer, independentemente de que Itatiaia e Cape Cod sejam tecnicamente diferentes, o ponto é que a discussão deve levar a soluções que minimizem os custos econômicos e sociais garantindo a sustentabilidade do meio ambiente. Isto se logra, não à força, mais sim com uma atitude coerente com a realidade sócio-histórica de uma comunidade que tem demonstrado consciência ecológica transformando campos em florestas secundárias e atuando durante anos em parceria com o Ibama no combate a incêndios e no dia-a-dia da preservação do meio ambiente. Isto se logra, como diz Fernando Gabeira, conquistando a simpatia dos vizinhos e desenvolvendo melhor a política democrática de preservação. Ele apela: “Vamos desenhar um parque junto com os moradores, vamos ajudá-los a formular um plano de desenvolvimento sustentável, vamos atraí-los para um severo trabalho de fiscalização”. (JB Ecológico * Setembro de 2005 pg.20).

Bem-vinda, então, a posição do administrador do Ibama se ela garante que o processo de regularização fundiária será conduzido participativamente segundo estes critérios dando oportunidade ao estabelecimento de uma sadia solução “ganha-ganha” intermédia entre o tudo e o nada!

Resposta de Daniel Di Giorgi Toffoli – Geógrafo e Analista Ambiental do IBAMA

Primeiramente agradeço e parabenizo os leitores pelo aprofundamento das questões e pela abertura de novos temas relacionado à ampla questão de regularização fundiária em Parques Nacionais, particularmente ao do Itatiaia.

Com relação à carta de Maria Teresa de Mehr: Concordo com a citação da IUCN quando esta diz que a criação de unidades de conservação de proteção integral engedra, muitas vezes, em profundos custos sociais e concordo ainda mais quando relata que isto é particularmente verdade quando os afetados são povos indígenas e comunidades locais marginalizadas. Exemplos não nos faltam, seja no Brasil ou em outras partes do mundo. Mas, creio eu, em Itatiaia as comunidades são diferentes. Concordo que a sustentabilidade ambiental é um fim em si, porém não pode o IBAMA facultar seguir o art. 11 do SNUC (Lei 9985/00) ou não. Tanto é verdade a referência usada pela leitora (CEESP), que no SNUC previu-se o seguinte:

Art 42. As populações tradicionais residentes em unidades de conservação nas quais sua permanência não seja permitida serão indenizadas ou compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo Poder Público, em local e condições acordados entre as partes.

§ 1º O Poder Público, por meio do órgão competente, priorizará o reassentamento das populações tradicionais a serem realocadas.

§ 2º Até que seja possível efetuar o reassentamento de que trata este artigo, serão estabelecidas normas e ações específicas destinadas a compatibilizar a presença das populações tradicionais residentes com os objetivos da unidade, sem prejuízo dos modos de vida, das fontes de subsistência e os locais de moradia destas populações, assegurando-se a sua participação na elaboração das referidas normas e ações.

§ 3º Na hipótese prevista no § 2º, as normas regulando o prazo de permanência e suas condições serão estabelecidas em regulamento.

Atenciosamente,

Leia também

Salada Verde
12 de setembro de 2024

Mato Grosso ganha nova área protegida com criação da RPPN Fazenda Anacã

Após hiato de dez anos sem novas UCs na Amazônia matogrossense, proprietário rural transforma sua terra, localizada em Alta Floresta, em RPPN

Salada Verde
12 de setembro de 2024

Candidatos a vereador lançam aliança nacional pelo Clima

Em manifesto, candidatos se comprometem a trabalhar localmente para mitigar e adaptar cidades à nova realidade climática. Aliança busca novas adesões

Reportagens
12 de setembro de 2024

Um drama sertanejo: destruição da Caatinga encurrala macaco ameaçado

Avanço dos pastos sobre as florestas no bioma isola cada vez mais os guigós-da-caatinga, que seguem desprotegidos e com futuro incerto

Mais de ((o))eco

Deixe uma resposta

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.