A queda de braço entre fazendeiros e agentes de fiscalização na Floresta Nacional do Jamanxim (PA) se acirrou nesta semana, depois que os juízes federais de Santarém José Airton Portela e Francisco Garcês Castro Júnior deram ganho de causa a sete pecuaristas que criam ilegalmente gado dentro da unidade de conservação. A alegação de “violação da livre iniciativa” revoltou servidores do Ibama e Ministério Público Federal (MPF), que entraram no dia 16 de outubro com recurso contra a decisão, que desmoralizou a operação Boi Pirata. As chances de a medida ser derrubada são grandes.
Em setembro, a 5ª turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região declarou, em decisão contra mandado de segurança em favor de uma empresa que havia sido interditada pelo Ibama, que “o ato de embargo/interdição de estabelecimento potencialmente poluidor que não detém licenciamento ambiental, é ato legal, decorrente do exercício do poder de polícia”. Outros argumentos, de mesmo teor, deram razão ao Ibama em decisões em julho e fevereiro deste ano.
Para o procurador do MPF, Claudio Dias, uma decisão da Justiça Federal que anula os efeitos de uma operação de fiscalização ambiental também federal não chega a ser uma contradição. “Vivemos em sistema de separação de poderes, por isso não é contradição. Mas para o MPF, foi uma decisão surpreendente, porque o Ibama realizou toda a operação na total legalidade. A decisão dos juízes de Santarém não representa a posição da magistratura no resto do país”, disse o procurador.
Foto: Nelson Feitosa/Ibama
Ibama mantém equipe na Flona para coibir infratores.
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Além de buscar uma resposta jurídica ao impasse, o Ibama garante que a operação não está encerrada. “Estamos numa fase de transição, mas mantemos equipes lá junto com um helicóptero, que patrulha a região e nos permite agir rápido para destruir acampamento de desmatadores. A operação continua”, diz o coordenador geral de fiscalização do Ibama, Bruno Barbosa. Segundo ele, a pressão psicológica do aparato fiscalizatório instalado no local já está dando resultado. “A decisão dos juízes de Santarém está circunscrita a sete pecuaristas. Outros 90 estão correndo para tirar seus bois de dentro da floresta nacional. Nós já percebemos que está havendo uma mudança de comportamento, os fazendeiros estão inseguros porque sabem que se continuarem com o boi, vamos interditar a área e ele terá problemas depois para comercializar a carne”, aposta Barbosa. A operação já aplicou 175 milhões de reais em multas.
O Ibama afirma que monitorou até agora a retirada de 30 mil cabeças de gado de cerca de 100 áreas embargadas, que representam um desmatamento de 50 mil hectares. Segundo o instituto, os próprios pecuaristas estão cuidando desta retirada. “Hoje sabemos que está havendo dificuldade para conseguirem caminhões para transporte de todo o gado que foi proibido”, lembra Barbosa. Dessa quantidade, mil cabeças foram retiradas por veículos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e doados, nesta semana, ao programa Fome Zero.
Impasse sobre novos limites
Desde que a Floresta Nacional do Jamanxim foi criada, em 2006, tem sido alvo de desmatamentos tão intensos que colocam a unidade de conservação, todos os anos, no topo do ranking das áreas protegidas mais devastadas de toda a Amazônia. Em agosto deste ano, em pleno auge da operação Boi Pirata II, o Imazon apurou que a floresta nacional continuava nesta relação. O Pará sozinho foi responsável pelo desmate de 76% de tudo que for cortado na Amazônia e 48% do total destruído aconteceu dentro de áreas protegidas. Isso mostra que, se essas áreas serviam como inibidores naturais do desmatamento, a demora na sua implementação efetiva passou a encorajar madeireiros, garimpeiros e pecuaristas. Este percentual de desmatamento dentro de áreas protegidas em agosto foi o maior já registrado pelo Sistema de Alerta de Desmatamento do Imazon, desde que este monitoramento começou a ser feito, há três anos.
1984 2008 Imagens do satélite Landsat mostram o avanço da destruição em Jamanxim, à beira da BR-163
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A situação de disputa se acirrou tanto que as pressões para acabar com a Floresta Nacional do Jamanxim de vez não são nem mais disfarçadas. No início do mês, associações de moradores da região de Novo Progresso e Castelo dos Sonhos, às margens da BR-163, estiveram reunidos com Ibama, Instituto Chico Mendes e Ministério Público Federal para discutir a permanência de atividades na unidade de conservação, através de um termo de ajuste de conduta (TAC). De acordo com o procurador da República Marcel Brugnera Mesquita, presente à reunião, na proposta entregue em agosto ao ICMBio, os moradores sugeriram que fossem excluídos da unidade de conservação 900 mil dos 1,3 milhões de hectares de floresta amazônica. Em agosto, procurados por O Eco, os moradores se recusaram a revelar o teor da proposta.
Como contra-proposta, ouviram do ICMBio o projeto de redução de 30 mil hectares da unidade de conservação, em áreas que já foram degradadas e ampliação de mais cerca de 150 hectares em zonas de interesse de preservação. “O clima ficou bem tenso e a discussão sobre o TAC, que era a razão da reunião, ficou em segundo plano”, descreve Mesquita.
Queimadas dentro da unidade conservação (01/07 a 20/10)
Crédito: BDQueimadas/INPE
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No mesmo dia, o projeto de decreto legislativo 1617/09, do deputado Hernandes Amorim, também passou pela comissão de agricultura propondo a exclusão da Floresta Nacional de Bom Futuro (RO) do mapa.
Num momento em que até os ruralistas que brigam pelo desmantelamento da legislação ambiental brasileira aparecem sob holofotes internacionais com discurso ambiental afiado, os ataques às unidades de conservação continuam mais vivos do que nunca. Mas se não ficarem estrategicamente escondidos, a imagem de bom moço que o Brasil quer levar para a Conferência do Clima, em Copenhague, vai por água abaixo.
VEJA
O ranking das unidades de conservação mais queimadas em 2009
Saiba mais
Um outro desfecho para Jamanxim
Fogo na Floresta Nacional de Jamanxim
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