O livro “Águas do Iténez ou Guaporé”, publicado em maio na cidade boliviana de Cochabamba, descreve uma das bacias binacionais mais ricas da Amazônia, a bacia do rio Iténez, seu nome na Bolívia, ou rio Guaporé, como é chamado no Brasil. O trabalho descreve a enorme riqueza natural da bacia e a importância da conservação de seus recursos.
Produzido conjuntamente por pesquisadores bolivianos e brasileiros, o livro é “um resumo do conhecimento da bacia e de seus recursos, gerado nos últimos dez anos” por organizações e instituições do Brasil e da Bolívia, de acordo com a nota divulgada pela Editora Inia, responsável pela publicação.
A bacia do rio Iténez ou Guaporé, por sua localização geográfica, recebe influências do Escudo Brasileiro e também das planícies de Beni, na Bolívia, condições que geram uma alta diversidade de habitats e uma fauna peculiar, principalmente de espécies aquáticas. “A bacia do Iténez ou Guaporé é um hotspot de biodiversidade”, diz Carolina Doria, pesquisadora brasileira e coautora do livro. Essa bacia se sobrepõem a duas áreas protegidas: O Parque Nacional Noel Kempff Mercado e o Parque Departamental e Área Natural de Manejo Integrado Iténez.
“Este patrimônio binacional se sobrepõe em grande parte com áreas protegidas e territórios indígenas, e cada vez recebe maior atenção dos gestores públicos e da comunidade científica”
Livro “Águas do Iténez ou Guaporé” |
Há espécies emblemáticas que habitam a região e que são de grande importância para conservação, como o golfinho boliviano, a tracajá, o jacaré-negro e a ariranha ou lontra-gigante. Estima-se que existem pelo menos 600 espécies de peixes neste rio.
Guaporé, refúgio de importantes espécies
O rio Iténez ou Guaporé é um espaço vital para a conservação de uma série de espécies aquáticas que lá puderam se refugiar e restabelecer sua população. Um claro exemplo é a ariranha (Pteronura brasiliensis), que no século anterior foi vítima de caçadores atraídos por sua valiosa pele, e que a converteram na terceira espécie carnívora mais explorada, e causou uma enorme diminuição de indivíduos.
Apresentação do livro na Universidade de San Simón, Cochabamba, Bolívia |
De acordo com Paul Van Damme, diretor da ONG boliviana Faunagua e coeditor do livro, “em 1998, havia só cinco registros de ariranhas em toda a Bolívia, a espécie quase desapareceu de nosso país. Quando fomos estudar as ariranhas no parque [Noel] Kempff no Iténez, constatamos que as populações continuavam lá e que havia se recuperado muito bem”. Entre os anos 2004 e 2007, explica Van Damme, pesquisadores puderam confirmar o aumento da população de 34 para 55 indivíduos no rio San Martín, afluente boliviano do Guaporé.
“A bacia do Iténez ou Guaporé é o habitat ideal para a ariranha, com águas claras e muitos peixes. O Guaporé, com o Parque Nacional Noel Kempff, é o maior reduto de toda a Amazônia para as ariranhas”, garante Van Damme. Elas encontraram na bacia do Iténez ou Guaporé seu mais seguro refúgio.
Reside aí a importância do trabalho conjunto entre pesquisadores e instituições bolivianas e brasileiras. “A parte boliviana está conservada, mas a parte brasileira da bacia, não”, afirma Carolina Doria, e explica que “o que acontece no Brasil influi no lado boliviano”. Para Doria, é necessário que a Bolívia e o Brasil trabalhem juntos e com os mesmos objetivos, considerando a bacia do Iténez como um todo, porque “não existem fronteiras para os animais, para os peixes ou para os contaminantes. Nos rios não existem fronteiras para os impactos humanos”.
A cooperação binacional pode oferecer importantes resultados para o desenvolvimento e para a conservação dos recursos naturais na região, como demonstra o livro “Águas do Iténez ou Guaporé”, e também pode favorecer a realização de novas pesquisas, como das hidrelétricas.
De fato, a bacia do Guaporé está ameaçada pela construção das represas do Madeira, além de projetos de pequenas hidrelétricas bolivianas, como La Punta, Santa Anita e La Garita. Sobre o tema, Paul Van Damme acredita que “com as represas, o Brasil e a Bolívia se dão conta de que compartilham os rios, e assim vem, finalmente, a necessidade de cooperação”.
O livro |
Águas do Iténez ou Guaporé: Recursos hidrobiológicos de um patrimônio binacional (Bolívia e Brasil)
Infográfico
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